"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



quinta-feira, 23 de novembro de 2023

 



 

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

24/11 ANTONIO JOÃO 200

 


José Antonio Lemos dos Santos

     24 de novembro, data que celebra um herói. Não se trata de exaltar as guerras em geral ou uma guerra específica. Heróis existem em cada lado de qualquer contenda ou disputa, assim como covardes ou traidores, a depender do lado por onde são vistos. Herói é aquele que promove ou defende a todo custo, inclusive pessoais, os valores primordiais de seu povo em todas as áreas da ação humana, até nas guerras, embora estas não devessem acontecer, mas aconteçam. Covardes ou traidores são o contrário dos heróis.

     Quero falar sobre Antonio João Ribeiro, hoje quase desconhecido, mas um herói brasileiro que defendeu seu país a preço da própria vida em um dos episódios mais dramáticos e desprezados da Guerra da Tríplice Aliança. Nascido em Poconé (MT)em 24 de novembro de 1823, morreu em Mato Grosso do Sul, na região onde hoje é o município de Antonio João, que o homenageia com seu nome. Neste ano de 2023 são completos exatos 200 anos de seu nascimento e este é o principal motivo deste artigo.

    Seu drama ocorreu quando comandava a Colônia Militar de Dourados com uma guarnição de 14 soldados, mais cinco colonos - quatro homens e uma mulher - tendo que enfrentar um cerco de 365 adversários mais equipados. Rejeitou com altivez o ultimato do inimigo para render-se, não fugindo ao embate desigual. Antes do embate enviou mensageiro ao comando superior com sua decisão de defender aquela posição brasileira, ainda que a preço da própria vida. Não se escondeu em gabinetes, ao contrário, foi para a linha de frente onde morreram ele, dois soldados e mais dois colonos. Os demais foram dominados. 

     A mensagem enviada foi interceptada pelos inimigos e, mesmo assim, tamanha era a eloquência de seu texto que a fez saltar da folha de um papel dado como extraviado, para as páginas das grandes epopeias brasileiras. Os bravos reconhecem seus iguais e se respeitam mesmo estando em lados opostos. E assim foi. 

     Em 1980 o Exército Brasileiro consagrou o Tenente Antonio João Ribeiro como um de seus Patronos e construiu na Praia Vermelha, onde se encontram dois dos mais importantes centros de formação militar do Brasil, a Escola de Comando e Estado Maior do Exército e o Instituto Militar de Engenharia, um monumento em homenagem aos combatentes da Guerra do Paraguai tendo em posição de destaque a figura do ilustre mato-grossense e sulmatogrossense, o poconeano Tenente Antonio João Ribeiro representado no momento em que seu corpo se curva para trás alvejado de morte. 

     A mensagem enviada a seus superiores e interceptada pelos adversários, era pequena no tamanho e grande no significado. Segundo o site do Exército Brasileiro ela extravasava o inarredável sentimento do dever militar, expresso nas poucas palavras ali colocadas pelo bravo Tenente:” Sei que morro, mas o meu sangue e o de meus companheiros servirá de protesto solene contra a invasão do solo de minha Pátria”. Foi, de fato, para além do dever militar firmando-se na linguagem cívica brasileira como expressão da afeição extrema da cidadania pelo seu berço pátrio diante de quaisquer tipos de ameaças que sobre ele pairem. Merece ser lembrado

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

SEGURA SEU VOTO

 

Charge: prof. José Maria Andrade

José Antonio Lemos dos Santos

 Praticamente a um ano das eleições de 2024, começam a aparecer os esboços de candidaturas, tanto para os executivos como para os legislativos municipais em todo o Brasil. Muitas nem serão concretizadas, mas, mesmo assim os nomes começam a ganhar espaço nas ruas, em especial, em adesivos nos carros, seguindo a tradicional regra do começar cedo para “beber água limpa”. Isto é, chegar nos eleitores antes que eles se comprometam com outros eventuais candidatos. De um modo geral começam buscando familiares, colegas de trabalho, velhos colegas dos bancos escolares (até então esquecidos), amigos, em suma, aquelas pessoas potencialmente formadoras do que seria um capital político pessoal. Com base nesses laços pessoais de diversos tipos acabam arrancando compromissos amarrados em “fios de bigode” de difícil escapatória futura. Com as eleições ainda a um ano, muitos desses compromissos são sacramentados em frases ditas sem muito pensar, muitas vezes ditas para encurtar uma conversa chata, ou para não ser desagradável. Aí mora o perigo.

     Em 2017 houve umas alterações eleitorais vindas do que se esperava ser uma reforma política substanciosa, “a mãe de todas as reformas”, mas que acabou não passando de uma “reforminha”, tal qual a que pretendem fazer agora, às pressas ainda antes de outubro. Contudo, do jeito como as regras estão até agora, as próximas eleições serão funcionalmente semelhantes a última, só mudando os cargos em disputa. Em relação ao voto em si quase tudo ficou como antes, só que as de 2024, abrangerão apenas a escolha para prefeitos e vereadores em eleições majoritárias e proporcionais, respectivamente. 

     Como nas democracias mais avançadas do mundo, temos no Brasil dois tipos de eleições, majoritárias e proporcionais, uma privilegiando o candidato individual e outra a proporção em que se distribui no eleitorado as diversas correntes ideológico-partidárias.  Ambas necessárias, pois se complementam. Só que o voto majoritário é simples, vence o candidato que tiver mais votos, enquanto o voto proporcional não é tão simples assim. Nestas vota-se no conjunto – listas - de candidatos por partido ou federação (antiga coligação) através dos votos dados aos candidatos nelas constantes. Os mais votados em cada “lista” são eleitos em número de cadeiras de acordo com o “coeficiente eleitoral” alcançado por cada partido ou federação. Nas eleições proporcionais busca-se a distribuição das cadeiras parlamentares na proporção da preferência dos partidos no universo eleitoral. Tais cadeiras são ocupadas pelos candidatos mais votados em cada corrente, a maioria dos quais não é escolhida diretamente pelo eleitor. Assim, o cidadão escolhe um candidato e seu voto pode eleger outro. Esta é a beleza das eleições proporcionais, mas também seu grande mal entre nós, já que, apenas em 2022 as listas passaram a ser publicadas por partido ou federação, porém, só no site da Justiça Eleitoral, ainda sem muita divulgação e penetração entre os eleitores. De qualquer forma um grande avanço no sentido de maior legitimização e representatividade para as eleições.

      Acompanho este assunto no mínimo desde 2010, quando o STF decidiu que a cadeira conquistada numa eleição proporcional é do partido ou coligação e não do candidato, confirmando ser esta uma eleição coletiva. Aprendi nesse tempo que votando em listas desconhecidas o eleitor podia escolher um bom candidato e eleger sem querer outro, às vezes indesejado, ainda que do mesmo partido ou coligação. Deste modo são reeleitos aqueles de sempre, com o povo enganado no seu próprio voto, elegendo e legitimando muitos daqueles que não gostaria de ver eleitos ou reeleitos. O coitado é ludibriado, paga a conta e ainda leva a culpa e a fama de não saber votar, situação esta que certamente deve ser minorada com a continuidade da iniciativa da publicação das listas pela Justiça Eleitoral, aguardando-se novas medidas no sentido de fazê-las chegar ao maior número possível de eleitores.

     O sentido de consciência e responsabilidade do eleitor na hora de votar deve então ser multiplicado nas eleições proporcionais. Antes de nos comprometer com o candidato parente, amigo, colega ou compadre é importante aguardar a oficialização das candidaturas. Na eleição passada a Justiça Eleitoral deu um grande passo no sentido da legitimidade e representatividade das eleições, publicando em seu site a lista dos candidatos não apenas em ordem alfabética, mas também por partido ou coligações. Talvez em alguma das próximas eleições estarão nas telas das próprias urnas. As listas mostrarão ao eleitor quais os outros candidatos que poderá eleger ao votar naquele que hoje postula o seu voto. Entre eles pode estar um ou mais candidatos que não se queira eleito, nem pintado de ouro. Nesta condição, aquele que é seu verdadeiro amigo entenderá ao negar-lhe seu voto. Importante é não se precipitar em compromisso muito cedo com algum pré-candidato. Segure o seu voto.


segunda-feira, 20 de março de 2023

AS CHEIAS DE SÃO JOSÉ


José Antonio Lemos dos Santos

     Para os antigos a estação das chuvas em Cuiabá tinha dois picos, um em dezembro/janeiro e outro em março, também chamado de “repique”, por volta do dia de São José quando encerrava o período chuvoso. As cheias eram aguardadas nessas épocas, ainda que quase sempre ocorrendo com intensidades diferentes. O último dia 17 de março marcou os 49 anos do dia da cota máxima da cheia de 1974 em Cuiabá, chegando a 10,87 metros, desabrigando milhares de pessoas nos antigos bairros do Terceiro (“de Dentro” e “de Fora”), Barcelos e Ana Poupino, conjunto de bairros que formava a região mais populosa da cidade. A cheia de São José naquele ano foi uma tragédia para a cidade logo quando esta dava um salto de crescimento decorrente da inauguração de Brasília, dentre outros fatores. Grosso modo Cuiabá saltava de 56 mil habitantes em 1960 para 240 mil em 80. Um crescimento para o qual a cidade não estava preparada, nem seus cidadãos, nem seus governantes. Ninguém entendia quando alguns visionários, verdadeiros profetas propunham a necessidade de preparar a cidade para aquela expansão.

     A calamidade daquela cheia serviu para dar uma sacudida nas autoridades. O governo Geisel tomara posse dois dias antes já com a inundação avançada. De imediato o ministro do Interior Rangel Reis veio a Cuiabá e tomou duas decisões radicais marcantes para a cidade e que não podem ser esquecidas. Determinou a demolição do que sobrara dos bairros atingidos, transferindo suas populações para conjuntos residenciais a serem construídos, e foram construídos, um deles o Novo Terceiro. Nesse processo perderam-se alguns marcos da cultura cuiabana que viraram saudade nas lembranças dos blocos carnavalescos “Sempre Vivinha”, “Coração da Mocidade” e “Estrela Dalva”, por exemplo.

     Outra determinação do ministro foi a realização de estudos técnicos para evitar novas tragédias semelhantes em Cuiabá. Daí resultou Manso, em princípio só para evitar novas enchentes, um “açudão” de proteção urbana. Embora pouco divulgado, Manso cumpriu essa função ao menos em 2002 e 2010 impedindo que volumes de água superiores aos 3.025 m³/s de 74 chegassem a Cuiabá. Seria ótimo Furnas informar se aconteceram outros volumes maiores que o de 1974. Fosse só este seu objetivo, Manso já teria valido a pena.

     Já em 1978, no antigo Minter, a Comissão da Divisão do Estado, da qual tive o privilégio de participar, propôs a transformação de Manso em um projeto de aproveitamento múltiplo (APM) de barragem, então pioneiro no Brasil para solucionar também a questão energética, na época o principal problema estadual. Junto com a energização do “açudão”, foram acrescidos os objetivos de regularização de vazão do rio, garantindo cotas mínimas e máximas, prevendo ainda o abastecimento urbano de água e irrigação rural para a Baixada Cuiabana, três barragens a fio d’água rio abaixo, sendo que seu lago poderia também receber projetos de piscicultura, turismo e lazer. Até hoje Manso enquanto APM está subutilizado.

     Ainda há quem pense que Manso foi construída para gerar energia, o que seria um absurdo pela dimensão de seu lago, maior que a Baía da Guanabara e 10 vezes o Lago de Brasília gerando apenas 210 MW. Com Manso segurando o rio, e um bom gerenciamento da ocupação das Áreas de Risco segurando a força dos córregos, Cuiabá pode oferecer condições de segurança à sua população nos períodos chuvosos. Ao contrário do que se vê na maioria das cidades brasileiras, com tragédias a cada verão sempre tratadas com soluções paliativas e projetos pontuais que quase nunca saem do papel antes da próxima tragédia. Teria sido apenas uma questão de sorte Cuiabá pegar um governo recém-empossado que, talvez querendo evitar que uma tragédia urbana mal enfrentada manchasse sua imagem logo em seu início, propôs então uma abordagem abrangente, numa escala mais adequada com bons resultados até hoje



sábado, 21 de janeiro de 2023

A CADEIRA E A CONSTITUIÇÃO

José Antonio Lemos dos Santos 

(Por absoluto medo, corajosamente peço que não compartilhe este meu texto.)

     Como sabemos, em especial os arquitetos, as cidades e seus edifícios são recipientes físicos que abrigam funções urbanas, das mais básicas, como uma padaria, até as mais importantes, como o caso da Praça dos Três Poderes, em Brasília, com as sedes dos maiores Poderes da Nação: Executivo, Legislativo e Judiciário.  Portanto, a Praça dos Três Poderes deveria ser considerada o espaço mais importante do país, como sempre eu pensei que fosse, pois ela abriga suas mais importantes instituições cívicas, os pilares institucionais da nação brasileira, seu comando. Deveria, portanto, também ser o espaço mais protegido e respeitado do país, mantido sob constante vigilância com o que há de mais moderno em termos de segurança, como também pensei que fosse. E descobri que não é. As vezes o edifício e até algumas cidades se confundem com as funções que abrigam, mas continuam sendo apenas o abrigo destas e não elas próprias. Em suma, o mais importante é a função e não o edifício que a abriga. Mais importante o vinho do que a garrafa.

      Porém, parece estar havendo um inversão de valores. As instituições a alguns anos vem sendo atacadas e destruídas criminosamente diante do silêncio das autoridades e da grande imprensa. Estas agora dirigem suas indignações para a vandalização também criminosa e inaceitável de bens públicos e privados. As instituições nacionais vem sendo atacadas e destruídas em sua essência, tanto o Poder Executivo, que perdeu sua autonomia, quanto o Legislativo, este em estágio avançado de perda de representatividade e o Judiciário, que vem usurpando prerrogativas dos outros poderes ao mesmo tempo em que vandaliza ele próprio aquilo que é sua função precípua : defender a Constituição Brasileira. Ou seja, nesta inversão de valores, estamos chorando mais pelos danos criminosos feitos nos Palácios físicos da Praça dos Três Poderes do que pelos danos também criminosos produzidos nos seus conteúdos, na sua essência que tinham por objetivo abrigar, defender. Para a Nação e seu povo é muito mais grave a perda de um artigo, ou mesmo uma vírgula da Constituição Federal, ou o esvaziamento de quaisquer dos Seus Poderes, do que mil vidraças, ou mil cadeiras de qualquer um dos edifícios, repito, criminosamente atacados, por mais belos que sejam, por melhor que seja o arquiteto que os tenha projetado, por maiores que sejam sua importância artística, histórica ou cultural. 

     Enquanto isso, nossa Carta Magna se esvai rapidamente, sem choro, nem vela, sem vozes que se levantem em sua defesa com a mesma ênfase das que protestam pela perda das cadeiras, que também não poderiam ser destruídas. 

(Imagem Wikwpedia)

 

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

ANTONIO JOÃO RIBEIRO, 200 ANOS

 

José Antonio Lemos dos Santos

     Não se trata de exaltar as guerras em episódios ou personagens especiais, mas de celebrar um herói. Heróis existem em cada lado de qualquer contenda ou disputa, assim como covardes ou traidores, a depender do lado por onde são vistos. Herói é aquele que promove ou defende a todo custo, inclusive pessoais, os valores primordiais de seu povo em todas as áreas da ação humana. Em suma, existem heróis nos esportes, na cultura popular, na saúde, na arquitetura, na política, e até nas guerras, embora estas não devessem acontecer, mas aconteçam. Covardes ou traidores são o contrário dos heróis.

     Quero falar sobre Antonio João Ribeiro, hoje quase desconhecido, mas um herói brasileiro que defendeu seu país a preço da própria vida em um dos episódios mais dramáticos da Guerra da Tríplice Aliança. Nascido em Poconé (MT)em 24 de novembro de 1823, morreu em Mato Grosso do Sul, na região onde hoje é o município de Antonio João, que o homenageia com seu nome. Neste ano de 2023 são completos exatos 200 anos de seu nascimento e este é o principal motivo deste artigo.

    Seu drama ocorreu quando comandava a Colônia Militar de Dourados com uma guarnição de 14 soldados, mais cinco colonos - quatro homens e uma mulher - tendo que enfrentar um cerco de 365 adversários mais equipados. Rejeitou com altivez o ultimato do inimigo para render-se, não fugindo ao embate desigual. Antes do embate enviou mensageiro ao comando superior com sua decisão de defender aquela posição brasileira, ainda que a preço da própria vida. Não se escondeu em gabinetes e foi para a linha de frente onde morreram ele, dois soldados e mais dois colonos. Os demais foram dominados. 

     A mensagem enviada foi interceptada pelos inimigos. Tão eloquente era o seu texto que mesmo próximo do enfrentamento em luta sangrenta, ficou gravada mesmo na memória dos adversários que a leram, saltando de um texto em um papel dado como extraviado para a história das grandes epopeias brasileiras. Os bravos reconhecem seus iguais e se respeitam mesmo estando em lados opostos. E assim foi. 

     Em 1980 o Exército Brasileiro consagrou o Tenente Antonio João Ribeiro como um de seus Patronos e construiu na Praia Vermelha, onde se encontram dois dos mais importantes centros de formação militar do Brasil, a Escola de Comando e Estado Maior do Exército e o Instituto Militar de Engenharia, um monumento em homenagem aos combatentes da Guerra do Paraguai tendo em posição de destaque a figura do ilustre mato-grossense e sul-matogrossense, o poconeano Tenente Antonio João Ribeiro representado no momento em que seu corpo se curva para trás alvejado de morte. 

     A mensagem enviada a seus superiores e interceptada pelos adversários, era pequena no tamanho e grande no significado. Segundo o site do Exército Brasileiro ela extravasava o inarredável sentimento do dever militar, expresso nas poucas palavras ali colocadas pelo bravo tenente:” Sei que morro, mas o meu sangue e o de meus companheiros servirá de protesto solene contra a invasão do solo de minha Pátria”. Vai, de fato, para além do dever militar firmando-se na linguagem cívica brasileira como expressão simbólica da afeição extrema da cidadania pelo seu berço pátrio diante de quaisquer tipos de ameaças que sobre ele paire.