"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

A DECISÃO DA ESPERANÇA

José Antonio Lemos dos Santos

     Ia escrever sobre o décimo aniversário do Aquário Municipal de Cuiabá, a ser festejado no dia 5 de fevereiro próximo. Porém, esta singela mas justa homenagem, fica adiada devido a decisão do juiz Luis Aparecido Bertolucci Júnior concedendo liminar ao Ministério Público Estadual (MPE) e suspendendo a venda da rua Tuffik Affi. É ótimo quando escolhemos nosso tema semanal entre fatos auspiciosos, positivos. Nos meus artigos sobre a cidade e assuntos correlatos busco sempre manter uma postura positiva, otimista, usando as boas perspectivas, apresentando propostas, aplaudindo e elogiando as boas iniciativas e os bons exemplos presentes e passados de nossa terra. Infelizmente, trata-se de um exercício difícil, sendo bem vindas ocasiões como desta semana, onde aspectos positivos da realidade preponderam sobre os negativos, ao menos na cabeça deste articulista neófito.
     A importância da decisão da Vara Especial do Meio Ambiente envolve uma questão que se assemelha a um imenso iceberg, cuja ponta visível, mínima, é a rua Tuffik Affi e a liminar concedida. Logo ao vir à luz, a venda da rua já trouxe consigo – inclusive como uma de suas justificativas - a notícia da venda de uma área contígua, também pública e com dimensões muito maiores, em data e valor até hoje desconhecidos e utilizando os mesmos métodos questionados pelo MPE, ao menos quanto ao desconhecimento e falta de discussão pública. Só se sabe que o comprador foi o mesmo. Trata-se de uma área de quase 2 hectares, uma das últimas áreas públicas urbanas dessa magnitude disponíveis em pleno coração da Grande Cuiabá, na principal entrada da capital mato-grossense. Quero crer que o MPE tenha deixado para um segundo momento o questionamento da venda desta outra área, coroando então, no caso, sua exitosa vigilância com a aplicação das leis, e na recuperação daquele valioso patrimônio público para uso da cidade.
     Tão logo foi divulgada a notícia da venda da rua, a opinião pública manifestou sua indignação nos meios de comunicação através de artigos, cartas de leitores, reportagens e comentários diversos, como eu próprio tive oportunidade de fazê-lo. Na ocasião muitos leitores me escreveram compartilhando a indignação, mas convencidos de que a opinião da sociedade mais uma vez seria inócua e logo esquecida pelo próximo escândalo. Eu mesmo, cético, cheguei a dizer no meu artigo que só me manifestava para “desopilar o fígado”. Mas, ao contrário, a ação do MPE foi imediata, e a decisão do juiz já estimulou alguns e-mails de leitores, desta vez esperançosos com algo novo surgindo no trato da coisa pública. Qualquer que seja o resultado final do processo, a atual decisão concedendo a liminar reacendeu a esperança, ainda que tênue, em uma cidadania descrente.
     Trabalhando de um modo geral com cidades, e em especial Cuiabá e Várzea Grande, aprendi que o tão esperado e urgente salto qualitativo de nossas cidades – que matam e estão matando cada vez mais - só se dará quando a cidadania assumir que a cidade é sua e que a qualidade do desenvolvimento urbano depende diretamente de seu interesse e empenho. Que os prefeitos, governadores ou presidentes da república são gestores da res-publica, e não donos do bem comum. O destino das cidades no Brasil, que afinal é nosso próprio destino, não pode mais depender exclusivamente da ação ou omissão de seus administradores. É preciso a participação de cada um fazendo sua parte, mas também criticando e exigindo, pelos caminhos legais disponíveis, retidão e transparência nas coisas públicas. Como se deu com a Rua Tuffik Affi. Quem dera este caso fosse de fato um sinal das mudanças tão desejadas e necessárias na forma da nossa gestão urbana, ao menos em Cuiabá.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 02/02/2010)

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