"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



terça-feira, 30 de dezembro de 2008

DE 1988 A 2008

José Antonio Lemos dos Santos


     No início de 1989 escrevi no Diário de Cuiabá o artigo “88, o ano de Cuiabá” avaliando o ano recém findado como “talvez o mais positivo da história recente” de Cuiabá, tendo em vista o início da construção de Manso, a aprovação pela Sudam do projeto da ligação de Cuiabá ao sistema ferroviário nacional, e o lançamento da proposta da saída rodoviária para o Pacífico, por San Matias. Com estes três projetos estariam equacionados os problemas da distância aos centros produtores e consumidores e a deficiência energética, considerados o “calcanhar de Aquiles” de Cuiabá e de Mato Grosso, consolidando a vocação de Cuiabá de grande entroncamento sul-americano multimodal de transporte. Após 20 anos, o que restaria da euforia daquele artigo?
     A obra de Manso foi iniciada em 1988, paralisada um ano após com grandes prejuízos, e reiniciada em 1998. Inaugurada em fins de 2000, Manso trouxe a regularização de vazão do rio Cuiabá, a proteção urbana contra as grandes cheias – seu objetivo inicial - e a geração adicional de 210 MW de energia. Poderia ter ido além, mas até hoje pouca gente importante sabe que APM Manso significa “aproveitamento múltiplo”, que prevê também o abastecimento de água por gravidade para Cuiabá e Várzea Grande, a irrigação de 50 mil hectares na Baixada Cuiabana, empreendimentos na área de turismo e da aqüicultura.
     Quanto à ferrovia, aconteceram muitos avanços, como em 1989 a outorga da Concessão à Ferronorte, a inauguração em 1998 da ponte rodoferroviária sobre o rio Paraná, seu principal e mais dispendioso obstáculo, e a chegada dos trilhos a Alto Araguaia. Já a saída para o Pacífico encontrou alento no início do primeiro governo Maggi, com o governador pessoalmente liderando uma expedição ao Chile. Mas ficou por aí, talvez devido ao atual quadro de insegurança na Bolívia, com a própria expedição do governador sofrendo ameaças de seqüestro.
     Hoje vemos que, em energia, fomos aos céus e voltamos ao inferno. A geração de Manso foi reforçada pelo gasoduto e a termelétrica (um complexo de mais de 1,3 bilhão de dólares!) e Mato Grosso passou a ser exportador de energia, abrindo extraordinárias perspectivas de desenvolvimento, conforto e segurança para sua gente. Em 2007 o desastre! Por razões verdadeiras ainda não esclarecidas, a Bolívia cortou o gás que fornecia a Mato Grosso, o governo federal não se importa com o caso e nossas autoridades e lideranças ficam omissas, ou sem reação à altura. O Estado estaria às velas não fosse Manso, porém no limite e sem nenhuma confiabilidade no sistema.
     Da mesma forma, nos transportes fomos do sonho ao paroxismo. Apesar de definida em Lei Federal, de ser objeto de uma Concessão da União, da sede oficial da Ferronorte ser em Cuiabá, depois de tanta luta e vencidos mais da metade de seus 974 km previstos até Cuiabá, a ferrovia está parada em Alto Araguaia desde 2002, e subitamente vê questionada a viabilidade econômica do trecho Rondonópolis/Cuiabá, seus últimos 200 Km. No PAC foi trocado por uma ligação Lucas do Rio Verde/Uruaçu, Goiás, idéia nova sem nada definido publicamente, que poderá até ter sua viabilidade comprovada, mas nunca mais viável que a ligação de Cuiabá. As estradas não suportam o movimento e chegam ao colapso. O Marechal Rondon, com as obras paralisadas, insuficiente, ganha o “reforço” de sua velha ala de desembarque, sem ar e sem água.
     Eufórico, o artigo de 89 concluía que “para 1989 a responsabilidade é imensa, principalmente para aqueles que são pagos para zelar pelos interesses do nosso povo, que são os políticos. Não se pode admitir qualquer retrocesso nesses projetos, pois o mais difícil já foi superado.” Será? O alerta de 89 parece valer para 2009.
(Piblicado pelo Diário de Cuiabá em 30/12/2008)

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

A FORÇA ECONÔMICA DE CUIABÁ

José Antonio Lemos dos Santos


     Por mais que alguns insistam em difundir a falsa idéia de que Cuiabá não produz nada, que Cuiabá só tem funcionários públicos, a realidade salta aos olhos de forma eloqüente e indiscutível, como nos mostram os dados do IBGE, divulgados pelo Diário de Cuiabá no último dia 17, em matéria de Marianna Peres. A insuspeita pesquisa mostra uma realidade dinâmica e de acentuado crescimento, comprovando tudo o que o simples bom senso percebe nas ruas, no comércio, indústrias, etc., mesmo nos dias de hoje, em plena crise global.
     Sem contar Várzea Grande que forma com Cuiabá um mesmo núcleo urbano, segundo os dados do IBGE a economia cuiabana apresentava em 2006 um PIB de R$ 7,12 bilhões, o 42º entre os mais de 5 mil municípios brasileiros, sendo o segundo maior do Centro-Oeste! Já o PIB per capita salta de R$ 7,75 mil em 2002 para R$ 13,24 mil em 2006, com um crescimento espetacular de 70,8%, já considerando o ano de 2006, de forte crise, especialmente em nossa região. “Mesmo sob o ‘ápice da crise’, a renda média de 2006 na Capital ficou 4,8% acima da média brasileira, que foi de R$ 12,68 mil”, ressalta a matéria.
     Em termos de Mato Grosso, a matéria jornalística informa que “as riquezas produzidas na Capital são o maior contribuinte ao PIB do Estado, que em 2006 somou R$ 35,38 bilhões”, isto é, mais de 20% da economia estadual (exatos 20,12%)! Isto, repito, sem contar Várzea Grande, que forma com Cuiabá uma mesma cidade. “Ah, mas essa proporção já foi muito maior no passado”, repetem os que insistem em promover uma falsa decadência cuiabana. Correto, quando só existia Cuiabá no estado, a economia cuiabana era 100% da economia do estado, e de lá para cá essa proporção (número relativo) só vem decrescendo, à medida que acontece o desejável e extraordinário desenvolvimento do interior mato-grossense. Mas os números absolutos crescem sempre, tanto na capital quanto no interior, com uma realidade impulsionando a outra mutuamente, numa simbiose ascendente de sucesso.
     Os dados divulgados corrigem também uma afirmação que já foi válida, mas que nos dias atuais revela-se totalmente incorreta, qual seja, a de que a economia cuiabana depende da administração pública. Segundo a mesma pesquisa, com um grau de participação estatal oscilando entre 10 e 13%, Cuiabá atualmente situa-se em 16º lugar entre as capitais nesse quesito, mostrando que a economia local já alcançou sua autonomia em relação ao estado, que ainda tem participação significativa, mas muito longe de uma relação de dependência. Na década de 70 chegava a 60%! Daí a lenda.
     Cuiabá e interior, centro polarizador e seu hinterland, são duas faces de uma mesma moeda que é a região. No nosso caso, uma das regiões mais dinâmicas do planeta. Não há como dissociar o desenvolvimento de uma e de outra. Quanto mais cresce o interior mais cresce a capital, e vice-versa. Qualquer crescimento, estagnação ou queda na economia regional se refletirá em todas as dimensões regionais. Os atuais tempos globais apontam para dificuldades na economia, que serão melhor enfrentadas se considerado o conjunto regional, em um esforço colaborativo entre as cidades do estado.
     Os dados do IBGE trazem esclarecimentos há muito necessários e surgem como importante presente natalino para Cuiabá. Só uma correta leitura da realidade regional possibilitará que as autoridades e lideranças locais situem-se de fato à altura de nossa cidade, de forma a prepará-la adequadamente para continuar desempenhando seu papel polarizador, ajudando a promover o desenvolvimento regional e recebendo os benefícios desse desenvolvimento.
(Publicado pelo Di[ário de Cuiabá em 23/12/2008)

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

CUIABÁ E SUAS ÁREAS DE RISCO

José Antonio Lemos dos Santos


     As recentes tragédias urbanas no Sul/Sudeste brasileiro, em especial em Santa Catarina, recomendam uma reflexão sobre as condições de risco das nossas cidades. Dependendo do potencial de risco de cada caso, talvez fosse a hora de reflexões coletivas, tais como seminários técnicos abertos ao público em geral para esclarecimento e divulgação do assunto. Como bem mostram os 127 mortos e os quase 30 desaparecidos em Santa Catarina, trata-se de assunto sério sobre o qual a população deveria ser mais informada, estimulando seu interesse e participação no controle da evolução da ocupação do solo de suas cidades.
     Nunca se pode ficar tranqüilo em relação às áreas de risco. Enquanto restar uma pessoa ocupando uma delas, a situação é grave, e todos os esforços devem ser envidados para sua desocupação total. Colocada a questão dessa forma pode-se dizer, grosso modo, que, com relação aos períodos das chuvas, em Cuiabá temos dois tipos de áreas de risco: as áreas inundáveis ligadas ao rio Cuiabá, e as áreas de enxurradas ligadas ao rio Coxipó e aos diversos córregos que cortam a cidade. Ambas exigem a atenção permanente da prefeitura, através de seus órgãos de monitoramento urbano e da sempre atenta Defesa Civil, bem com dos governos estadual e federal, com recursos para as desocupações necessárias, em projetos consistentes, e de todos os cidadãos, apoiando e cobrando quando necessário. E a prefeitura vem realizando importantes ações nesse sentido, ainda que persistam muitas ocupações de alto risco, e outras continuem aparecendo isoladamente.
     Nesse assunto Cuiabá tem a seu “favor” o trauma da cheia de 1974, ocorrida no início da explosão demográfica do último fim de século, fazendo que o processo de ocupação posterior acontecesse com um pouco de respeito e temor pelas águas, principalmente em relação ao rio. Infelizmente esse mesmo sentimento não se estendeu aos córregos, que apresentam riscos maiores, pois enchem e vazam rapidamente, sem dar tempo para fugas, sacrificando principalmente crianças, em tragédias que ainda se repetem entre nós.
     Desponta nesse período a figura do professor Domingos Iglesias, que, como técnico e chefe da Defesa Civil estadual por muito tempo, acompanhou sempre de perto, com cuidado e firmeza a evolução das ocupações irregulares, cobrando sempre das autoridades as providências de controle. Nesse tempo ensinava sobre o “império das águas”, áreas de “respiração” dos rios, nas quais exercem seu poder e cobram seu espaço de forma inexorável e, muitas vezes, cruel.
     Outro efeito da cheia de 74 foi a construção de Manso, concebida primordialmente para a proteção de Cuiabá e Várzea Grande contra novas cheias daquele porte, tarefa que vem cumprindo com eficiência. Por exemplo, em 15 de janeiro de 2002, seu primeiro ano de existência, impediu que passassem por Cuiabá 3250 m3 de água por segundo, um volume superior ao verificado na cheia de 74. Diferente do que muitos pensam, essa é a principal função de Manso, e não a geração de energia. E ai de nós hoje se não fosse ela, com o inaceitável corte do gás boliviano e a paralisação da termelétrica.
     Outro avanço de nossa cidade é a disponibilidade da Carta Geotécnica, elaborada pela UFMT na segunda gestão municipal de Frederico Campos, início da década de 1990, como um dos principais subsídios à elaboração do seu Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano. Destaque-se que Cuiabá foi uma das pioneiras no Brasil a produzir este instrumento fundamental para o planejamento urbano, e até hoje ainda é uma das únicas a tê-lo. Deveria ser matéria obrigatória do nosso ensino de primeiro grau.
(Publicado pelo Diáro de Cuiabá em 16/12/2008)

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

DURAS LIÇÕES QUE ESQUECEMOS

José Antonio Lemos dos Santos


     Novamente a população brasileira sofre com uma grande tragédia se abatendo sobre nossas cidades, chorando mortos, amparando desabrigados, contabilizando prejuízos e, sobretudo, esbanjando solidariedade. Mais uma vez nossas cidades são pegas despreparadas pelas chuvas que se repetem todos os anos, ciclicamente com maior ou menor intensidade. De novo nossas autoridades mostram-se tomadas pela surpresa, sensibilizadas, desdobrando-se no atendimento às vítimas e para o mais breve retorno à normalidade da vida anterior.
     E em breve estaremos de volta à normalidade da vida anterior, como se isso fosse possível para aqueles que perderam parentes, perderam o lar duramente construído. “O lar não mais existe, ninguém volta ao que acabou”, canta um belo e antigo samba. Como voltar? Não sei. O fato é que todos voltamos e antes do próximo ano tudo será esquecido, e a vida anterior é retomada, até que a próxima tragédia nos faça chorar de novo. As encostas, as áreas inundáveis e outras zonas de riscos voltam a ser ocupadas, sob a aprovação silenciosa de todos nós que, sem perceber – ou fingindo não perceber – tornamo-nos cúmplices da irresponsabilidade urbana que anualmente mata – e mata muito - sob os mais diferentes pretextos, não só nas chuvas.
     Pior é que a normalidade anterior volta plenamente como se nada tivesse acontecido, a não ser por algumas obras oportunistas, que na maioria das vezes não resolvem, ou até agravam, o problema que as justificaram publicamente. Findas as águas, nem as lições ficam para evitar futuras tragédias semelhantes. Mas, não custa pensar ao menos sobre duas das lições insistentemente repetidas por essas tragédias.
     A primeira delas é que a cidade é uma coisa muito séria e não pode mais ser tratada apenas como um objeto político. Quanto mais crescem, mais complexas ficam e devem ser tratadas também, por profissionais especializados nas diversas áreas de conhecimento que envolvem, com papel especial para o urbanista que tem a responsabilidade social de articulá-los em um conjunto objetivo. Nem só o político – a quem compete decidir, baseado em alternativas técnicas – nem só o técnico – que deve subsidiar o político com as soluções técnicas viáveis - com a participação institucional efetiva da sociedade civil organizada, através de conselhos setoriais, integrados em um conselho superior, de fatos representativos.
     Outra lição que salta aos olhos é a urgência da execução das leis dos planos diretores urbanos. Hoje praticamente todas as nossas cidades dispõem de seu plano diretor e das disposições para uso e ocupação do solo urbano, dele decorrente. São instrumentos elaborados para serem de fato aplicados e não só para cumprir exigências federais, ou compor a estante do gabinete dos prefeitos. Não se pode mais falar em falta de planejamento como álibi para crimes no gerenciamento do desenvolvimento urbano, em especial no processo da ocupação do solo das cidades. Temos leis de sobra, que deveriam estar sendo cumpridas, e não estão.
     A persistir a falsa alegação da falta de leis - sempre reiterada entre lágrimas nessas horas - que fosse então aplicada a Lei Federal 6766, de 1979 - isto mesmo, de 1979! – a lei Lehman, que proíbe em todo o Brasil, entre outros, o parcelamento de áreas inundáveis ou com declividade acima de 30%. Quanta gente teria sido salva, quantas tragédias evitadas, quanta qualidade de vida agregada às populações urbanas, se esta lei estivesse sendo aplicada nestas suas quase três décadas de existência oficial nos cartórios, mas criminosamente desconsiderada na vida real de nossas cidades.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 09/12/2008)

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

JOAQUIM MURTINHO E OS BANCOS

Joaé Antonio Lemos dos Santos


     É bom lembrar que a atual crise global originou-se nos bancos das grandes nações; agora o mundo todo busca arrumar rapidamente trilhões de dólares para salvá-los. Mas, para matar a fome na África... Não é preciso ser financista para se preocupar com tal quadro, que me faz lembrar Joaquim Murtinho, conterrâneo que no próximo 7 de dezembro comemoraria 160 anos de nascimento.
     Joaquim Murtinho era engenheiro civil e médico homeopata, e para Rubens de Mendonça, o maior estadista e financista brasileiro no período republicano. Nascido em 1848, em Cuiabá, foi professor da Escola Politécnica, Deputado Federal, Senador, Ministro da Viação e da Fazenda de Campos Sales. Muitos hoje só o conhecem como nome de rua, aqui, no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Campo Grande, onde é ainda nome de escola, ou como nome de cidades em Mato Grosso do Sul e Minas Gerais.
     Seu prestígio era tamanho que certa vez Dom Pedro II, Imperador do Brasil, tido como um dos governantes brasileiros mais cultos, assistindo a uma palestra dele sobre homeopatia, quis questioná-lo e recebeu de volta a sugestão de que quando "tivesse ímpetos de assistir a uma defesa de tese que Sua Majestade não entenda, deixe-se ficar em casa e leia uma página de Spencer".
     Pioneiro da homeopatia no Brasil foi, porém, como Ministro da Fazenda que ficou na história. Cito Joelmir Betting em trechos de um artigo de 1984, na Folha de São Paulo, mostrando sua atualidade: “O saneamento da moeda nacional começou com a presença mágica do ministro Joaquim Murtinho (a partir de 1899). Murtinho só não é apostila nas escolas de economia do mundo ocidental porque nasceu no Brasil, teorizou no Brasil – e não em algum reduto da aristocracia acadêmica nos dois lados do Atlântico Norte.”
     Diz mais: “Mal empossado no cargo de chanceler do Tesouro, que ele chamava de “monarca dos entulhos”, Joaquim Murtinho disparou um vigoroso “pacote” econômico, politicamente atrevido: a palavra de ordem era a de acabar, em rito sumário, com a especulação financeira do setor bancário”, e segue, “Murtinho entendia que o Brasil da virada do século não podia tolerar uma economia meramente escritural, era preciso promover o refluxo da poupança nacional do mercado de papéis e de divisas para o mercado de produtos e de serviços.” Para Betting, como resultado a inflação foi quase a zero, mas gerando o “pânico bancário” de 1900, com o sistema financeiro “experimentando uma quebradeira em cascata.”
     Reconhecendo o valor dos bancos - aprendi com meu pai, que era bancário – fecho com Betting em sua conclusão: “O “czar” Murtinho lavou as mãos enluvadas: que se quebrem todas as casas bancárias, desde que se salvem todas as fábricas, empórios e fazendas...”
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 02/12/2008)

terça-feira, 25 de novembro de 2008

CUIABÁ E A CRISE

José Antonio Lemos dos Santos


     Na semana passada os jornais publicaram que o governo brasileiro chamou seu embaixador em Quito em protesto pela decisão do governo equatoriano de não pagar uma dívida de US$ 243,0 milhões com o BNDES referente a uma obra de uma empreiteira brasileira naquele país, acrescentando que esta é uma crise “séria”. Tomara que nosso governo esteja revendo sua forma, no mínimo generosa para muitos observadores, de encarar certas atitudes tomadas ultimamente por alguns dos nossos países vizinhos em relação a diversos interesses brasileiros, entre estas, o corte do fornecimento do gás boliviano a Mato Grosso, há mais de ano, paralisando um gasoduto e uma termelétrica de quase 1 bilhão de dólares e responsáveis por 70% da energia consumida no estado.
     Também na mesma semana foi publicada a lista de obras do Ministério dos Transportes para Mato Grosso, constantes do Plano Plurianual 2008-2011, lá constando, entre diversos itens, dois de maior interesse, especialmente para a cidade de Cuiabá. O primeiro é a construção da Ferronorte, de Alto Araguaia até Rondonópolis, confirmando a já longa expectativa dos trilhos ferroviários avançarem pelo território mato-grossense em direção a Cuiabá, maior centro de cargas do estado, dando continuidade assim ao estabelecido na concessão federal que trata do assunto. Mesmo com Mato Grosso ocupando posição chave no Ministério dos Transportes, o máximo que se poderia esperar, além disso, seria alguma referência ao trajeto Rondonópolis-Cuiabá, ao menos com os estudos ambientais definitivos a partir de Mineirinho, na BR-163 – o que seria uma agradável surpresa para os cuiabano-varzeagrandenses.
     O segundo ponto a destacar é a “Adequação de trecho rodoviário na BR-163 entre Rondonópolis – Cuiabá – Posto Gil (possivelmente duplicação ou terceira faixa)”, item que frustra a maior parte dos mato-grossenses, principalmente as centenas de milhares de pessoas que dependem desse trajeto para tocar suas vidas, em diversas atividades, importantes para cada um e para o estado como um todo. Era tido como certo o início da duplicação desse trecho rodoviário que é o mais movimentado no estado, que já chegou ao limite de sua transitabilidade, projeto falado, prometido pelas autoridades há muito tempo e, sobretudo, extremamente necessário não só pela deseconomia que gera, como pelo drama das vidas ceifadas a cada ano que passa.
     Neste item chama a atenção que nem sequer está definido o que vai ser esta “adequação”, isto é, o que vai ser feito em termos de obras, constando na matéria jornalística apenas a expressão “possivelmente duplicação ou terceira faixa”, não contestada ou esclarecida posteriormente pelo Ministério. Sem esta definição não há projeto técnico e sem este não pode haver licitação, condição necessária para o início das obras, que para todos parecia imediato.
     As matérias jornalísticas coincidem com a iniciativa dos Conselhos Federal e Regional de Economia e da Prefeitura de Cuiabá de promoverem na capital uma discussão sobre a crise global, olhada do ponto de vista de nossa cidade e de nosso estado, com a presença de figuras nacionais e locais de notório conhecimento sobre o assunto. Seus assuntos poderiam muito bem ser tratados em tão importante evento, afinal, nenhuma crise global será equacionada em nível local sem passar pela solução dos nossos graves problemas da energia e do transporte.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 25/11/2008)

terça-feira, 18 de novembro de 2008

TERMELÉTRICA EM MARTE

José Antonio Lemos dos Santos


     Embora mergulhada com todo o mundo em uma grave crise de dimensões ainda não definidas, Cuiabá, junto com Várzea Grande, vive o melhor momento de sua história, deixando de ser aquele pacato centro de um imenso vazio regional e passa a ser a metrópole polarizadora de uma das regiões mais dinâmicas do planeta. Por uma série de razões, caminha celeremente para a realização de sua vocação natural de metrópole centro-continental, encontro multimodal dos caminhos do continente sul-americano. É a tendência; se não é destino, é quase. Só não se realiza se houver algum esforço muito forte em sentido contrário.
     No último dia 12, em matéria de Marcondes Maciel, o Diário de Cuiabá trouxe notícia dos prejuízos que a população dos bairros Santa Isabel, Jardim Araçá, Porto e Cristo-Rei vêm sofrendo com os constantes cortes e oscilações de energia que estão acontecendo na cidade ultimamente. Esta matéria me fez lembrar imediatamente da situação que vivíamos antes do funcionamento de Manso, do gasoduto e da Termelétrica Cuiabá I, como prefiro chamá-la. Mato Grosso dependia da energia de Cachoeira Dourada, na divisa de Goiás com Minas, que nos chegava através de uma linha de transmissão, que pela sua grande extensão - quase 800 quilômetros – expunha-se a grandes riscos em seu funcionamento, por fenômenos naturais ou não. Raios, ventanias e até sabotagens eram motivos de preocupação. “Ventou em Jataí, queimou uma geladeira aqui”, como se dizia na época.
     Mato Grosso e Cuiabá pagaram muito caro por esta carência energética crônica. Muitas empresas deixaram de se instalar aqui por falta de energia, que na verdade não era bem falta de energia, e sim, um abastecimento inseguro, inconfiável e limitado. Por exemplo, os edifícios residenciais, industriais ou comerciais tinham que ter geradores próprios, um dos custos adicionais que por décadas refreavam o desenvolvimento do estado e da cidade.
     Até que aconteceram Manso, o gasoduto e a termelétrica, pela visão e ação de estadista do saudoso Dante de Oliveira, que muita gente importante não entendeu até hoje, ou finge não entender. Mato Grosso, com energia abundante e segura, passou a exportador de energia, com perspectivas fantásticas de novos investimentos, como nos acenava animado o também saudoso José Epaminondas.
     Incrível, a termelétrica de US$ 750 milhões está paralisada há mais de ano e com ela um gasoduto de US$ 200 milhões. Pior, nesse período não se viu qualquer reação consistente de nossas autoridades, ou da sociedade organizada cuiabana e mato-grossense. Nem do governo, nem da oposição! Não fosse o maior empreendimento privado em Mato Grosso, marcante por si só, diríamos tratar-se de uma termelétrica no longínquo planeta Marte, nada a ver com a qualidade de vida de nossa gente e as perspectivas de desenvolvimento de nossa terra, cuiabana e mato-grossense.
     Também no Diário de Cuiabá, em outra matéria, de Marianna Peres, o governador disse: “Trabalhamos dentro de uma nova filosofia que é chamada 'gás social'. Não será o gás para movimentar a termelétrica e sim para os veículos e para as indústrias que já operam com esse produto.” Grave. Dispensa maiores comentários. A termelétrica vale por milhares de empregos, reais e potenciais, mil empresas, grandes ou pequenas, de norte a sul de Mato Grosso, nos distritos industriais ou nos bairros ricos e pobres de nossas cidades. Mais social, impossível.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 18/11/2008)

terça-feira, 11 de novembro de 2008

DIA MUNDIAL DO URBANISMO

José Antonio Lemos dos Santos


     Surgida há 5 mil anos com a civilização, a cidade constitui a maior, mais complexa e mais bem sucedida das invenções humanas,transformando o mundo e acelerando os passos da evolução humana. De lá para cá a população foi se urbanizando, e neste ano de 2008, pela primeira vez na história, a população urbana global superará a população rural, com países desenvolvidos ou emergentes alcançando percentuais superiores a 80%, como é o caso do Brasil.
     Nessa trajetória o grande ponto de inflexão foi a Revolução Industrial, no século XVIII, que inicia um novo sistema produtivo baseado no capital e na indústria recém nascida, transformando novamente o mundo em todas as suas dimensões. Até então a cidade tinha sido uma experiência inquestionada, ainda que tenha enfrentado importantes crises, como na Roma imperial, que entrou em colapso e foi destruída. Com a industrialização, a urbanização se acelera vertiginosamente e a vida nas cidades se desequilibra gravemente, exigindo controle e intervenções no desenvolvimento urbano. Começa então a surgir a ciência do urbanismo, que evolui e supera o urbanismo modernista da Carta de Atenas – implodido com o conjunto de Pruitt-Igoe em 1972, passa pelas experiências pós-modernistas do Novo Urbanismo, e chega hoje diante de uma nova Revolução, a da informática e da globalização.
     De grande complexidade, a cidade é comparável a um organismo vivo, só que em dimensões grandes ou gigantescas, que vão das pequenas vilas até as metrópoles e megalópoles, ultrapassando as centenas e até milhares de quilômetros quadrados e chegando a abrigar dezenas de milhões de habitantes. Trata-se de um enorme recipiente, articulado regionalmente, onde se desenvolvem as relações urbanas em toda sua múltipla diversidade. Sua função, primordialmente, é permitir que tais relações aconteçam da melhor forma possível com sustentabilidade, conforto, segurança e, sobretudo, justiça. Infelizmente no Brasil - Mato Groso e Cuiabá incluídos, o Urbanismo ainda não recebe a consideração necessária.
     O Urbanismo, em construção constante, reflete a complexidade de seu objeto de trabalho e necessariamente aborda os diversos campos de conhecimento que a cidade envolve. Assim, o urbanista também evolui e não é mais um especialista no sentido estrito do termo, mas um generalista destinado a enxergar o organismo urbano com um todo, em toda sua transdiciplinaridade holística. Não se pode tratar os problemas da cidade sem antes tratar da cidade com problemas. Como na medicina, não se deve tratar a doença mas o doente, assim também não se pode tratar as doenças da cidade, mas a cidade doente. Catalisador dos especialistas exigidos pela complexidade urbana, o urbanista precisa saber um pouco de tudo para enxergar o todo, e, em especial, deve saber que o que sabe é quase nada para dispensar a companhia das especialidades nas múltiplas facetas técnicas e políticas da cidade.
     No dia 8 de novembro comemoramos o Dia Mundial do Urbanismo, criado em 1949 visando uma reflexão global sobre o assunto. As cidades de novo se aproximam de uma Revolução com as perspectivas da tecnologia e do ciberespaço (os enigmas dos novos espaços urbanos virtuais, por exemplo), e a eminência do colapso em problemas como água, lixo, transportes, poluição, aquecimento, energia, emprego, uso do solo e segurança. Crise, risco e oportunidade, quando o homem se transforma no atual bicho urbano, o Urbanismo se apresenta como o desafio do novo século.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 11/11/2008)

terça-feira, 28 de outubro de 2008

VIVA O PREFEITO!

José Antonio Lemos dos Santos


     A cidade é considerada a maior e a mais exitosa das invenções do homem, tanto em tamanho como em complexidade. Como criação humana, trata-se de um objeto artificial, isto é, construído pelo homem. Não dá em “pé de árvore”, precisa ser construída. É um centro produtor de bens e serviços, para atender a demanda de uma região que lhe dá origem, assim como para seu consumo interno, subsistência de sua população, da qual também é moradia, sua “grande casa”.
     Essa fantástica máquina de produção e de vida, quando saudável, está em permanente construção, ressaltando sua dimensão técnica de alta especialização. Mas não é uma construção com um só dono e um só construtor. O dono de uma cidade é o cidadão, que é também o seu construtor e que são milhares ou milhões, o que destaca a outra face da cidade, a sua dimensão política.
     É fácil perceber a complexidade dessa grande obra e a dificuldade de fazê-la chegar a resultados coerentes e harmônicos. Lembro sempre da piada que diz que o camelo era para ser inicialmente um cavalo, mas teve suas partes feitas por pessoas diferentes, sem um projeto comum nem coordenação, e que na hora de serem juntadas produziu a surpresa de um animal todo desconjuntado, no qual suas partes parecem não se encaixar direito, que terminou sendo chamado de camelo, pois o resultado passou longe do cavalo originalmente desejado.
     Para evitar a história do camelo, na construção de uma cidade são indispensáveis o interesse ativo do cidadão pela cidade e um projeto, como na construção de uma casa, um projeto que expresse a cidade desejada pelos cidadãos – o chamado plano diretor de desenvolvimento urbano, que tem que refletir as dimensões técnica e política, regional e local da cidade. E é também fundamental a autoridade do prefeito, legitimado pelo voto e firme na construção do bem-comum.
     A grande importância de um prefeito está na sua obrigação de ser o líder e o coordenador dessa grande obra, com olhos de administrador e de estadista, assegurando que a técnica e a participação cidadã caminhem juntas. A preponderância de uma sobre a outra, a demagogia ou a tecnocracia, são desvios danosos. Tarefa dificílima essa de entender e equacionar os problemas, viabilizar soluções, compatibilizar interesses, arregimentar esforços em nome de centenas de milhares de pessoas, morando em seu próprio objeto de trabalho, onde os problemas lhe batem diretamente à porta, dia após dia, noite após noite.
     Revigorado e aprovado nas águas de uma reeleição, Wilson Santos reassume a prefeitura de Cuiabá por mais quatro anos. Com a política no sangue, Wilson desde muito jovem caminha com desenvoltura pelos seus meandros, seja entre os mais humildes ou nos mais altos escalões dos poderes, galgando posições no executivo e legislativo, adquirindo experiência valiosa, enriquecida pelo primeiro mandato que finda.
     Com esta reeleição liberta-se da necessidade de padrinhos. De índio passou ao ultra-restrito grupo dos atuais dois ou três caciques da política mato-grossense. É senhor de seu destino político. Mais do que ninguém sabe de sua força eleitoral e de onde ela vem; onde perdeu votos que sempre lhe foram cativos, e onde ganhou muitos que antes lhe eram negados; enfim, onde melhorar, onde corrigir. Jovem ainda, cabeça aberta, tem tudo para ser o prefeito adequado no alvorecer do novo milênio. Renovado, o “galinho” guerreiro da juventude, pode ser também o “galinho” arauto dos novos tempos da Cuiabá globalizada, capital do agronegócio nacional, centro polarizador de uma das regiões mais dinâmicas do planeta. Que o Senhor Bom Jesus de Cuiabá o acompanhe, junto com Cuiabá e todos os cuiabanos, natos ou de coração.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá 28/10/2008)

terça-feira, 21 de outubro de 2008

ADMINISTRADOR E ESTADISTA

José Antonio Lemos dos Santos


     O artigo “Pelo gás e a ferrovia” da semana passada rendeu alguns valiosos comentários. Desde os elogiosos – um dos quais sugeriu um adesivo com o título - aos céticos para os quais os candidatos nem sequer leriam o artigo, passando pelo que diz que o autor está errado pois os assuntos tratados não seriam da competência municipal. Em respeito a todos, detenho-me sobre este último, pois reflete um entendimento bastante arraigado em Cuiabá, mas equivocado, a meu ver.
     Sabemos que toda cidade tem uma dimensão local e outra regional, e nesta última se encontra sua razão de ser e sustentabilidade. Muitos dos problemas mais sérios de uma cidade estão fora dela, exigindo das autoridades locais soluções em diferentes esferas de governo ou até mesmo no âmbito empresarial. Assim, gerir uma cidade necessariamente ultrapassa as competências administrativas municipais.
     Como unidade federativa, o município também vai muito além de sua dimensão administrativa, pois tem uma dimensão política, que lhe dá autonomia na condução de seus interesses. Creio que o equívoco vem do tempo em que Cuiabá tinha seus prefeitos nomeados pelo governador. Nomeados, perdiam poder enquanto autoridade, restando-lhes a função de administrar bem a capital, como prepostos do governador, legando aos sucessores esta perniciosa “síndrome do prefeito nomeado”.
     Pior, pois, pelas dificuldades enfrentadas pela prefeitura, o cargo era considerado do terceiro escalão da administração estadual. Na posse de um governador, a atenção pública priorizava os nomes para os cargos de presidente da Cemat, do Bemat, Cohab, Sanemat, e das secretarias de estado. Só depois vinha o nome do prefeito da capital. Empossado, era terceiro escalão mesmo, o que foi cristalizado no nosso imaginário político-popular, e que era bastante conveniente para os governantes que assim podiam se livrar de muitos problemas.
     Exemplar no caso de Cuiabá é o problema dos transportes. A principal razão da secular sobrevivência de nossa cidade é sua localização estratégica. Cuiabá é um encontro de caminhos, com a vocação natural de ser um grande pólo intermodal de transportes no centro do continente. Assim, é fundamental para a cidade a chegada da ferrovia, o aeroporto Marechal Rondon - pronto e internacionalizado, a duplicação da 163, a saída para o Pacífico e, a ecovia do Paraguai, mesmo que um seja em Cáceres, outro em Várzea Grande, ou que a competência seja de outras esferas de governo. Infelizmente, sobre assuntos como estes, o cuiabano se sente abandonado, passado para trás, cabendo ao prefeito, articulando a sociedade organizada, a iniciativa de cobrar a quem de direito. Se não for ele, quem seria?
     Restritos à burocracia, as propostas eleitorais prendem-se às tarefas da prestação dos serviços obrigatórios, na saúde, educação, transporte, segurança, lixo, etc, que nada mais são do que obrigações, que todos têm que oferecer e melhorar sempre, direito do povo que paga por elas. E os planos ficam iguais, enfadonhos, repetitivos a cada eleição. Nada de propostas estratégicas para o desenvolvimento do município, sobre os destinos da cidade e para onde conduzi-la.
     Cuiabá vai se transformar na Ouro Preto do agronegócio, como querem alguns, ou na metrópole centro-continental, exuberante na qualidade de vida de seus habitantes? Espero que o prefeito que assumir, ou reassumir a prefeitura de Cuiabá, coloque-se à sua altura, resgate a sua integralidade local e regional, de passado e de futuro, seja um bom gerente dos serviços que tem a obrigação de oferecer, mas assuma também o papel de verdadeiro estadista, líder condutor do desenvolvimento pleno de sua cidade.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 21/10/2008)

terça-feira, 14 de outubro de 2008

PELO GÁS E A FERROVIA

José Antonio Lemos dos Santos


     A cidade vive dos que vivem nela, como aprendemos com Alves de Oliveira. A qualidade de vida de uma cidade é qualidade de vida de sua população, e isto é emprego e renda, que vêm das suas atividades produtivas. Daí a importância da atual campanha eleitoral ter abordado a questão da atração de empresas para a cidade, ainda que sob o enfoque da competição com o interior – a meu ver equivocado.
     Atrair novas empresas é importante, mas o prioritário no caso de Cuiabá e Várzea Grande é a consolidação dos mega-investimentos já instalados e que vêm sendo relegados ao total desinteresse e omissão das nossas autoridades e lideranças municipais, estaduais e federais, governamentais e civis. Totalmente esquecidos pelos candidatos no primeiro turno. Desinteresse tamanho que chega a parecer armação contra Cuiabá e seu papel polarizador no estado.
     O gasoduto (US$ 200,0 mi!) trazendo o gás para Cuiabá vale por mil empresas! Está parado. O gás não é só energia, antes é matéria prima básica para diversas indústrias químicas que se instalariam aqui, como a fábrica de fertilizantes da Petrobrás, que tecnicamente tem Cuiabá como melhor localização – desde que exista o gás. Sem o gás, ganha Campo Grande. Como fonte de energia, o gás movia nossos taxistas, algumas empresas locais, uma termelétrica (US$ 500,0 mi!) e uma linha de transmissão (US$ 380,0 mi!). Cuiabá tinha virado pólo exportador de energia. Tudo parado ... mas pronto para funcionar a qualquer momento, desde que nossas autoridades se interessem.
     Os mega-investimentos valem por mil empresas porque têm o poder de gerar novas empresas. Que cidade no Brasil não gostaria de ter o 17º aeroporto do Brasil, o Marechal Rondon? Já em setembro chegou ao milionésimo passageiro no ano, movimento anual previsto para a belíssima estação, cujas obras estão vergonhosamente paralisadas. Quantas empresas estão em Cuiabá e Várzea Grande pelo aeroporto?
     Municípios de todo o Brasil lutam para ter um Porto Seco. Aqui – como cuiabano sinto dizê-lo – a maioria das lideranças locais, nem sabe do que se trata. Também vale por mil empresas, pois pode atrair para seu entorno, entre outras, empresas atacadistas de importação e exportação. Ademais seu interior é como uma zona franca e pode albergar indústrias montadoras destinadas à exportação.
     E a ferrovia? Para mim, a ferrovia mais viável do mundo, ligando o centro da região campeã nacional na agropecuária e uma das mais produtivas do mundo. Outro dia tive o desprazer de ver um infográfico do PAC constando a ferrovia só até Rondonópolis e, pior, uma outra ferrovia inventada nos últimos anos, ligando Nova Mutum a Goiás. Sobre esta o infográfico diz “Em estudos”. Mesmo assim, está lá no lugar da nossa ferrovia, com todos os estudos técnicos concluídos, inclusive com a ponte rodo-ferroviária (US$ 500,0 mi!) em funcionamento. Enquanto isso, a carnificina na rodovia Cuiabá-Rondonópolis. Um deboche!
     Por isso tudo, já sei como votar neste segundo turno. Votarei naquele que assumir o papel de legítimo líder maior do município, o verdadeiro prefeito, aquele que vai buscar os interesses de sua gente onde quer que seja. Aquele que, em respeito aos quase 30% dos eleitores mato-grossenses de Cuiabá e Várzea Grande, incluir a ferrovia e o gás em seu programa de ação, com compromisso efetivo de articular os setores competentes em todas as esferas e a sociedade civil, pelas suas chegadas definitivas em solo cuiabano. Só o gás e a ferrovia. Se os dois incluírem, ótimo! Escolherei o mais convincente. Se nenhum dos dois der ouvidos a este aprendiz de comentarista, aguardarei os dois, ou seus amigos, nas eleições de 2010.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 14/10/2008)

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A DESCENTRALIZAÇÃO INDUSTRIAL

A descentralização industrial




     Teve gente importante nestas eleições dizendo que Cuiabá vem perdendo força econômica em função dos diversos investimentos, especialmente na agroindústria, que estão se instalando em Mato Grosso, fora da capital. Vejo dois riscos nessa afirmação. Primeiro, é que essa falsa impressão vire “verdade” se continuar sendo repetida, como já aconteceu entre nós com Manso, e tentam fazer com a ferrovia. Segundo, é que, partindo de pessoas de destaque local, funcione como um marketing negativo de alto impacto contra a cidade.
     Os estudiosos dizem que a cidade é a maior, a mais complexa e exitosa das invenções do homem. Tem complexidade comparável a de um organismo vivo, com a agravante de muitas vezes se estender por quilômetros e abrigar milhões de pessoas. Daí existir a ciência do Urbanismo, ainda que muito centrada nas dimensões intra-urbanas.
     Mas é nas relações regionais que está a razão de ser de uma cidade. Ela surge em função do excedente econômico produzido por uma região, da qual é parte funcional como centro articulador de sustentação e propulsão, num processo contínuo de ajuda mútua, ascendente ou descendente conforme as condições de favorabilidade. A região (hinterland) de uma cidade pode envolver outras cidades, cada qual com sua sub-região, numa divisão de trabalho que otimiza as potencialidades regionais, e resulta em uma rede urbana hierarquizada que parte das relações primárias de produção e chega até a metrópole nacional ou mundial.
     Quando a economia cresce, tende a se otimizar, seja com o aumento de produtividade ou com a verticalização de sua produção, agregando in loco de valores aos seus produtos. Essa verticalização na economia vai determinar a verticalização também da rede urbana. As redes refletem o dinamismo regional. Surgem novas cidades e cidades antigas ganham novas posições na rede, com funções antes desempenhadas pelas do nível hierárquico superior, impulsionando para cima toda a rede urbana, em todos os seus níveis.
     É o que assistimos em Mato Grosso: uma verdadeira reestruturação da rede urbana em função de seu novo perfil econômico. Cidades de pouca expressão ou que não existiam há pouco, ascendem à condição de receber grandes estruturas produtivas que antes ficariam na capital, trazendo a agregação de valor o mais próximo das áreas de produção. Por sua vez a cidade pólo, no caso a capital, é contemplada com novas funções de maior complexidade e sofisticação que antes a região não tinha condições de dispor.
     As lideranças de Cuiabá e Várzea Grande devem ter estas novas funções como foco, criando políticas públicas agressivas de atração e consolidação dos empreendimentos oportunizados por elas. Colaboração e parcerias, ao invés de comparações ou disputas com o interior. Devem também, e já, sacudir os espíritos e lutar pelos mega-investimentos já instalados ou em instalação, como o porto-seco, o aeroporto internacional, o gasoduto e a termelétrica - criminosamente negligenciados - e a ferrovia.
     O atual momento é extraordinário para a região como um todo, sem perdas, só ganhos. É a expressão do desenvolvimento em sua forma mais saudável. A Grande Cuiabá está no centro dessa revolução e também se transforma rapidamente, ainda que de forma espontânea. Aos nossos planejadores, cabe entender quais os papéis destinados às nossas cidades nestes tempos de globalização e prepará-las adequadamente para suas novas funções, olhando para o futuro e não para o passado.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 07/10/2008)

terça-feira, 30 de setembro de 2008

A OBRIGAÇÃO DE SEREM ÓTIMOS

José Antonio Lemos dos Santos


     Ao contrário do vem sendo colocado na emoção de alguns programas políticos na TV, Cuiabá vive atualmente seu momento histórico de melhores e maiores perspectivas de desenvolvimento. Na verdade trata-se de Cuiabá e Várzea Grande, que são uma só cidade, a Grande Cuiabá. Tento me explicar.
     Nenhuma cidade vive de si mesma. De Livramento a Nova York toda cidade é o lugar central de uma região – maior ou menor – que gera o excedente econômico que lhe dá origem e sustentação. Cuiabá ao longo de sua história funcionou como o baluarte da civilização em uma vastíssima região – um vazio econômico no miolo continental sul-americano - destinada um dia a ser ocupada e integrada ao processo produtivo nacional e mundial. Os séculos se passaram e só a partir da década de 70, a região de fato começa a ser integrada, mas com tal êxito que hoje é a maior produtora na agropecuária nacional e uma das maiores fontes de alimentos para o mundo. Em suma: Cuiabá, que sempre foi um centro urbano pobre, polarizador de um imenso vazio econômico, hoje é o centro de uma região altamente produtiva, cada vez mais dinâmica e globalizada, rica e ávida pelo consumo de bens, serviços e insumos, que busca ser atendida pelo seu centro polarizador imediato. O desenvolvimento da economia estadual e sua conseqüente verticalização correspondem necessariamente a uma verticalização da rede urbana, com a sofisticação hierarquizada de todas as suas cidades. Assim, o desenvolvimento regional empurra Cuiabá para cima, para novos patamares de qualificação urbana. E isso já está acontecendo.
     Segundo. As taxas de imigração caíram muito no Brasil nas últimas décadas, e Cuiabá reflete essa situação com um crescimento populacional beirando a 2%, muito inferior àquelas em torno dos 8% das décadas de 60 e 70. É bom lembrar que taxas acima de 7% são consideradas tecnicamente inadministráveis em cidades de porte médio ou superiores. Mesmo com dinheiro. Como devem invejar os prefeitos cuiabanos que enfrentaram o boom populacional do último terço do século passado.
     Terceiro. Em especial na década de 90 a Grande Cuiabá vê a consolidação de mega-projetos que transformam positivamente suas perspectivas de futuro: 1- Manso, que, em seu aproveitamento múltiplo – ainda não totalmente explorado - oferece proteção urbana, a perenidade das águas do Cuiabá e ainda gera a energia que sempre constituiu obstáculo intransponível ao seu desenvolvimento da cidade. 2 - O gasoduto, trazendo o gás, energia limpa e barata, bem como, suas inúmeras aplicações como matéria prima para a indústria, fator de atração para importantes empreendimentos. 3 - A construção da ponte rodo-ferroviária sobre o rio Paraná, de fato o maior de todos os obstáculos à chegada da ferrovia a Cuiabá, com os trilhos chegando a Alto Araguaia, restando ser construídos apenas de 1/3 da distância original até Cuiabá. 4 - A internacionalização do aeroporto Mal. Rondon, readequado como um hub nacional e internacional, de posição central no continente. 5 - Por fim, a instalação do Porto Seco, também com as inúmeras possibilidades que oferece.
     Este quadro, somado a uma posição estratégica excepcional, fecha um conjunto de condições favoráveis jamais vivido por Cuiabá e Várzea Grande, e dificilmente encontrado em qualquer outra cidade do Brasil e do mundo. Os novos prefeitos têm que assumir a posição de verdadeiros líderes dos municípios, não apenas chefes das administrações municipais. Líderes lutadores por todos os assuntos do real interesse do município, em qualquer âmbito que se encontrem, do aeroporto a ferrovia, do Porto Seco ao gás, do gasoduto e termelétrica, correndo ainda atrás da fábrica de fertilizantes, e de todos os direitos e oportunidades que a cidade desfruta.
     O novo tempo já chegou a nossa cidade e pode ser lido facilmente no seu movimento cotidiano de pessoas, de novas empresas – grandes e pequenas, obras, etc. Não adianta procurá-lo nas estatísticas da década passada ou anteriores. Às futuras administrações das duas cidades cabe a responsabilidade de serem ótimos. Nada menos do que isso: ótimos. Sem desculpas. Basta colocarem-se a altura da cidade que vão administrar, prepará-la para o novo patamar urbano em que foi colocada, otimizando tudo o que tem de bom em suas perspectivas.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 30/09/10)

terça-feira, 22 de julho de 2008

CUIABÁ, O TERCEIRO SALTO

José Antonio Lemos dos Santos


     Como todas as cidades vivas e saudáveis, mesmo tricentenária, além de um passado – que nos orgulha e deleita - Cuiabá tem um presente e um futuro que precisam ser cuidados. Só esta visão dinâmica permite uma correta interpretação urbana de Cuiabá. Nessa perspectiva, a história urbana de Cuiabá distingue três momentos decisivos, marcando saltos estruturais em sua evolução, sem os quais a cidade teria virado museu.
     O primeiro poderia ser o salto da sobrevivência. Findo com relativa rapidez o ouro que lhe deu origem, a cidade morreria inevitavelmente. Mas foi tanto o ouro nestas bandas, que a região passou a interessar à Espanha e Portugal, que rediscutem o Tratado de Tordesilhas. Ainda no século XVIII, Cuiabá revitaliza, e de garimpeira vira base urbana para as intenções portuguesas de domínio regional. De Cuiabá, Portugal redesenhou o ocidente do Brasil.
     A partir daí Cuiabá, sem apoio, manteve certa estabilidade. Até que, por voltas de 1960, a cidade reafirma sua função de apoio regional, com a política nacional de ocupação da Amazônia Meridional, e vira o "portal da Amazônia". De menos de 60 mil habitantes, Cuiabá passa para cerca de 600 mil habitantes, em 3 décadas. De novo, a cidade teve que se virar sozinha diante de uma população que crescia a mais de 8% ao ano, sem nenhum apoio federal pelas imensas demandas urbanas que suportava. Este foi o salto da quantidade. Muita imigração e nenhum recurso.
     Ao final do século XX, as forças do segundo salto começam a dar sinais de esgotamento em Cuiabá. Mas não no vasto hinterland que ajudou a desenvolver. Os excedentes econômicos produzidos celeremente no interior do estado, Rondônia, Acre, sul do Pará e do Amazonas, e até no nordeste da Bolívia, começam a fazer o caminho inverso, buscando de novo Cuiabá como ponto de apoio, agora, como plataforma de consumo múltiplo, em especial nas áreas de comércio e serviços sofisticados, como na educação e da saúde, bem como na assistência técnica especializada.
     Ao mesmo tempo, as taxas migratórias caem e pela primeira vez Cuiabá é contemplada com investimentos estratégicos. Manso, o gasoduto e a termelétrica trazem segurança e abundância energética – que nunca teve – e a perspectiva da atração de grandes empreendimentos, inclusive, tendo o gás como matéria prima na indústria química. O Porto Seco viabiliza a ancoragem de investimentos diversos, por suas vantagens aduaneiras. A ferrovia se aproxima com a ponte rodoferroviária sobre o rio Paraná e avanço dos trilhos no estado. O aeroporto Marechal Rondon é internacionalizado e um novo plano diretor o projeta como um hub aeroviário, de posição central no continente.
     É neste contexto sinérgico que Cuiabá vira o século, e dá seu terceiro salto de desenvolvimento. Cuiabá deixa de ser o pólo solitário em um vazio regional, e passa a ser o centro de uma região rica e dinâmica, com um mercado cada vez mais diversificado, exigente e poderoso, que lhe cobra e fomenta um novo patamar de desenvolvimento. A histórica simbiose regional se renova buscando entre as cidades a divisão de trabalho que seja a mais útil e produtiva para todo o conjunto, assim como acontece na vanguarda do mundo globalizado. E grandes setores de Mato Grosso estão nessa vanguarda, inclusive em Cuiabá. Neste contexto, parafraseando Friedman, a ascensão das economias do interior empurram Cuiabá para cima e não para baixo, contrariando algumas análises apressadas.
     A perspectiva concreta é o salto da qualidade, um próximo ciclo de desenvolvimento, com menos imigração e, com fartos recursos à busca de seus serviços. Cuiabá deve preparar-se para continuar apoiando o interior que ajudou a construir e não competir com ele ou temê-lo. E vice e versa. E isso já está acontecendo, embora nem todos consigam enxergar. A competitividade contemporânea se dá na nova ordem mundial da colaboração e da parceria, e não da anacrônica competição autofágica. Quanto mais forte o interior, mais forte Cuiabá e o mesmo se dá ao contrário. Esta é a tendência e nunca a história nos foi tão generosa.
     Infelizmente tendência não é destino e condições favoráveis não viram realidade por si. Ajudar as forças ascendentes e extrair delas toda a qualidade de vida urbana que possibilitam, esta é a grande responsabilidade da nova geração de cuiabanos e de seus próximos governantes.
(Publicado pelos Diário de Cuiabá em 22/07/2008)

terça-feira, 1 de julho de 2008

MATO GROSSO, 260 ANOS

José Antonio Lemos dos Santos

     Instituído em 2003, o aniversário de Mato Grosso comemora a criação do estado em 9 de maio de 1748, por Carta Régia de Dom João V. Até então, não existia uma data em que Mato Grosso pudesse ser homenageado pelos seus cidadãos de forma conjunta, promovendo e fortificando os laços que os unem como conterrâneos, filhos de uma mesma terra, ainda que de regiões, atividades e origens culturais diversas.  Este ano não houve comemorações, justamente por ocasião do 260º aniversário do estado, passados apenas cinco anos da data comemorativa. Entretanto, se não houve festa, os dados da pujança do estado trataram de fazer a festa por si.
     Mato Grosso continua o maior produtor de soja, de algodão e de carne bovina do Brasil, e caminha para sê-lo na produção de milho, carne suína e de aves. Segundo maior produtor de açúcar e álcool, este ano passou a ser também o maior produtor nacional de biodiesel, aumentando em 230% - apenas no primeiro trimestre de 2008 – tudo o que produziu no ano passado. Já produz quase 20% da produção nacional do combustível que está revolucionando o mundo! Melhor de tudo, com uma redução de 14% no avanço do desmatamento - segundo o insuspeito instituto IMAZON – ainda que permaneçamos com a maior área desmatada.
     Nas exportações, este foi “o melhor abril de todos os tempos” segundo a FIEMT. Com um incremento de 57% em relação a abril de 2007, segue sendo o maior exportador do Centro Oeste, exportando mais que todos os outros estados da região juntos! Líder mundial na reciclagem das embalagens de defensivos agrícolas, Mato Grosso festeja o pioneirismo nacional com o projeto do zoneamento agroambiental para o seu território, após quase 20 anos de cuidadosa elaboração técnica.
     Motivo maior de comemoração é que esses números extraordinários foram conseguidos apesar de todos os entraves e agressões sofridas pelo estado e pelo povo mato-grossense nesse período. Nenhuma ajuda, nenhum gesto de simpatia pelo trabalho que engorda o superávit comercial do Brasil e abastece as mesas brasileiras e mundiais. Já pensaram se fossemos nós os produtores das motosserras? Ou de armas, bombas nucleares, ou das outras drogas que violentam e degradam a humanidade? Menos mal, produzimos alimentos.
     Mato Grosso paga, porém, o preço por introduzir a agropecuária brasileira na era da tecnologia e da ciência, alcançando níveis de qualidade e produtividade jamais vistos. E por fazê-lo em uma fronteira agrícola que envolve o cerrado, o pantanal e a Amazônia, para os quais não existe ainda uma forma de trabalho comprovadamente sustentável. O sucesso dos pioneiros sempre é acompanhado de problemas novos, muitos nunca enfrentados pela humanidade, e que, por isso, não podem ser confundidos com erros e muito menos com crimes. A questão ambiental não pode ser vista, de forma apressada e simplista, apenas como um caso de polícia, repetindo erro já cometido no século passado com a questão social.
     A cada ano os mato-grossenses renovam a esperança de um dia deixar de ser um dos únicos estados do país sem um centro de pesquisas da Embrapa, apesar de ser o maior produtor agropecuário do Brasil. De deixar de ser o único Estado do centro-oeste sem uma ferrovia adentrando seu território, reduzindo os custos econômicos, sociais e – principalmente - ambientais do atual e inadequado sistema de transportes de cargas. De voltar a ter gás para a sua termelétrica, assegurando energia limpa para o desenvolvimento. De ver a União – e não mais o estado - investindo nas suas rodovias federais. De ver concluído o Aeroporto Marechal Rondon.
     Mato Grosso comemorou de forma eloqüente seus 260 anos com suas estatísticas de sucesso. Vai continuar assim, pois sua vocação é alimentar o mundo. A cada ano, Mato Grosso prova que unido é muito maior que todas as crises e dificuldades que enfrenta. Sua força é o trabalho de sua gente e a grandeza e diversidade de oportunidades oferecidas por seu território.
     Mato Grosso é para ser imitado, ajudado em suas dificuldades e potencialidades, e não agredido a cada manchete dos jornais. Seu aniversário não pode ser esquecido, por mais atordoados que estejamos entre o trabalho que ajuda a alimentar o mundo e o “fogo amigo” do qual temos que nos defender. Daria uma grande festa anual na Praça das Bandeiras, sob o tremular das bandeiras do estado e de todos os municípios mato-grossenses, do norte, sul, leste e oeste do estado. Um aniversário a ser comemorado todo ano, cada vez com mais entusiasmo e orgulho.
(Publicado em 01/07/2008)

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

A VELHA "NOVA CUIABÁ"

José Antonio Lemos dos Santos


     Há cerca de 20 anos publiquei um artigo no qual saudava o lançamento do Pedra 90, com seus 8 mil lotes, como uma corajosa iniciativa do governo estadual para a solução dos problemas das ocupações irregulares urbanas, em especial as nas áreas de risco. Criticava, porém, a distância que ficava da cidade, fora da zona urbana de então, o que traria custos elevados para a administração pública e, principalmente, para sua futura população.
     Atualmente, o Pedra 90 está consolidado como um bairro próspero, mas ainda carente em infra-estrutura. Porém, até chegar neste ponto, a população sofreu muitas dificuldades – e ainda sofre – tais como a lenta instalação dos serviços públicos – graças ao sobrecusto devido à distância - e o desperdício diário de parte considerável de suas vidas nos deslocamentos ao trabalho ou à escola.
     Passados 20 anos, repete-se a situação, só que muito mais grave. O site oficial da prefeitura de Cuiabá informa que foi assinado junto ao governo federal e BID um termo de referência para "a criação de uma Zona Especial de Interesse Social (ZEIS) em Cuiabá para a construção de 20 mil moradias e a retirada de todas as famílias que vivem em áreas de risco em Cuiabá." Uma ótima notícia, não viesse ela acompanhada de outras sobre as definições do projeto, que colocam em risco a excelente iniciativa da prefeitura.
      Os problemas surgem quando a matéria diz que será necessária uma área de 300 hectares, ao norte da cidade, na estrada da Chapada, pois não existiria uma área nessas dimensões dentro do perímetro urbano, o que exigiria sua ampliação. É bom lembrar que, ainda não fez um ano que a Câmara – sabiamente – aprovou o congelamento do perímetro por 10 anos, por solicitação do prefeito, em compromisso público de que o perímetro não seria ampliado nesse período, sob o olhar descrente de muitos.
     Sendo assim, seria a repetição do Pedra 90, só que pior, pois se o Pedra 90 era distante, ao menos, ficava na região do Distrito Industrial. Já o novo projeto ficaria em localização completamente oposta deste, como também longe das outras áreas da cidade geradoras de oportunidades de trabalho e consumidoras de serviços. Com a agravante adicional de levar a impactância antrópica da cidade para os limites do Parque Nacional da Chapada.
     Porque a opção por um só conjunto? Para projetos desse tipo, a metodologia correta e adotada pelos órgãos financiadores tem como exigência o não deslocamento das populações para áreas muito distantes, visando, principalmente preservar as relações formais ou informais de trabalho já estabelecidas na região de origem. Ora, as áreas de risco disseminam-se por toda a cidade e, assim sendo, a opção deveria ser por diversos conjuntos menores, e não apenas um, tão grande a ponto de ser considerado uma nova cidade - já até "batizado provisoriamente de Nova Cuiabá", segundo o site oficial.
     Além de mais corretas, as áreas menores são mais disponíveis dentro da Macrozona Urbana, poupando a prefeitura de outra dificuldade que seria uma ampliação do perímetro urbano, que envolve discussões pelos conselhos municipais competentes e pela Câmara de Vereadores. Aliás, diferente do que diz a matéria, mesmo áreas com 300 hectares - ou mais - estão disponíveis dentro do atual perímetro urbano, sendo desnecessário a Câmara se sentir acuada diante de uma possível cobrança de aprovação prévia de uma ampliação do perímetro para que o projeto tenha andamento.
     A prefeitura acabou de construir uma grande e cara ETA no Tijucal; terá que construir outra para abastecer o novo conjunto, lá na estrada da Chapada? Os atuais usuários do transporte coletivo estariam dispostos a arcar em suas passagens com o ônus da extensão das linhas de ônibus para atender à "nova cidade"? Onde trabalhará sua população?
     Cuiabá já paga altos custos operacionais por sua zona urbana ser muitas vezes maior que a necessária para sua a população, e por isso sente no bolso que seu perímetro urbano não precisa e não pode ser ampliado. Por que não aproveitar a infra-estrutura existente, melhorando-a para receber os novos conjuntos habitacionais, mas beneficiando também as populações que já vivem na cidade e que carecem de tanta coisa? Aí sim a prefeitura estará construindo a verdadeira "nova Cuiabá", uma Cuiabá revitalizada nos seus córregos protegidos, com benefícios de fato para todos os seus habitantes.
(ublicado pelo Diário de Cuiabá em 28/02/2008)