"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



terça-feira, 28 de outubro de 2008

VIVA O PREFEITO!

José Antonio Lemos dos Santos


     A cidade é considerada a maior e a mais exitosa das invenções do homem, tanto em tamanho como em complexidade. Como criação humana, trata-se de um objeto artificial, isto é, construído pelo homem. Não dá em “pé de árvore”, precisa ser construída. É um centro produtor de bens e serviços, para atender a demanda de uma região que lhe dá origem, assim como para seu consumo interno, subsistência de sua população, da qual também é moradia, sua “grande casa”.
     Essa fantástica máquina de produção e de vida, quando saudável, está em permanente construção, ressaltando sua dimensão técnica de alta especialização. Mas não é uma construção com um só dono e um só construtor. O dono de uma cidade é o cidadão, que é também o seu construtor e que são milhares ou milhões, o que destaca a outra face da cidade, a sua dimensão política.
     É fácil perceber a complexidade dessa grande obra e a dificuldade de fazê-la chegar a resultados coerentes e harmônicos. Lembro sempre da piada que diz que o camelo era para ser inicialmente um cavalo, mas teve suas partes feitas por pessoas diferentes, sem um projeto comum nem coordenação, e que na hora de serem juntadas produziu a surpresa de um animal todo desconjuntado, no qual suas partes parecem não se encaixar direito, que terminou sendo chamado de camelo, pois o resultado passou longe do cavalo originalmente desejado.
     Para evitar a história do camelo, na construção de uma cidade são indispensáveis o interesse ativo do cidadão pela cidade e um projeto, como na construção de uma casa, um projeto que expresse a cidade desejada pelos cidadãos – o chamado plano diretor de desenvolvimento urbano, que tem que refletir as dimensões técnica e política, regional e local da cidade. E é também fundamental a autoridade do prefeito, legitimado pelo voto e firme na construção do bem-comum.
     A grande importância de um prefeito está na sua obrigação de ser o líder e o coordenador dessa grande obra, com olhos de administrador e de estadista, assegurando que a técnica e a participação cidadã caminhem juntas. A preponderância de uma sobre a outra, a demagogia ou a tecnocracia, são desvios danosos. Tarefa dificílima essa de entender e equacionar os problemas, viabilizar soluções, compatibilizar interesses, arregimentar esforços em nome de centenas de milhares de pessoas, morando em seu próprio objeto de trabalho, onde os problemas lhe batem diretamente à porta, dia após dia, noite após noite.
     Revigorado e aprovado nas águas de uma reeleição, Wilson Santos reassume a prefeitura de Cuiabá por mais quatro anos. Com a política no sangue, Wilson desde muito jovem caminha com desenvoltura pelos seus meandros, seja entre os mais humildes ou nos mais altos escalões dos poderes, galgando posições no executivo e legislativo, adquirindo experiência valiosa, enriquecida pelo primeiro mandato que finda.
     Com esta reeleição liberta-se da necessidade de padrinhos. De índio passou ao ultra-restrito grupo dos atuais dois ou três caciques da política mato-grossense. É senhor de seu destino político. Mais do que ninguém sabe de sua força eleitoral e de onde ela vem; onde perdeu votos que sempre lhe foram cativos, e onde ganhou muitos que antes lhe eram negados; enfim, onde melhorar, onde corrigir. Jovem ainda, cabeça aberta, tem tudo para ser o prefeito adequado no alvorecer do novo milênio. Renovado, o “galinho” guerreiro da juventude, pode ser também o “galinho” arauto dos novos tempos da Cuiabá globalizada, capital do agronegócio nacional, centro polarizador de uma das regiões mais dinâmicas do planeta. Que o Senhor Bom Jesus de Cuiabá o acompanhe, junto com Cuiabá e todos os cuiabanos, natos ou de coração.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá 28/10/2008)

terça-feira, 21 de outubro de 2008

ADMINISTRADOR E ESTADISTA

José Antonio Lemos dos Santos


     O artigo “Pelo gás e a ferrovia” da semana passada rendeu alguns valiosos comentários. Desde os elogiosos – um dos quais sugeriu um adesivo com o título - aos céticos para os quais os candidatos nem sequer leriam o artigo, passando pelo que diz que o autor está errado pois os assuntos tratados não seriam da competência municipal. Em respeito a todos, detenho-me sobre este último, pois reflete um entendimento bastante arraigado em Cuiabá, mas equivocado, a meu ver.
     Sabemos que toda cidade tem uma dimensão local e outra regional, e nesta última se encontra sua razão de ser e sustentabilidade. Muitos dos problemas mais sérios de uma cidade estão fora dela, exigindo das autoridades locais soluções em diferentes esferas de governo ou até mesmo no âmbito empresarial. Assim, gerir uma cidade necessariamente ultrapassa as competências administrativas municipais.
     Como unidade federativa, o município também vai muito além de sua dimensão administrativa, pois tem uma dimensão política, que lhe dá autonomia na condução de seus interesses. Creio que o equívoco vem do tempo em que Cuiabá tinha seus prefeitos nomeados pelo governador. Nomeados, perdiam poder enquanto autoridade, restando-lhes a função de administrar bem a capital, como prepostos do governador, legando aos sucessores esta perniciosa “síndrome do prefeito nomeado”.
     Pior, pois, pelas dificuldades enfrentadas pela prefeitura, o cargo era considerado do terceiro escalão da administração estadual. Na posse de um governador, a atenção pública priorizava os nomes para os cargos de presidente da Cemat, do Bemat, Cohab, Sanemat, e das secretarias de estado. Só depois vinha o nome do prefeito da capital. Empossado, era terceiro escalão mesmo, o que foi cristalizado no nosso imaginário político-popular, e que era bastante conveniente para os governantes que assim podiam se livrar de muitos problemas.
     Exemplar no caso de Cuiabá é o problema dos transportes. A principal razão da secular sobrevivência de nossa cidade é sua localização estratégica. Cuiabá é um encontro de caminhos, com a vocação natural de ser um grande pólo intermodal de transportes no centro do continente. Assim, é fundamental para a cidade a chegada da ferrovia, o aeroporto Marechal Rondon - pronto e internacionalizado, a duplicação da 163, a saída para o Pacífico e, a ecovia do Paraguai, mesmo que um seja em Cáceres, outro em Várzea Grande, ou que a competência seja de outras esferas de governo. Infelizmente, sobre assuntos como estes, o cuiabano se sente abandonado, passado para trás, cabendo ao prefeito, articulando a sociedade organizada, a iniciativa de cobrar a quem de direito. Se não for ele, quem seria?
     Restritos à burocracia, as propostas eleitorais prendem-se às tarefas da prestação dos serviços obrigatórios, na saúde, educação, transporte, segurança, lixo, etc, que nada mais são do que obrigações, que todos têm que oferecer e melhorar sempre, direito do povo que paga por elas. E os planos ficam iguais, enfadonhos, repetitivos a cada eleição. Nada de propostas estratégicas para o desenvolvimento do município, sobre os destinos da cidade e para onde conduzi-la.
     Cuiabá vai se transformar na Ouro Preto do agronegócio, como querem alguns, ou na metrópole centro-continental, exuberante na qualidade de vida de seus habitantes? Espero que o prefeito que assumir, ou reassumir a prefeitura de Cuiabá, coloque-se à sua altura, resgate a sua integralidade local e regional, de passado e de futuro, seja um bom gerente dos serviços que tem a obrigação de oferecer, mas assuma também o papel de verdadeiro estadista, líder condutor do desenvolvimento pleno de sua cidade.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 21/10/2008)

terça-feira, 14 de outubro de 2008

PELO GÁS E A FERROVIA

José Antonio Lemos dos Santos


     A cidade vive dos que vivem nela, como aprendemos com Alves de Oliveira. A qualidade de vida de uma cidade é qualidade de vida de sua população, e isto é emprego e renda, que vêm das suas atividades produtivas. Daí a importância da atual campanha eleitoral ter abordado a questão da atração de empresas para a cidade, ainda que sob o enfoque da competição com o interior – a meu ver equivocado.
     Atrair novas empresas é importante, mas o prioritário no caso de Cuiabá e Várzea Grande é a consolidação dos mega-investimentos já instalados e que vêm sendo relegados ao total desinteresse e omissão das nossas autoridades e lideranças municipais, estaduais e federais, governamentais e civis. Totalmente esquecidos pelos candidatos no primeiro turno. Desinteresse tamanho que chega a parecer armação contra Cuiabá e seu papel polarizador no estado.
     O gasoduto (US$ 200,0 mi!) trazendo o gás para Cuiabá vale por mil empresas! Está parado. O gás não é só energia, antes é matéria prima básica para diversas indústrias químicas que se instalariam aqui, como a fábrica de fertilizantes da Petrobrás, que tecnicamente tem Cuiabá como melhor localização – desde que exista o gás. Sem o gás, ganha Campo Grande. Como fonte de energia, o gás movia nossos taxistas, algumas empresas locais, uma termelétrica (US$ 500,0 mi!) e uma linha de transmissão (US$ 380,0 mi!). Cuiabá tinha virado pólo exportador de energia. Tudo parado ... mas pronto para funcionar a qualquer momento, desde que nossas autoridades se interessem.
     Os mega-investimentos valem por mil empresas porque têm o poder de gerar novas empresas. Que cidade no Brasil não gostaria de ter o 17º aeroporto do Brasil, o Marechal Rondon? Já em setembro chegou ao milionésimo passageiro no ano, movimento anual previsto para a belíssima estação, cujas obras estão vergonhosamente paralisadas. Quantas empresas estão em Cuiabá e Várzea Grande pelo aeroporto?
     Municípios de todo o Brasil lutam para ter um Porto Seco. Aqui – como cuiabano sinto dizê-lo – a maioria das lideranças locais, nem sabe do que se trata. Também vale por mil empresas, pois pode atrair para seu entorno, entre outras, empresas atacadistas de importação e exportação. Ademais seu interior é como uma zona franca e pode albergar indústrias montadoras destinadas à exportação.
     E a ferrovia? Para mim, a ferrovia mais viável do mundo, ligando o centro da região campeã nacional na agropecuária e uma das mais produtivas do mundo. Outro dia tive o desprazer de ver um infográfico do PAC constando a ferrovia só até Rondonópolis e, pior, uma outra ferrovia inventada nos últimos anos, ligando Nova Mutum a Goiás. Sobre esta o infográfico diz “Em estudos”. Mesmo assim, está lá no lugar da nossa ferrovia, com todos os estudos técnicos concluídos, inclusive com a ponte rodo-ferroviária (US$ 500,0 mi!) em funcionamento. Enquanto isso, a carnificina na rodovia Cuiabá-Rondonópolis. Um deboche!
     Por isso tudo, já sei como votar neste segundo turno. Votarei naquele que assumir o papel de legítimo líder maior do município, o verdadeiro prefeito, aquele que vai buscar os interesses de sua gente onde quer que seja. Aquele que, em respeito aos quase 30% dos eleitores mato-grossenses de Cuiabá e Várzea Grande, incluir a ferrovia e o gás em seu programa de ação, com compromisso efetivo de articular os setores competentes em todas as esferas e a sociedade civil, pelas suas chegadas definitivas em solo cuiabano. Só o gás e a ferrovia. Se os dois incluírem, ótimo! Escolherei o mais convincente. Se nenhum dos dois der ouvidos a este aprendiz de comentarista, aguardarei os dois, ou seus amigos, nas eleições de 2010.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 14/10/2008)

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A DESCENTRALIZAÇÃO INDUSTRIAL

A descentralização industrial




     Teve gente importante nestas eleições dizendo que Cuiabá vem perdendo força econômica em função dos diversos investimentos, especialmente na agroindústria, que estão se instalando em Mato Grosso, fora da capital. Vejo dois riscos nessa afirmação. Primeiro, é que essa falsa impressão vire “verdade” se continuar sendo repetida, como já aconteceu entre nós com Manso, e tentam fazer com a ferrovia. Segundo, é que, partindo de pessoas de destaque local, funcione como um marketing negativo de alto impacto contra a cidade.
     Os estudiosos dizem que a cidade é a maior, a mais complexa e exitosa das invenções do homem. Tem complexidade comparável a de um organismo vivo, com a agravante de muitas vezes se estender por quilômetros e abrigar milhões de pessoas. Daí existir a ciência do Urbanismo, ainda que muito centrada nas dimensões intra-urbanas.
     Mas é nas relações regionais que está a razão de ser de uma cidade. Ela surge em função do excedente econômico produzido por uma região, da qual é parte funcional como centro articulador de sustentação e propulsão, num processo contínuo de ajuda mútua, ascendente ou descendente conforme as condições de favorabilidade. A região (hinterland) de uma cidade pode envolver outras cidades, cada qual com sua sub-região, numa divisão de trabalho que otimiza as potencialidades regionais, e resulta em uma rede urbana hierarquizada que parte das relações primárias de produção e chega até a metrópole nacional ou mundial.
     Quando a economia cresce, tende a se otimizar, seja com o aumento de produtividade ou com a verticalização de sua produção, agregando in loco de valores aos seus produtos. Essa verticalização na economia vai determinar a verticalização também da rede urbana. As redes refletem o dinamismo regional. Surgem novas cidades e cidades antigas ganham novas posições na rede, com funções antes desempenhadas pelas do nível hierárquico superior, impulsionando para cima toda a rede urbana, em todos os seus níveis.
     É o que assistimos em Mato Grosso: uma verdadeira reestruturação da rede urbana em função de seu novo perfil econômico. Cidades de pouca expressão ou que não existiam há pouco, ascendem à condição de receber grandes estruturas produtivas que antes ficariam na capital, trazendo a agregação de valor o mais próximo das áreas de produção. Por sua vez a cidade pólo, no caso a capital, é contemplada com novas funções de maior complexidade e sofisticação que antes a região não tinha condições de dispor.
     As lideranças de Cuiabá e Várzea Grande devem ter estas novas funções como foco, criando políticas públicas agressivas de atração e consolidação dos empreendimentos oportunizados por elas. Colaboração e parcerias, ao invés de comparações ou disputas com o interior. Devem também, e já, sacudir os espíritos e lutar pelos mega-investimentos já instalados ou em instalação, como o porto-seco, o aeroporto internacional, o gasoduto e a termelétrica - criminosamente negligenciados - e a ferrovia.
     O atual momento é extraordinário para a região como um todo, sem perdas, só ganhos. É a expressão do desenvolvimento em sua forma mais saudável. A Grande Cuiabá está no centro dessa revolução e também se transforma rapidamente, ainda que de forma espontânea. Aos nossos planejadores, cabe entender quais os papéis destinados às nossas cidades nestes tempos de globalização e prepará-las adequadamente para suas novas funções, olhando para o futuro e não para o passado.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 07/10/2008)