José Antonio Lemos dos Santos
Houve um tempo em que os políticos não gostavam de concluir obras iniciadas por seus antecessores alegando que não colocariam “azeitona na empadinha de ninguém”. Hoje parece um comportamento em extinção, vide os casos dos hospitais Central e Universitário, por exemplos, obras paradas há décadas e agora prestes a serem inauguradas, moderníssimos.
A Barragem de Manso vem da grande cheia de 1974 na qual Cuiabá e Várzea Grande tiveram inundada grande parte de suas áreas urbanas, com imensas perdas para suas populações. Em função disso o governo federal mandou realizar estudos para evitar que aquele drama se repetisse, saindo então a proposta de uma barragem rio acima, um “açudão”, de proteção urbana contra futuras cheias. Manso já teria evitado algumas vezes que volumes de água maiores que os de 74 passassem por Cuiabá.
Mas, além do drama das inundações, Mato Grosso enfrentava um outro problema fundamental para seu desenvolvimento: a carência energética. Mato Grosso era suprido precariamente por duas linhas de transmissão vindas de Cachoeira Dourada a 700 km - e a terceira já estava a caminho. As tais linhas por serem longas não ofereciam segurança – “ventava em Jataí, apagava a luz aqui” diziam. Na época uma nova administração federal assumia e não se dispunha a bancar uma hidroelétrica para Mato Grosso. Sem verba, a Comissão Especial Divisão de Mato Grosso, da qual fiz parte, teve que buscar alternativas, vindo então a ideia de energizar a barragem de Manso cujas obras estavam prestes a iniciar, otimizando, assim, os investimentos no “açudão”.
Consultados os órgãos técnicos especializados no assunto, o “açudão” foi transformado na “APM” de Manso, isto é, numa barragem de aproveitamento múltiplo. Além de ser a barragem de proteção urbana inicial, Manso passou também a ter por objetivos regular a vazão do rio, gerar energia, possibilitar o desenvolvimento da psicultura e do turismo, bem como, o abastecimento de água e a irrigação de 40,0 mil hectares nos municípios da Baixada Cuiabana. Com novas funções, Manso teve que ser toda redimensionada, em especial o lago, e uma vez construída vem gerando energia, atendendo também os propósitos de regulação de vazão do rio e a proteção urbana, esta sua principal função.
Quanto aos demais objetivos, só tenho acompanhado pelo noticiário, pois, apesar de sua importância Manso não tem despertado tantas matérias jornalísticas, teses e outros tipos de discussões públicas, a não ser em termos de suas interferências no Pantanal. Assim, a meu ver, cabe destacar positivamente o aproveitamento turístico com grandes empreendimentos instalados e em instalação, gerando empregos e renda com a qualidade que o setor oferece.
Mas, o que salta aos olhos negativamente é a ausência de iniciativas públicas no sentido de ao menos avaliar tecnicamente as possibilidades do abastecimento de água e da irrigação por gravidade que Manso oportuniza e que podem ser uma solução duradoura para suprir a população da Baixada com água em abundância e qualidade, bem como o desenvolvimento de programas de irrigação nas áreas rurais, alavancando o desenvolvimento de suas potencialidades econômicas, como aconteceu no Nordeste brasileiro. Aos céticos, vide o exemplo da barragem da Pedra do Cavalo na Bahia, semelhante a Manso e que entre outros benefícios abastece 60% da população da Região Metropolitana de Salvador.
O ano de 2026 será de eleições gerais no Brasil, ocasião em que devem ser levantados e discutidos os problemas e soluções para um país com alto índice de urbanização, uma oportunidade ímpar para enfim se abordar a conclusão da APM de Manso em todas as suas funções, com todos os benefícios que seu projeto de Aproveitamento Múltiplo foi concebido.