"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



quarta-feira, 22 de setembro de 2010

FERRONORTE: CUIABÁ - LUCAS

FERRONORTE: CUIABÁ - LUCAS
José Antonio Lemos dos Santos

Nunca é demais relembrar que a concessão da União à Ferronorte era “para o estabelecimento de um sistema de transporte ferroviário de carga abrangendo a construção, operação, exploração e conservação de estrada de ferro entre Cuiabá (MT) e: a) Uberaba/Uberlândia (MG), b) Santa Fé do Sul (SP), na margem direita do rio Paraná, c) Porto Velho (RO) e d) Santarém (PA)”. Objetivava a criação de uma macro-logística ferroviária para a Amazônia meridional brasileira tendo Cuiabá como centro, algo bem maior do que simplesmente “levar o trem até Cuiabá”.
Uso propositalmente o verbo no passado pois a Resolução 3581 da ANTT do último dia 14 ameaça reduzir esse grande projeto nacional apenas ao trecho Santa Fé do Sul – Rondonópolis, apesar da promessa do atual governador Silval Barbosa de trazer a ferrovia a Cuiabá até 2012. Ainda bem que a ligação ferroviária de Cuiabá a São Paulo continua na Lei do Plano Nacional de Viação, graças à previdência do saudoso senador Vicente Vuolo, onde consta também a ferrovia Cuiabá-Santarém, incluída no ano passado pelo senador Flexa Ribeiro, do Pará – isso mesmo, do Pará! Assim, o que vier depois de Rondonópolis dependerá da continuidade da luta dos mato-grossenses e paraenses.
O projeto da Ferronorte, que deve seguir como bandeira de luta de Mato Grosso, foi substituído pelo projeto de uma nova ferrovia ligando Uruaçú (ou Miracema) em Goiás, a Vilhena em Rondônia, passando por Lucas do Rio Verde (ou Primavera do Norte, em Sorriso) e Sapezal, em Mato Grosso. Este projeto veio à luz só no ano passado. Cada um destes projetos propõe um modelo geopolítico para Mato Grosso, envolvendo a distribuição espacial de eixos, pólos e sub-pólos regionais de desenvolvimento em seu território, portanto, envolvendo também uma nova espacialização do poder no estado.
O projeto Ferronorte consolida e fortifica o modelo de desenvolvimento estadual de maior sucesso no Brasil – o de Mato Grosso - com o reforço de seu eixo natural de desenvolvimento, a BR-163, distribuindo os benefícios da ferrovia a leste e a oeste por proximidade ou ramais, em seu percurso até Vilhena e Santarém. Não exclui a ligação do porto de Cáceres, a saída boliviana para o Pacífico, as minas de Mirassol d’Oeste, e se complementa muito bem com a ligação de Lucas do Rio Verde direta ao porto de Ilhéus. Já o novo projeto, se implantado antes da consolidação da espinha dorsal do estado – o eixo da BR-163 – seqüestrará a carga do norte mato-grossense para Goiás, inviabilizando o projeto Ferronorte e assim dividindo a economia estadual em duas, ambas frágeis, a mais nova centrada em Goiás, na rabeira da federação, de novo sem voz e sem vez.
Lembro que aconteceu algo parecido quando do projeto de ligação asfáltica de Cuiabá ao sistema rodoviário nacional. Primeiro a idéia de que Mato Grosso não viabilizaria economicamente uma ligação pavimentada. Ao fim saíram ao mesmo tempo duas rodovias pavimentadas, uma por Campo Grade outra por Goiânia. No fundo havia uma disputa interestadual pela passagem das riquezas de Mato Grosso. Quando da elaboração da concessão da Ferronorte também houve uma disputa entre os portos de Santos e Vitória, envolvendo São Paulo e Minas. A concessão acabou contemplando as duas alternativas. Agora acontece o mesmo. Sairão a Ferronorte e a “ferroleste”, conectando Mato Grosso aos portos e Santos, Vitória e Ilhéus. Mas para isso é preciso que os trilhos a Ferronorte prometidos pelo governador para Cuiabá, cheguem também com urgência a Lucas, a 360 Km da capital do estado. Bem aí.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 21/09/2010)

terça-feira, 14 de setembro de 2010

FICHA LIMPA EM LISTA LIMPA

FICHA LIMPA EM LISTA LIMPA
José Antonio Lemos dos Santos


Não há dúvida de que a aprovação da Lei da Ficha Limpa como fruto de uma incisiva mobilização da sociedade foi um importante passo para a democracia brasileira. A nova lei já vem permitindo que a Justiça Eleitoral faça uma boa peneirada prévia nos candidatos, poupando o eleitor do risco de vê-los eleitos. Nas próximas eleições será melhor. Porém, no caso das eleições proporcionais, não basta o eleitor escolher um bom candidato com “ficha limpa”. É preciso também verificar quais são seus companheiros na lista de candidatos de seu partido ou coligação na disputa pelo cargo, pois caso ele esteja acompanhado de algum ou alguns “fichas sujas”, o eleitor corre o grande risco de elegê-lo, mesmo tendo dado seu voto a outro candidato.
Pelo menos desde as eleições passadas venho aguardando em vão o tratamento deste assunto pelos especialistas ou pela própria Justiça Eleitoral, que em 2007 esclareceu definitivamente que os mandatos das eleições proporcionais pertencem aos partidos e não aos candidatos, dando fim às vergonhosas trocas de partidos e resgatando um pouco da fidelidade partidária na nossa democracia. Vejo este esclarecimento oficial como um divisor de águas na história política brasileira pois a partir dele uma série de salutares desdobramentos vieram e virão naturalmente, permitindo até que se trabalhe com mais calma uma verdadeira reforma eleitoral. O primeiro de tais desdobramentos é o resgate de que no Brasil temos de fato e de direito dois tipos de eleições, as majoritárias e as proporcionais, diferentes e que funcionam de maneira diferente. O povo é que nunca soube disso, até porque nunca foi alvo de uma campanha de orientação sobre o assunto.
Por falta de informação o eleitor sempre escolheu seus candidatos nas eleições proporcionais como se fosse em uma eleição majoritária, isto é, na falsa idéia de que aqueles com mais votos são eleitos e os menos votados não. Na verdade estamos aprendendo que nosso voto nas eleições proporcionais serve primeiro para fazer a distribuição entre os partidos das cadeiras em disputa, de acordo com o quociente eleitoral. Uma vez distribuídas as cadeiras entre os partidos, só aí valerá o nome do candidato escolhido, pois as cadeiras serão ocupadas pelos mais votados de cada partido ou coligação. Bem explicada e bem aplicada é mais democrática do que a eleição majoritária, pois envolve os “ideais” e os “times” dos partidos, não apenas a eventual força pessoal de um candidato. Mas aí também mora o perigo, pois podemos votar em um candidato e eleger outros. Pior, sem querer elegemos muitas vezes um “ficha suja” ou portador de algum outro desabono.
Creio que o próximo grande avanço na democracia brasileira não vai esperar a tão sonhada reforma política, necessariamente polêmica e, também por isso, demorada. Será a obrigatoriedade da divulgação das listas dos candidatos nas eleições proporcionais, seja feita pelos partidos, candidatos, ou pela própria Justiça Eleitoral. Vou além, mesmo que a lei não torne obrigatória a divulgação, ela muito em breve acontecerá naturalmente como mais uma conseqüência da bem-vinda Lei da Ficha Limpa, pois os próprios partidos terão interesse em fazer propaganda da qualidade de suas listas como um diferencial de segurança ao eleitor na escolha de quaisquer de seus candidatos. Isto acontecerá, é claro, com aqueles partidos ou coligações que não tem nada ou ninguém a esconder dos eleitores e que, ao contrário, tem motivos para exibir com orgulho o cartel de candidatos que submetem á apreciação democrática. Fraquinha, a esperança democrática cintila.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A MAIS VIÁVEL DAS FERROVIAS (III)

A MAIS VIÁVEL DAS FERROVIAS (III)
José Antonio Lemos dos Santos


Após 21 anos de sua assinatura alguns já esqueceram e muitos jovens nem chegaram a saber que a concessão da União à Ferronorte é “para o estabelecimento de um sistema de transporte ferroviário de carga abrangendo a construção, operação, exploração e conservação de estrada de ferro entre Cuiabá (MT) e: a) Uberaba/Uberlândia (MG), b) Santa Fé do Sul (SP), na margem direita do rio Paraná, c) Porto Velho (RO) e d) Santarém (PA)”. Está muito evidente – só não vê quem não quer – que seu objetivo é bem mais que uma simples ligação entre dois pontos, e sim um macro-projeto logístico para a Amazônia meridional brasileira tendo Cuiabá como centro.
De lá para cá essa região transformou-se numa das regiões mais dinâmicas do planeta, nela incluído Mato Grosso como o maior produtor agropecuário do Brasil e uma das principais fontes de alimentos do mundo. Claro que um imenso pólo gerador de cargas, tanto de ida como de volta. Assim, é de se louvar a atitude do governo do estado com o governo federal de reassumir o traçado original da Ferronorte, passando por Cuiabá e beneficiando todos os municípios de seu percurso, até Santarém e Porto Velho. Aliás, a minha vã filosofia jamais alcançou as razões desse sistema não ter sido implantado até hoje. E entendo menos ainda agora a ALL enjeitando estranhamente a continuação da ferrovia após Rondonópolis. Se esta não é uma ferrovia viável, qual seria? Menos mau que, segundo o noticiado, a empresa teria aberto mão de seus direitos de Rondonópolis para cima e até Uberaba, diferente do que foi dito no começo do ano de que refugaria apenas o trecho entre Rondonópolis e Cuiabá, que seria inviabilizado.
Outro ponto que jamais entendi desde que colocado pelo governo estadual é a suposta necessidade de um novo estudo de viabilidade econômica para o trecho Rondonópolis-Cuiabá, e só para este trecho. Acompanho tecnicamente o assunto desde 1975 na finada (mas importantíssima) SUDECO acompanhando o Prodepan e o Polamazonia, depois na Comissão da Divisão do Estado elaborando e acompanhando o PROMAT e o PROSUL e ainda na concepção do Polonoroeste, com o saudoso Osandy Ribeiro Teixeira. Uma ferrovia é determinante na estruturação do espaço urbano regional. Sei que alguns estudos de viabilidade econômica da ligação ferroviária de Cuiabá serviram de base para a concessão da Ferronorte, entre eles um extraordinário feito pelo antigo GEIPOT, se não me engano em 1975. E depois, antes de pegar qualquer concessão as empresas interessadas realizam seus próprios estudos de viabilidade. Por que mais um? Vamos logo com os trilhos!
É bom lembrar também que já existe um projeto aprovado pelo Ministério do Transporte em 1977, cujo EIA/Rima foi apresentado em audiência pública, não recebendo parecer favorável unicamente da Funai por passar próximo (fora – rio abaixo) à reserva Teresa Cristina. Cobrando a realização de outra audiência pública, o então presidente da Ferronorte disse em 2001 ”tratar-se de um problema que poderia ser contornado com um pequeno desvio do traçado para não impedir o “direito de perambular” dos índios. São detalhes que podem ser corrigidos com pequenas alterações, que terão ônus para a Ferronorte. Mas isso não importa. O que interessa é que o projeto é viável e só depende de uma decisão política para ter continuidade”. Se era viável, porque teria deixado de ser? Em seu traçado original consolida o estado econômica e espacialmente. A Ferronorte é a ferrovia mais viável do mundo, mesmo antes das novas fábricas de cimento em Cuiabá e Rosário Oeste. Imaginem agora com as mega-minas de Mirassol do Oeste.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 07/09/2010)

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

O Dutrinha e a Copa

O Dutrinha e a Copa
José Antonio Lemos dos Santos

Um dos maiores desafios colocados pela Copa do Pantanal é garantir ao futebol profissional de Cuiabá e Várzea Grande condições mínimas de disputa nas competições locais e nacionais enquanto é construído o novo Verdão e até sua liberação ao uso local depois da Copa. Mais que isso, é parte desse desafio recolocar ao menos um time local de volta à elite do futebol brasileiro até 2014, um desafio hercúleo, mas não impossível. Aliás, ano passado assisti um programa de TV com os ministros das cidades e do esporte discutindo a realização da Copa do Mundo no Brasil. Referindo-se à amplitude da problemática os ministros desfiaram uma série de assuntos e para minha satisfação como torcedor (de arquibancada) do futebol mato-grossense, o ministro das cidades disse que havia conversado informalmente com o governador Blairo Maggi sobre a possibilidade de estimular empresários a patrocinarem um time local em um projeto de retorno à série “A” do campeonato brasileiro, e lembrou do Mixto como exemplo.
Nesse contexto é fundamental o velho Dutrinha, que deveria ter sido melhor considerado tão logo Cuiabá foi escolhida como sede e decidida a demolição do antigo Verdão. Só em 2010 foram realizadas umas tímidas reformas e nenhuma ampliação, atraso compreensível tendo em vista que nesse período a própria Agecopa era implantada, mas que de qualquer forma custou muito caro para os times de Cuiabá e Várzea Grande. Jogar distante da torcida teve enorme importância na queda do Mixto para série “D” e no desempenho de todos os times de Cuiabá e Várzea Grande no campeonato estadual, competições equilibradas em que o fator torcida conta muito. Ao contrário do que querem crer alguns que nunca vão aos nosso jogos, as torcidas locais pressionam os adversários, tem lotado o Dutrinha, ainda que o público pagante divulgado seja ínfimo em relação ao público realmente presente e que faz muita festa, vaia, aplaude, pula, xinga e canta, fazendo do velho estádio um daqueles “alçapões” tão temidos no futebol. O futebol mato-grossense precisa da ampliação do Dutrinha.
Animado com o desempenho do Mixto na série “D” e com a perspectiva do Operário na Copa do Brasil, o torcedor cuiabano-varzeagrandense recebe como um balde de água fria a notícia de que a ampliação do Dutrinha não estaria mais nos planos da Agecopa. A construção do novo Verdão e dos dois CT’s exigidos pela FIFA não podem ser pretextos para a não ampliação do Dutrinha, hoje tecnicamente tão fácil e barata em relação a tudo que se planeja investir na Copa do Pantanal. Os competentes arquitetos da Agecopa podem projetá-la com rapidez – se é que já não o fizeram - usando a tecnologia dos pré-moldados ou até das estruturas metálicas removíveis, usada no novo Verdão. Para evitar nova interdição do estádio a solução seria uma nova arquibancada no lado do Sesc Arsenal, elevando a capacidade do Dutrinha para mais de 10 mil espectadores, suficiente para garantir o mando de campo dos times locais.
Sem poder jogar até 2014 ou 2015 os jogos mais difíceis ao lado de suas torcidas os times de Cuiabá e Várzea-Grande ficam condenados em suas aspirações de ascensão no futebol brasileiro. E seria o fim. Conhecendo a sensibilidade pública de Carlos Brito, a cuiabanidade de Yênes Magalhães, a história de Agripino Bonilha no futebol mato-grossense e a paixão mixtense de Roberto França, acredito que a Agecopa fará da Copa do Pantanal um meio de reconstrução do futebol de Mato Grosso, em especial de Cuiabá e Várzea Grande. O Dutrinha ampliado é a ponte necessária aos novos bons tempos do nosso futebol, condição indispensável à viabilização futebolística do novo Verdão.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 31/08/2010)