"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



terça-feira, 26 de julho de 2011

RUA, SOLO URBANO E SANECAP

José Antonio Lemos dos Santos


     Na semana passada abri meu artigo dizendo que todas as coisas ruins que tinham acontecido na semana anterior não empanariam o brilho das boas notícias do mesmo período. Felizmente as coisas boas acontecem sempre, a gente é que está se acostumando a focar apenas as coisas ruins, em especial quando se trata de Cuiabá. Mas hoje não dá para deixar de comentar o último absurdo na tramitação da criação da agência municipal reguladora para serviços de saneamento. Ainda que feliz e com a alma lavada e enxaguada nas águas das goleadas do Cuiabá e do Luverdense em suas séries no campeonato brasileiro, o Cuiabá com 100% de aproveitamento, este último episódio e todo o caso da Sanecap fez lembrar as mais imaginativas criações de Dias Gomes e seu inesquecível Odorico Paraguaçu. Seria cômico se não fosse trágico. A comédia da ficção na vida real quase sempre é tragédia. Em especial quando envolve o destino de uma cidade.
     Pois não é que um dos vereadores confessou em entrevista coletiva não ter lido o projeto em que votara? Antes de tudo uma decepção, pois trata-se de um dos vereadores da nova safra, cidadão respeitado e jornalista tarimbado, que levou para a Câmara muitas das esperanças de renovação para melhor de nossa vida pública. Ainda bem que teve a coragem de vir a público confessar o acontecido, produzindo um testemunho objetivo que pode servir de subsídio para o Ministério Público, que certamente está apreciando mais este episódio das estranhas relações entre o Executivo e o Legislativo cuiabanos, que deveriam ter na autonomia e na independência as condições constitucionais básicas de suas existências.
     Aliás, é bom lembrar que no ano passado vivemos uma situação semelhante quando da autorização da venda da Travessa Tuffik Affi, posteriormente suspensa a pedido do Ministério Público como uma “aberração fática e jurídica”. Também naquela época, o mesmo vereador que hoje diz ter votado o que não lera antes, da mesma forma alegava não saber se tratar da venda de uma rua, chegando mesmo a dizer que “nunca iria votar um projeto desse para vender uma rua. Isso não existe. Se eu fizesse isso, teria que sair preso da Câmara. O projeto que aprovamos não dizia nada sobre venda de rua e, se isso aconteceu, fomos enganados". Então o caso da Sanecap é o segundo em que o ainda promissor – pela sua história pretérita - vereador vem a público confessar ter votado sem saber o que. Repito, ainda bem que ele veio a público confessar o ocorrido, pois assim, confirma-se aquilo que antes era apenas suposto, isto é, que vota-se a “toque de caixa”, apressadamente, algumas vezes até sem o conhecimento do parlamentar, matérias que são encaminhadas ao legislativo sob o regime de urgência, matérias que nada tem de urgente de fato. Assim aconteceu também este ano com a aprovação da nova Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano de Cuiabá, a lei que disciplina o que e o quanto pode ser construído em cada parte da cidade, logo uma lei extensa e de alta complexidade, a lei mais importante da cidade, mas que foi aprovada numa só sessão por unanimidade, sem as discussões que toda lei desse tipo envolve.
     Pelo menos desde a implosão do conjunto de Pruitt-Igoe, nos EUA, em 1972, o Urbanismo tem como uma de suas premissas maiores a participação da cidadania em todos os processos da gestão urbana. É uma das máximas do Urbanismo contemporâneo adotada no Brasil pela Constituição, com o devido desdobramento no Estatuto da Cidade, centralizado na gestão democrática da cidade. E nós, para onde vamos?
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 26/07/2011)

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