"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



terça-feira, 6 de julho de 2010

PONTE DANTE DE OLIVEIRA

José Antonio Lemos dos Santos


     Pensava escrever sobre nosso desfecho na Copa. Contudo, não há como ficar insensível diante da agenda marcando para esta terça-feira o quarto aniversário de falecimento de Dante de Oliveira. Quanta falta faz, em especial para o Mato Grosso platino. Um vácuo. Muito mais que o político, vou lembrar o grande estadista cuiabano, mato-grossense e brasileiro, através de uma de suas obras mais importantes, a ponte estaiada no rio Cuiabá, denominada Sérgio Mota. Tive honra de ajudá-lo nessa grande realização quando, já governador do estado, solicitou ao IPDU as melhores alternativas para sua locação na cidade.
     Como superintendente do IPDU na época recordo seu entusiasmo pela obra e seu interesse pessoal na definição do local que mais benefícios trouxesse para Cuiabá e Várzea Grande, com o mínimo possível de impacto sobre o rio. Desta preocupação, aliás, vem a tecnologia inovadora adotada, em sua segunda aplicação no Brasil. Hoje as pontes estaiadas viraram uma coqueluche no país, a exemplo do que acontece em todo o mundo. No Brasil vem sendo usada principalmente nas cidades, em especial pelas belas soluções plásticas que seu partido estrutural permite, usadas mais como ornatos citadinos, espetaculares, algumas com uma estética maneirista questionável. Como engenheiro de formação, orgulhava-se em dizer que a solução estaiada foi adotada aqui como uma solução funcional, tecnicamente nova, ambientalmente correta, capaz de construir a ponte sem tocar no rio, uma de suas maiores preocupações.
     Lembro-me ainda de sua intervenção pessoal determinando alterações no projeto executivo de sua conexão com a Beira-Rio, assegurando a continuidade com o eixo da Avenida Tancredo Neves, como previsto no projeto original. Esta continuidade possibilita que a ponte interligue Várzea Grande e Cuiabá através de um complexo viário em forma de uma grande voluta. Do lado de Cuiabá, subindo a Tancredo Neves, ultrapassando a Fernando Correia em viadutos e dela seguindo até a Avenida do CPA, com a construção da Avenida do Barbado, que chegou a ser iniciada por Dante. Do lado de Várzea Grande segue pela Avenida Dom Orlando Chaves, ultrapassando a FEB em viaduto, chegando pela Ponte Nova novamente a Cuiabá pela Miguel Sutil. Um projeto viário cada vez mais atual e prioritário, principalmente como preparação da cidade para a Copa do Pantanal.
     Para mim, e para muitos, a magnífica ponte só tem um problema: sua denominação oficial. Com todo o respeito ao homenageado, o maior monumento urbano de Mato Grosso deveria ter o nome de uma figura ilustre mato-grossense. Até sobre isto cheguei a conversar com o então governador, sugerindo-lhe o nome do Presidente Dutra. Aí ele nem esticou a conversa e disse que já tinha uma idéia sobre o assunto. Até hoje o nome atual não me convenceu, nem as explicações presumidas sobre o porquê da tamanha homenagem. Ainda mais considerando que o nome do ministro Sérgio Mota já denomina o complexo cultural do Museu do Rio, viabilizado financeiramente pelo homenageado através dos Correios, uma justa homenagem dada pelo então prefeito Roberto França.
     Para mim e para muita gente, seguidores e adversários, amigos ou não, essa ponte é e sempre será a “ponte do Dante”. Oficializá-la como “Ponte Dante de Oliveira” seria fazer justiça aquele que a idealizou e construiu, dando a Cuiabá e Várzea Grande um novo perfil urbano, com um novo canal de fluidez viária e um novo cartão postal, consolidando a grande metrópole do oeste brasileiro. Rebatizar a ponte iria muito além da maturidade político-administrativa de Mato Grosso? Não acho. Muitas vezes os anos eleitorais estimulam gestos públicos de grandeza.

Publicado pelo Diário de Cuiabá em 06072010.

terça-feira, 29 de junho de 2010

O PREÇO DO VERDÃO

José Antonio Lemos dos Santos


     O impacto da visão do antigo Verdão demolido e triturado traz à baila a aposta feita na validade de sua demolição. Lembro que em artigos diversos aplaudi a localização e o primeiro projeto, que fazia um up-grade do estádio aproveitando o velho gramado, aquele que por muitos anos foi considerado o melhor do Brasil. Depois, já que havia sido deslocado de “cima” do antigo estádio, critiquei o atual projeto por não ter aproveitado ainda que parcialmente a antiga estrutura para utilização multi-esportiva, em especial suas instalações olímpicas - sua pista de corridas e demais áreas destinadas ao atletismo - criando uma magnífica praça desportiva com três arenas. Mesmo crítico, mantive a aposta na demolição considerando o imenso potencial de benefícios que a Copa do Pantanal poderá trazer para Mato Grosso e Cuiabá, que prepara também seu tricentenário. Uma aposta arriscadíssima uma vez que sabemos das nossas enormes dificuldades locais e nacionais na administração dos interesses públicos – para dizer o mínimo.
     Porém, mais que arriscada, dolorosa. Sou um apaixonado pelo antigo Verdão, como cidadão, torcedor do futebol local e arquiteto. Como cidadão, acompanhei a luta e o entusiasmo do cuiabano por sua construção e emocionado, como todos de então, assisti ao seu primeiro jogo. Como torcedor era um daqueles mínimos duzentos pagantes quase que permanentes em suas arquibancadas e, também emocionado, assisti ao seu último jogo, passado despercebido, sem foguetes, mas cujo ingresso tenho carinhosamente guardado. Como arquiteto, por tratar-se de um dos mais geniais partidos arquitetônicos esportivos, considerando o clima, a topografia e até a tão falada multi-funcionalidade, muito melhor resolvida do que na atual “arena multiuso”. Neste caso não critico os autores do projeto mas as alegadas rígidas condições da FIFA impeditivas por exemplo dos belíssimos novos estádios terem também instalações olímpicas, exigência absurda a meu ver, principalmente para países pobres. Enquanto for professor de arquitetura, o antigo Verdão continuará sendo matéria de estudo, como um teatro grego.
     Vale uma aposta tão arriscada e dolorosa? Para qualquer cidade brasileira a oportunidade de sediar uma Copa do Mundo seria uma chance extraordinária em um mundo midiático e globalizado. Vai desde o poderoso marketing urbano e regional em nível mundial, até a responsabilização nacional na preparação das cidades palco do mega-evento, passando pela atração de investimentos privados, e pela elevação da auto-estima cidadã, tão necessária ao cuiabano. Em suma, embora arriscada a aposta, o prêmio em jogo é excepcional. Há que se reconhecer que seria bem mais fácil apostar na corrupção, na incompetência e falta de ética públicas que assolam o país, já que as chances desta são muito maiores. Lavar as mãos, deixando a grande chance para outras cidades com estes mesmos problemas, seria negar às futuras gerações cuiabanas as possibilidades de uma cidade melhor.
     Trata-se da troca de um bem valioso por uma oportunidade mais valiosa ainda. Mas, os prazos e as exigências impuseram uma situação de pagar ou largar, envolvendo um preço muito alto. O sacrifício do Verdão terá valido a pena se acontecerem os prometidos investimentos estruturantes na cidade, que não aconteceriam sem o evento da Copa, tais como o novo sistema de transporte coletivo, novas avenidas, novos parques públicos e uma nova forma de gerir a conurbação cuiabana em todos os seus setores. O preço alto e doído já foi pago e agora é hora de cobrar a entrega da mercadoria na quantidade e na qualidade prometidas. Ainda há tempo, mas é curto. Tem que deslanchar e correr.
(Publicado em 29/06/2010)

terça-feira, 22 de junho de 2010

DIVISÃO PARA QUEM?

José Antonio Lemos dos Santos


     Houve um tempo em que eu era contrário às propostas de divisão do estado apenas por patriotismo, amor à terra natal e essas coisas que a gente aprendia nos colégios e que parecem tão antigas e distantes nestes tempos globalizados. Agora não. Embora estes motivos persistam, continuo contrário às propostas divisionistas só que por motivos bem concretos e pragmáticos. Entre outros, por exemplo, acho que um país que paga de impostos quase 40% do que produz só para sustentar suas ineficientes e perdulárias máquinas político-administrativas nos diversos poderes, não pode querer a criação de mais governos. Antes estivéssemos falando em redução deles.
     Ainda mais se tratando de Mato Grosso, um estado campeão em produção e em desenvolvimento. Aplicando a fórmula do IPEA para cálculo do custo mínimo de um estado, Mato Grosso se destaca com uma das melhores relações entre arrecadação e custos, ao lado de Minas Gerais, em sexto lugar com 2,2 de índice. Mato Grosso, após séculos amargando dificuldades, hoje além de ter condições de bancar sua subsistência ainda lhe sobrariam recursos da ordem de 120% desse valor, para investir no desenvolvimento da qualidade de vida de sua gente. Este suado e valioso superávit, fruto do trabalho duro do mato-grossense de todos os seus rincões, não pode ser desperdiçado em novas pirâmides faraônicas de cargos públicos. E é isso que interessa à classe política de um modo geral com suas propostas divisionistas.
     Para embelezar o discurso usam três falácias. Primeiro, vendem à população da região que querem dividir a falsa idéia de que só eles têm problemas, quando problemas existem em todas as regiões de Mato Grosso e do Brasil. Passam a idéia da marginalização. Segundo, apregoam que em outros casos de divisão as regiões divididas só se desenvolveram após divididas, quando na verdade o desenvolvimento já havia se instalado antes. Por último, lembram o tamanho menor dos estados nos EUA, sem dizer que a divisão territorial americana é do tempo das diligências e da comunicação por tambores ou fumaça.
     Aqueles que por boa fé apóiam essas propostas divisionistas na esperança de ter mais escolas, hospitais, estradas, segurança, vão receber para sustentar mais 3 senadores, 8 deputados federais e 24 estaduais, 20 desembargadores, 7 conselheiros do TCE e mais 8 do TRE, mais secretários, diretores, etc. com os séqüitos e sinecuras correspondentes. E, pior, a nova proposta não é de criação de um, mas de dois novos estados! E feita por um deputado estadual que a meu ver teria por obrigação defender a integridade do estado e não sua amputação. Uma festa para os políticos que não cresceram politicamente com o estado, com cargos em profusão para acomodação de seus correligionários e maiores chances nas eleições futuras. Para o povo, uma despesa anual de cerca de R$ 300,0 milhões só para bancar a nova bancada federal, com mais 6 senadores e 16 deputados. Recurso precioso que poderia construir, por exemplo, 300 Km de novas rodovias asfaltadas por ano! Ou escolas, hospitais, equipamentos de saúde, etc.
     Em pleno século XXI, na era do avião a jato, asfalto, comunicações via satélite, internet, Mato Grosso prova ter a dimensão territorial exata para o êxito. Com títulos nacionais de maior produtor de grãos, de algodão, de biodiesel, de maior rebanho bovino, de estar entre os maiores em outras culturas e entre os maiores exportadores do país, Mato Grosso mostra que o Brasil não precisa de redivisões, de mais governos ou de mais políticos. Mato Grosso é para ser imitado, e não dividido. O fabuloso esforço produtivo do mato-grossense deve ser aplicado de fato em favor de sua qualidade de vida.
(Publicado pelo Diáio de Cuiabá em 22/06/2010)

terça-feira, 15 de junho de 2010

E A BASE AÉREA DE CÁCERES?

José Antonio Lemos dos Santos


     A realização do 2° Encontro de Fronteira em Cáceres na semana passada trouxe dados estarrecedores sobre a importância da fronteira mato-grossense para o tráfico de drogas. O principal e mais preocupante diz que 80% da droga que entra no Brasil passa por Cáceres, muito superior à proporção suposta pelos artigos que escrevo sobre o assunto há quase uma década. Neles insisto que a fronteira em Mato Grosso seria o segmento mais vulnerável das fronteiras brasileiras pela sua extensão e pelo fato do estado não possuir uma Base Aérea, nela se concentrando crescentemente as ações do tráfico.
     Saliente-se que jamais será suficientemente enaltecido o trabalho realizado com todas as dificuldades e riscos pelas polícias militar e civil do estado, Polícia Federal, polícias rodoviárias federal e estadual, e pelo Exército, bem como o contínuo apoio dos governos a essas ações terrestres e a encontros como o da semana passada. Mas, na questão da fronteira é indispensável lembrar a importância do espaço aéreo mato-grossense na prática dos diversos tipos de tráfico e, assim, para o equacionamento dos problemas de segurança pública, não só de Mato Grosso – em especial de Cáceres ou de Cuiabá, mas de todo o Brasil. Na ocasião do Encontro o prefeito cacerense, Túlio Fontes, disse que o arremesso aéreo em propriedades rurais é o principal meio de entrada de entorpecentes no Brasil e reclama a falta de uma Base Aérea utilizando a pista de pouso de 1870 metros, hoje ociosa.
     Há exatos 13 meses foi noticiado que o Ministério da Defesa e a FAB haviam decidido instalar em Cáceres uma Base Aérea do CIOPAER (Centro Integrado de Operações Aéreas) a ser implantada pelo Governo do Estado – via Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública – prevendo um investimento de 3,5 milhões de dólares em equipamentos aeronáuticos, a serem aplicados no patrulhamento e no apoio das execuções de operações policiais na região de fronteira entre Brasil e Bolívia. Depois disso, silêncio total, silêncio tão eloqüente que me suscitou um outro artigo em outubro indagando a quantas andava o tão importante projeto. Só neste 2° Encontro de Fronteira aparece uma primeira cobrança oficial sobre o assunto, através do prefeito de Cáceres, ainda que sem a ênfase de quem cobra uma ação já decidida pelo governo federal em favor de seu município.
     Incompreensível o tamanho descaso local para com o Ministério da Defesa em sua decisão de instalar a Base Aérea em Cáceres. Principalmente sendo o governo do estado um aliado político de primeira hora do governo federal e a região de Cáceres ter um deputado federal considerado um dos mais influentes e articulados na esfera federal. Até os candidatos ao governo não tocam no assunto. Já me disseram que antes a Base Aérea teria sido prometida por um político estadual para uma outra cidade do estado. Será? Mas teria tanta força mesmo contra uma decisão do Ministério da Defesa do país? Cáceres tem uma posição estratégica à montante do Pantanal, próxima às maiores cidades do Estado, centralizada em termos da fronteira a ser vigiada, com uma pista asfaltada capaz de receber Boeings, pronta e abandonada, podendo servir imediatamente ao urgente esforço nacional pela segurança pública e pelas futuras gerações de brasileiros. A escolha de Cáceres é uma mostra de que o governo federal priorizou este combate, importante para Mato Grosso e para todo o Brasil, até como preparativo de segurança para a Copa do Mundo e as Olimpíadas que o Brasil se desafiou a sediar. Falta as autoridades daqui darem uma forcinha. Ou pelo menos explicar o que está acontecendo.
(Publicado em 15/06/10)

terça-feira, 8 de junho de 2010

13 DE JUNHO, A COPA E A PAZ

José Antonio Lemos dos Santos


     A cada ano insisto em relembrar o que significa a data de 13 de junho ao mato-grossense. Não para celebrar a guerra, mocinhos ou bandidos, vencedores ou perdedores, e sim reverenciar vítimas, heróis ou não, todos mártires, principais frutos de qualquer guerra. 13 de Junho lembra o maior dos sacrifícios vividos pelos cuiabanos. Já foi matéria escolar obrigatória, mas hoje, quase ninguém sabe que o maior conflito das Américas ocorreu aqui, e que Cuiabá pagou caríssimo por ele. A Guerra do Paraguai reuniu Brasil, Argentina, Uruguai e interesses ingleses contra o Paraguai, na época o país mais poderoso na América Latina. E Mato Grosso foi o principal palco dessa tragédia.
     Na Guerra do Paraguai, um dos momentos épicos protagonizado pelos cuiabanos foi o da Retomada de Corumbá, a 13 de Junho de 1867, cidade então mato-grossense e que havia sido apoderada pelos paraguaios. Organizados pelo presidente do estado Couto Magalhães e comandados pelo então capitão Antônio Maria Coelho os cuiabanos foram lá, desafiaram o maior poder bélico do continente e retomaram para o Brasil a importante cidade, num “fato heróico exclusivamente cuiabano”, conforme nos ensina Pedro Rocha Jucá. Sem reforços externos, só forças militares locais, acrescidas de voluntários.
     Infelizmente a história não ficou por aí. As tropas retornaram à Cuiabá contaminadas com varíola, pois havia um surto da doença em Corumbá quando da Retomada. A epidemia tomou conta de Cuiabá, matando mais da metade de sua população. Segundo Francisco Ferreira Mendes, em cada casa havia ao menos um doente, e “a cidade ficou juncada de corpos insepultos, atirados às ruas, cuja putrefação impestava mais a cidade com a exalação produzida pela decomposição. Determinou o governo a abertura de valas e a cremação de cadáveres no campo do Cae-Cae, medida que se tornou ineficaz. Não raro eram vistos cães famintos arrastando membros e vísceras humanas pelas ruas.”.
     13 de Junho deve lembrar para sempre a epopéia de bravura e dor de um povo humilde, mas determinado. A história de gente de carne e osso, cujos descendentes circulam pela cidade em suas fainas diárias, sem se lembrar que nas veias levam o valoroso sangue de seus bisavós, o mesmo que vem bravamente construindo e defendendo Mato Grosso e o país por quase três séculos. Hoje, na pracinha do Cae-Cae, nenhuma homenagem. A própria cidade cresceu abraçando o campo santo, outrora afastado. Resta ainda uma cruz, solitária, com uma igrejinha ao lado onde as missas dominicais são “pela intenção dos bexiguentos”, embora a maioria dos fiéis nem saiba mais do que se trata.
     Como sede da Copa do Pantanal em 2014, Cuiabá e Mato Grosso mais uma vez serão palco de um mega-evento internacional, agora em favor da paz entre os povos através do esporte. A Avenida 8 de Abril, uma das principais vias de acesso ao novo Verdão, tem em sua interseção com a Ramiro de Noronha e Thogo Pereira um sério ponto crítico a ser solucionado, até como alternativa de tráfego direto entre a Av. Miguel Sutil e a XV de Novembro. Esse projeto urbanístico poderia abranger a contígua Praça do Cae-Cae, compondo uma nova capela em uma nova praça, e nesta um monumento à paz - à paz platina e à paz mundial - homenageando os heróis e mártires de todas as guerras, de todos os lados, em nome de nossos irmãos e hermanos, da polca e do rasqueado, do guaraná e do tereré, vítimas de uma mesma tragédia que precisa ser lembrada para jamais ser repetida. Uma atração turística no coração sul-americano para a realização de uma cerimônia solene de caráter internacional pela paz no mundo, em plena Copa do Pantanal, no dia 13 de junho de 2014, dia de Santo Antonio – a ser anualmente repetida.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 08/06/2010)

terça-feira, 1 de junho de 2010

MATO GROSSO, A ESCOLHA DO FUTURO

José Antonio Lemos dos Santos

     Se a ferrovia é tão importante para Mato Grosso, se ela está na lei do Plano Nacional de Viação e existe até uma concessão federal para sua execução, se já tem um traçado até Cuiabá aprovado em 1977 pelo Ministério dos Transportes e se esse traçado quando da discussão pública de seu EIA/RIMA no ano 2000 era considerado viável pela Ferronorte bastando uma pequena correção em atendimento a um parecer da FUNAI – também aceita pela Ferronorte - por que então essa ferrovia não foi construída até hoje?
     Na verdade, por trás dessa questão da ferrovia estão em jogo dois projetos de futuro para Mato Grosso. Por um a ferrovia passa por Cuiabá, e pelo outro, a ferrovia não passa por Cuiabá, ou melhor, a ferrovia não pode passar por Cuiabá. Como Cuiabá é o maior reduto eleitoral do estado, esse jogo não pode ser aberto por seus defensores, tendo sido habilmente dissimulado até agora.
     O primeiro projeto tem quase 5 décadas e a cada ano se revela mais atual, mostrando a extraordinária visão de seus idealizadores, os saudosos senador Vicente Vuolo e o professor Domingos Iglesias. Seu traçado segue a espinha dorsal do estado - a BR-163 - até Santarém, com uma variante para Porto Velho passando por Tangará. Comporta ainda extensões como uma para Cáceres, e até mesmo a recém criada Leste-Oeste. Uma ferrovia para todo o estado, mantendo a integridade geopolítica que faz de Mato Grosso um estado otimizado, e o de maior sucesso no país hoje. Uma ferrovia para levar e também trazer o desenvolvimento, não apenas uma esteira exportadora de soja.
     O outro projeto surge com o avanço do agronegócio no estado e a afirmação política de lideranças de alguns de seus segmentos. Por ele a Ferronorte segue de Rondonópolis direto para Lucas do Rio Verde e de lá para Santarém e Porto Velho. Esse projeto é complementado com a nova ferrovia Leste-Oeste e com a pavimentação da MT-130, ligando direto Rondonópolis a Lucas por rodovia, sem passar por Cuiabá. É fácil entender a intenção de deslocar artificialmente o centro geopolítico do estado para dois pólos, um no médio-norte e outro no sudeste, em Lucas e Rondonópolis, e a ameaça que isso representa à atual e exitosa unidade estadual. Quase todo o Mato Grosso platino fica excluído e Cuiabá vira a Ouro Preto do agronegócio, com no máximo um ramal ferroviário a ser construído pela VALEC, como consolação.
     O problema deste projeto é a Grande Cuiabá, o maior centro de carga de ida e volta do estado e seu maior reduto eleitoral. Um terminal ferroviário em Cuiabá, ligado a Santarém e Porto Velho impedirá Rondonópolis de ter o maior terminal ferroviário do estado, indispensável ao pretendido deslocamento geopolítico ao sul. Já o problema do projeto original da Ferronorte é que ficou órfão politicamente, com as ausências do senador Vuolo e de Dante de Oliveira. Os herdeiros políticos de Dante ficaram com seus votos mas não se movem pela continuidade de sua obra. Outras importantes lideranças cuiabanas foram neutralizadas eleitoralmente na Agecopa.
     As eleições deste ano decidirão este grande jogo. Até agora os candidatos evitam o assunto, os de um lado temendo o poder do agronegócio, os de outro a força eleitoral da Grande Cuiabá. Enquanto isso o projeto excludente avança. É hora dos candidatos com origem em Cuiabá dizerem abertamente de que lado estão. Só assim o mato-grossense poderá escolher conscientemente se apóia o atual Mato Grosso campeão, unido e enxuto, ou se prefere reparti-lo em dois ou três, de volta ao fim da fila dos estados brasileiros, sem vez e sem voz.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 01/06/2010)

terça-feira, 25 de maio de 2010

RONDON, DUTRA E O TOCO

José Antonio Lemos dos Santos


     Tirando as últimas operações da Polícia Federal e o golpe “gramatical” no projeto de lei da ficha limpa, a semana que passou foi de ótimas notícias. A primeira ouvi no rádio e dizia que o governador Silval Barbosa acatou proposta da Agecopa, levada pelo seu diretor Carlos Brito, de incluir o Memorial Rondon em Mimoso no programa de obras da Copa do Pantanal 2014. Nada mais acertado. Rondon merece a homenagem e o projeto do arquiteto José Afonso Portocarrero – um apaixonado pela cultura indígena e por Rondon – está arquitetonicamente à altura do homenageado. Contemporâneo em sua pós-modernidade regionalista, instigante em sua utilização de elementos da linguagem indígena e em sua solução de composição ambiental, o edifício proposto é capaz de por si só ser um elemento de atração turística, não bastassem a beleza natural em que está inserido e a obra do nosso Marechal da Paz, cuja memória abrigará.
     A outra boa notícia foi a leitura no Plenário da Assembléia Legislativa do artigo da semana passada intitulado “O presidente esquecido”, minha homenagem ao presidente Dutra no dia em que deveríamos comemorar seu aniversário. O deputado João Malheiros fez a leitura, solicitou sua inclusão nos Anais da Casa e ainda apresentou Indicação ao executivo pedindo a construção de um memorial ao ex-presidente na praça do novo Verdão. Seria não só uma homenagem local ao ex-presidente nascido em Cuiabá, mas também a aquele que trouxe para o Brasil a primeira Copa do Mundo, a de 1950. O local favorece ao turista o conhecimento de uma passagem da história do futebol brasileiro, bem como permite a Cuiabá e Mato Grosso mostrarem ao mundo a importância de um de seus mais ilustres filhos.
     Por última lembro a obra de pavimentação do local onde foi retirado o toco de arueira que por quase duas décadas desafiava a civilidade cuiabana e a governabilidade municipal, passando por vários prefeitos. Tratei dele em alguns artigos e ficava ali na curva que faz a conexão entre a Travessa Tuffik Affi e a Avenida Tenente Coronel Duarte, no coração metropolitano, principal entrada de Cuiabá. Apesar de aparentemente simples, esta retirada tornou-se de uma complexidade inimaginável, envolta nos meandros do barroquismo jurídico-administrativo tupiniquim, a ponto de tê-la saudado em artigo como o principal presente para Cuiabá em seu último aniversário. O mourão de arueira era a ponta de um problema que envolvia também algumas edificações precaríssimas no local. A retirada e a pavimentação realizadas pela Prefeitura concluem um projeto de 1996 do IPDU. Viva! Mesmo que muito possivelmente desatualizado em seu dimensionamento e geometria, já permitiu de imediato uma melhor fluidez no local. Por outro lado, a desocupação da área melhorou significativamente a qualidade daquele espaço urbano, ainda que sem nenhuma espécie de tratamento urbanístico. Pena que a área tenha sido vendida.
     Uma cidade que precisa se preparar para a festa de seus 300 anos, e que no meio do caminho tem a responsabilidade de representar bem o Brasil como uma das sedes da Copa do Mundo de 2014, não pode mais conviver com situações como esta. Cuiabá é o centro de uma das regiões mais dinâmicas do planeta, reflete e impulsiona esse dinamismo, transformando-se com muita rapidez. Não pode mais depender de soluções tão demoradas. Ao menos desde a Roma dos Papas no Renascimento, o mundo firmou o conceito da desapropriação pública, sacramentando o princípio de que os assuntos de interesse da cidade são privilegiados e devem ser exercidos por suas autoridades em favor bem comum.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 25/05/2010)

terça-feira, 18 de maio de 2010

O PRESIDENTE ESQUECIDO

José Antonio Lemos dos Santos

     O dia 18 de maio e o impacto das primeiras imagens da demolição do Verdão e do belo ônibus do novo sistema de transporte coletivo da Grande Cuiabá para a Copa do Pantanal, trazem à memória o presidente Dutra, o presidente cuiabano. A lembrança não veio só pela data, mas por ter sido o presidente Dutra quem trouxe para o Brasil a Copa do Mundo de 1950. Ele viu na Copa a vitrine adequada para mostrar ao mundo que o Brasil não era mais o país rural de antes do Estado Novo e de seu governo, empenhando-se em sua realização, inclusive construindo o maior estádio de futebol do mundo, o Maracanã. Assim, fez-se também justiça histórica na escolha da terra natal de Dutra como uma das sedes da segunda Copa do Mundo no Brasil. Católico fervoroso, nisso certamente ganhou uma mãozinha poderosa do Senhor Bom Jesus de Cuiabá.
     A grandeza de Dutra começa em sua origem humilde. Menino, vendia nas ruas da cidade os bolinhos feitos por sua mãe, viúva de militar combatente da guerra do Paraguai. Ao passar para a Escola Militar, teve que ir como lavador de pratos na lancha e depois no trem que o levou ao seu destino. Orgulhava-se, com uma leve mágoa, de não ter recebido ajuda de nenhuma autoridade local, apesar dos pedidos de sua mãe, mas de, mesmo assim, ter chegado a tempo de ocupar sua vaga na escola. E de ocupar seu lugar na História. Eurico Gaspar Dutra, apesar das dificuldades foi à luta e chegou à Presidência da República, mantendo-se até o fim da vida como uma das pessoas mais influentes na política nacional.
       Injustiçado, foi ele quem convenceu Getúlio Vargas a convocar eleições democráticas e uma nova Constituinte, rompendo com o velho chefe. Tinha por trás a FEB, criada por ele, que voltava vitoriosa da Europa. A ditadura não poderia sobreviver em um país que acabara de derrubar as ditaduras nazi-facistas da Europa. Convocadas as eleições, foi eleito presidente para um mandato de seis anos, e, mesmo sendo o militar mais poderoso do país, Dutra curvou-se à nova Constituição que estabelecia cinco anos de mandato. Aqueles que temiam a volta de Getúlio e lhe propunham ficar mais um ano respondeu: “nem um minuto a mais, nem um minuto a menos”. Virou “o homem do livrinho” pois sempre portava um exemplar da Constituição Federal, assinada por ele.
     O Governo Dutra deu importantes passos para o desenvolvimento do país. Introduziu o planejamento no Brasil, com o Plano SALTE (Saúde, Alimentação, Transporte e Energia), que já trazia o germe do Fome Zero, e criou o CNPq, cuja Lei de criação é tida com a Lei Áurea da tecnologia brasileira. Implantou o hoje tão usado conceito de Produto Interno Bruto, pavimentou a primeira grande estrada no Brasil, a atual Via Dutra. Criador do Instituto Rio Branco, base do alto conceito de nossa diplomacia, e da CHESF, é dele também a criação do Estado Maior das Forças Armadas e da Escola Superior de Guerra, o mais importante instrumento de formação da inteligência estratégica nacional. É também de Dutra a criação do SESI e do SENAI, de onde saiu o Presidente Lula.
     Injustamente ficou com a culpa do fechamento do Partido Comunista, uma decisão do STJ cumprindo o que determinava a nova Constituição, considerada a mais democrática de todas. Com isso, e por ter fechado os cassinos, foi jogado ao ostracismo. Que seja lembrado ao menos em seu aniversário. Do muito que fez, contudo, o maior feito de Dutra foi mostrar até onde pode ir um menino humilde de uma terra distante, um pequeno vendedor de rua, estudante de uma escola pública. Devemos-lhe um memorial como inspiração ao jovem mato-grossense de hoje em seus sonhos de cidadania, e como homenagem ao conterrâneo que ocupou democraticamente a posição mais elevada na direção do país.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 18/05/10)

terça-feira, 11 de maio de 2010

MATO GROSSO, 262 ANOS

José Antonio Lemos dos Santos


     Em 9 de maio de 1748, Dom João V, Rei de Portugal, através de Carta Régia determina a criação de duas Capitanias, "uma nas Minas de Goiás e outra nas de Cuiabá". A Capitania que seria nas Minas de Cuiabá virou a Capitania de Mato Grosso e para governá-la foi designado Dom Antonio Rolim de Moura, que tomou posse e ficou em Cuiabá cerca de um ano, até que Vila Bela fosse construída. Morou em Cuiabá na praça que tem o seu nome, mas que popularmente é conhecida como Largo da Mandioca, primeiro centro político-administrativo do estado. Mais tarde foi Vice-Rei do Brasil.
     Desde então Mato Grosso faz história. Indo de Mato Grosso do Sul até ao Acre, Mato Grosso foi a vanguarda na superação dos limites de Tordesilhas. Expandiu e depois conseguiu a proeza de defender e consolidar todo este imenso território como terras brasileiras, a peso de muita bravura e sacrifícios de seus filhos. A partir do ouro que lhe dá origem, Mato Grosso produziu diamantes, borracha, ipecacuanha, carne. Hoje é o maior produtor agropecuário do Brasil, líder em soja, álcool, algodão, biodiesel e gado, um dos maiores exportadores do país ao menos desde 1998 e responsável nos últimos anos pela maior parte dos superávits comerciais brasileiros. O valor de sua exportação é superior aos dos outros estados centro-oestinos somados! Nos últimos anos é o estado de maior sucesso no Brasil e uma das regiões mais dinâmicas do planeta – produzindo alimentos e uma gente muito boa, como sempre produziu, não armas, para o país e o mundo.
     No ano passado tive a paciência de aplicar os dados de 2005 de Mato Grosso numa importante fórmula criada pelo IPEA para calcular o custo mínimo de uma unidade federativa. Mato Grosso superava em mais do dobro o seu custo mínimo (2,2 vezes), colocando-se entre os 6 primeiros estados mais viáveis do país. A maioria malemá cobre seus custos. Já os números de 2009 deveriam ser massificados para que os mato-grossenses tenham a exata noção da grandeza de seu trabalho para o Brasil e possam exigir dos governos o tratamento que têm direito. Com US$ 7,7 bilhões de saldo, Mato Grosso produziu 30% do superávit do saldo comercial brasileiro em 2009. Isto é, Mato Grosso trouxe 1 de cada 3 dólares que o Brasil ganhou no ano passado em suas relações comerciais. Um número imenso, equivalente, por exemplo, ao custo de quase quatro ferrovias ligando Alto Araguaia à Sinop, passando por Rondonópolis, Cuiabá e Lucas, ou duplicar 13 vezes a rodovia no mesmo trajeto, sem excluir ninguém. Por ano! E em 2010 segue na mesma toada, com seu saldo comercial em dobro ao do país no primeiro trimestre.
     Isso é Mato Grosso aos 262 anos, a sétima renda per capita do Brasil mesmo sem ter uma ferrovia e com suas rodovias federais abandonadas. Mesmo com o gás de seu gasoduto cortado e paralisada sua termelétrica que lhe dava confiabilidade energética; mesmo paralisadas as obras de seu principal aeroporto e esquecido o aproveitamento múltiplo de Manso. O maior produtor agropecuário do país só agora terá uma unidade de pesquisa da Embrapa. E sem uma Base Aérea, apesar de ter 1.100 Km de fronteira. Em 2010 há que se festejar com orgulho os 262 anos de Mato Grosso, fazendo das próximas eleições uma grande festa de cobrança cívica. E, especialmente, em homenagem ao cidadão mato-grossense de todos os tempos e recantos do estado – autônomo, patrão ou empregado – aquele que de fato faz o sucesso de Mato Grosso apesar das dificuldades, do desamparo dos governos e do descaso dos políticos, mostrando a força de um estado unido e trabalhador.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 11/05/2010)

terça-feira, 4 de maio de 2010

SERRA E MATO GROSSO

José Antonio Lemos dos Santos


     Em seu primeiro discurso como candidato à Presidência da República, José Serra abordou o colapso da logística dos transportes em Mato Grosso destacando ser hoje “mais caro transportar uma tonelada de soja de Mato Grosso ao porto de Paranaguá do que levar a mesma soja do porto brasileiro até a China. Um absurdo.” Ótimo para quem acompanha técnica e apaixonadamente há muito tempo a história de Mato Grosso e de seu acesso ferroviário, projeto central para essa redução de custos financeiros, ambientais e de vidas humanas. Não deveria surpreender o discurso do candidato pois foi visando esse problema que o governo FHC, do qual Serra fez parte, trouxe a ferrovia a Mato Grosso, desenvolvendo o visionário projeto do senador Vuolo. Mas foi extremamente alentador ouvir do próprio candidato líder nas pesquisas - em um discurso marcado pelo simbolismo de ser o primeiro - que Mato Grosso e sua logística de transportes é assunto prioritário em sua plataforma. Em especial diante do cruel, injusto e incompreensível tratamento recebido por Mato Grosso nos dois governos de Lula.
     Um dos estados de maior sucesso no país, Mato Grosso é líder nacional em rebanho bovino, soja, algodão, milho, biodiesel, o segundo em álcool, destacando-se em todos os outros segmentos do agronegócio. Nos últimos anos Mato Grosso é o maior responsável pelos superavits da balança comercial brasileira. Em troca sua ferrovia parou, as rodovias federais foram abandonadas, o aproveitamento múltiplo de Manso esquecido e as obras do aeroporto Marechal Rondon paralisadas. A super-safra de milho mais uma vez não tem armazéns. O gasoduto de US$ 250,0 milhões teve seu suprimento cortado pela Bolívia, onde nosso presidente tem enorme prestígio, interrompendo as enormes perspectivas abertas pelo gás, inclusive paralisando a termelétrica de US$ 750,0 milhões, que era a segurança energética de Mato Grosso. O maior investimento privado no estado parado há quase 3 anos! Será por essa perspectiva negativa que o PT não se oferece a governar Mato Grosso, apesar dos nomes competentes e de prestígio que dispõe?
     Escaldados que somos, temos medo de água fria. Daí o alívio com o discurso do candidato, afinal, temos ouvido tantos absurdos. Tem gente afirmando que é mais fácil ligar Lucas do Rio Verde por uma ferrovia de mais de 1000 km, sem projeto, do que por outra de 500, já em construção. Tem gente em fim de governo querendo cancelar a concessão da ferrovia no trecho até Cuiabá, assegurando que depois o governo (qual?) faz outra. E querem trocar a ferrovia por uma esteira de soja, só de ida, sem as cargas de retorno viabilizadoras da tão almejada redução do frete, e cujo destino encontra-se na Grande Cuiabá. E como aceitar o silêncio do governo estadual e, mesmo da oposição local diante de tanto descaso? Quando tinha Dante, Dante cobrava. Depois que ele se foi suas obras ficaram órfãs. Mesmo o ex-prefeito de Cuiabá, candidato ao Paiaguás, que calou-se sobre estes assuntos quando prefeito, parece continuar assim como candidato. Em artigo recente decepcionou ao ficar nas generalidades sem citar diretamente a Ferronorte, o gás, a termelétrica, o aeroporto. Certamente quer a continuidade dessas grandes obras de seu próprio partido. Mas não disse. Ou será que não quer? Mato Grosso precisa de propostas claras de todos os candidatos. Chega de truques e dissimulações. Por isso é ótimo que Mato Grosso seja prioridade clara ao menos para um dos candidatos à Presidência da República. Quem sabe assim outros candidatos ou candidatas façam o mesmo. E os candidatos daqui também.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 04/04/2010)

terça-feira, 27 de abril de 2010

OS 590 ANOS DE BRASÍLIA

José Antonio lemos dos Santos

     Em 1420 foi iniciada a construção da cúpula da igreja Santa Maria del Fiore, em Florença, um desafio até então não superado pelo engenho humano. Aí apareceu Filippo Brunelleschi, um joalheiro que precisou de muito esforço para mostrar ser capaz de construir a grandiosa cúpula, tanto que para alguns o desafio do “ovo em pé”, atribuído a Colombo, teria sido posto por Brunelleschi em sua argumentação. Ao final não só construiu a cúpula, mas com ela marcou o início do Renascimento na Arquitetura e fixou as bases do que é hoje o projeto arquitetônico. A sua nova e revolucionária maneira de projetar estabeleceu que qualquer obra deve ser definida em todos os seus detalhes antes de construída, algo tão óbvio hoje que parece ter sido sempre assim.
     Em seguida vem Alberti, um quase contemporâneo que levou o mesmo raciocínio para a cidade, considerando-a uma “grande casa”, logo um edifício também sujeito à maneira de projetar de Brunelleschi, ou seja, a cidade também deveria ser concebida totalmente antes de ser construída. Surge então o urbanismo clássico com suas formas geométricas engenhosas, as cidades-estrêla, as perspectivas monumentais, o monumento alvo, etc. Brasília é assim, séculos depois, genialmente concebida in totum, tal como na fórmula primordial renascentista, limitada e definida, sugerindo a forma de um avião.
     As possibilidades e a vontade de fazer eram muitas. Porém, os próprios renascentistas não tiveram chances de aplicar a pleno suas teorias urbanísticas. A Europa vinha de um período de longas guerras e epidemias, sem demanda para novas cidades. Quando havia, resumia-se a pequenos arranjos em função das guerras religiosas, defesas militares e portos comerciais. Fora isso, só intervenções em cidades já existentes, não chegando a ver suas idéias aplicadas em uma nova cidade de porte significativo. Teriam que esperar Brasília, a coragem política de JK, a genialidade de Lúcio Costa e a força do trabalho do povo brasileiro. Mas de lá até a construção muita coisa aconteceu na história do mundo e no desenvolvimento do urbanismo.
     Arriscando um resumo, nesse ínterim a grande inflexão histórica foi a Revolução Industrial.  transformações sociais e as descobertas científicas se sucedem, a urbanização é acelerada e os problemas da recém nascida cidade industrial forçam, no meio do século XIX, o surgimento de novas propostas no urbanismo, como as dos socialistas utópicos e as leis sanitárias de Londres e Paris. Surgem ainda a Cidade Industrial de Garnier, a Cidade Linear de Soria, a Cidade Jardim de Howard, a “unidade de edificação” de Berlage e a “unité d´habitation” de Le Corbusier, como um cadinho efervescente preparando uma solução contemporânea para a nova cidade que surgia. Enfim, abraçando todo esse substrato de proposições históricas, é elaborada em 1933 a Carta de Atenas, documento mestre do Urbanismo Modernista.
     Brasília é a materialização da Carta de Atenas e a realização maior do urbanismo renascentista em seus fundamentos, indispensável ao aprendizado crítico concreto de suas muitas virtudes, e sua natural superação pela própria dinâmica da História na prática do urbanismo posterior. Brasília é resultado do pensamento urbanístico acumulado, em especial desde o Renascimento até sua concepção. Ainda que não fosse reconhecida pela UNESCO, mesmo assim seria um dos mais autênticos e expressivos patrimônios da humanidade. Se européia, seria melhor considerada pela cultura oficial brasileira. Brunelleschi e Lúcio Costa formam o alfa e o ômega de um processo de quase 600 anos e precisam ser devidamente reavaliados nos momentos históricos que ajudaram a construir e nos quais foram os principais protagonistas.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 27/04/2010)

terça-feira, 20 de abril de 2010

FERRONORTE E OS CONTRÁRIOS

José Antonio Lemos dos Santos

     Relembro que a concessão outorgada à Ferronorte - que em maio fará 21 anos, hoje em poder da América Latina Logística (ALL) – é “para o estabelecimento de um sistema de transporte ferroviário de carga abrangendo a construção, operação, exploração e conservação de estrada de ferro entre Cuiabá (MT) e: a) Uberaba/Uberlândia (MG), b) Santa Fé do Sul (SP), na margem direita do rio Paraná, c) Porto Velho (RO) e d) Santarém (PA)”. Mais que a ligação entre dois pontos, trata-se de um macro-projeto para a Amazônia meridional brasileira, centrado em Cuiabá. Sua lei e o contrato de concessão, deixados pelo senador Vuolo são as garantias desse grande projeto. Não deveriam ser mexidos.
     A lembrança vem a propósito da notícia trazida na semana passada pelo ministro dos Transportes de que teria determinado à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a suspensão da concessão à ALL do trecho entre Rondonópolis e Cuiabá, decisão tomada “depois que a ALL manifestou desinteresse sobre o trecho à ANTT”. Por coincidência ou não, justo o mais importante da concessão. Seria algo inusitado, como se no transporte coletivo de uma cidade a concessionária escolhesse dentre as linhas objeto da licitação aquelas de seu interesse para prestação dos serviços. Pelo que eu aprendi, neste caso a empresa perderia a concessão por inteiro, e não só os trechos que não lhe interessam. As empresas interessadas em uma concessão fazem seus estudos de viabilidade antes da licitação; não sendo viável, nem entram na disputa. Mas parece que neste caso os outros trechos continuarão concedidos à empresa, pois a própria ALL diz que seu contrato “lhe garante exclusividade para construir outros trechos ferroviários de Cuiabá até Santarém...”! Trechos a escolher também?
     Diz ainda o ministro que essa iniciativa visa assegurar que a ferrovia chegue a Cuiabá, já que, afastada a ALL, o “Governo do Estado ficaria com a responsabilidade de fazer o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA), ”o qual segundo o governador Silval Barbosa será feito nos próximos 90 dias pelo governo e seus parceiros no agronegócio”. E o interesse agora parece ser tanto que, mesmo em fim de governo, segundo o Diário de Cuiabá a “expectativa do diretor do Dnit, Luiz Antonio Pagot, é de que até março de 2011 o governo federal possa fazer a licitação para a nova concessão do trecho entre Cuiabá e Rondonópolis, com direito de passagem até o porto de Santos, em São Paulo.” Bom demais! Nada como véspera de eleições! Continuando a matéria, segundo o diretor, “grupos econômicos da China, Índia e Estados Unidos, além da empresa brasileira Vale, estão interessados na obra”, ainda que ao leigo, mas não idiota, seja difícil imaginar que alguém possa se interessar por um pedaço de 200 Km em um sistema de 6000 km pertencente a outra empresa.
     É bom lembrar também que já existe um projeto aprovado pelo Ministério do Transporte em 1977, cujo EIA/Rrima foi apresentado em audiência pública e que não recebeu parecer favorável da Funai por passar próximo (fora – rio abaixo) à reserva Teresa Cristina. Cobrando a realização de nova audiência pública, o então presidente da Ferronorte disse em 2001 ”tratar-se de um problema que poderia ser contornado com um pequeno desvio do traçado para não impedir o “direito de perambular” dos índios. São detalhes que podem ser corrigidos com pequenas alterações, que terão ônus para a Ferronorte. Mas isso não importa. O que interessa é que o projeto é viável e só depende de uma decisão política para ter continuidade”. Se era viável, porque teria deixado de ser? Hoje não falta projeto, nem viabilidade; falta vencer a vontade, dissimulada ou explícita, dos que são contra.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 20/04/2010)

terça-feira, 13 de abril de 2010

MARTÍRIO NO LIXÃO

José Antonio Lemos dos Santos

     Como infelizmente tenho feito nas últimas viradas de ano, no começo deste escrevi um artigo sobre mais uma dolorosa edição das tragédias urbanas brasileiras das estações chuvosas, achando que a cota anual desse tipo de desgraça havia terminado, e que só restava nos preparar resignados para as novas tragédias da próxima virada de ano. Qual o que! O Brasil sempre nos surpreende, para o bem ou para o mal. Nem bem iniciado o Outono, nova tragédia se abate sobre nós, agora no Rio de Janeiro. Mais uma vez fruto da irresponsabilidade pública, desta vez chegando ao paroxismo da crueldade em Niterói.
     No artigo do início do ano pensava que o título “Crimes sob as chuvas” fosse forte o suficiente para expressar com correção a origem daquelas tragédias, sempre eufemisticamente atribuídas a São Pedro e a excessos da natureza, mas que na verdade são crimes públicos por negligência na aplicação da legislação urbanística e ambiental, e/ou na observância de recomendações técnicas competentes. No mínimo! Emocionado como a maioria dos brasileiros, iniciei o artigo de hoje pensando que a palavra crime não seria mais suficiente, seria pouco, para expressar o que ocorreu sob as chuvas de Niterói. O que pensar de um prefeito que acompanha e deixa, desde sua primeira gestão em 1989, o povo ocupar a área de um lixão da própria prefeitura, desativado apenas três anos antes? Como não lembrar dos cruéis comboios nazistas de judeus? O que pensar de um cidadão que exerce pela terceira vez a prefeitura de uma cidade - terceira vez! - e que após a tragédia vem a público dizer que “não tinha conhecimento desse risco todo”? E Niterói é uma cidade desenvolvida, de muitos recursos técnicos.
     O drama do Morro do Bumba supera todas as outras dessas tragédias urbanas pois se deu em uma área cujos altos riscos de sua declividade natural foram consideravelmente ampliados pela própria prefeitura com a instalação indevida e tecnicamente incorreta de um lixão no local e depois pela omissão criminosa quando de sua ocupação. Não há como a prefeitura desconhecer; nem o prefeito, administrador da cidade por tanto tempo. Não se pode edificar em antigos lixões horizontais, e muito menos em um com aquele absurdo declive, não só pela geotécnica, mas por problemas como gases tóxicos e inflamáveis, chorume, doenças, etc.. Um crime consciente, gestado por décadas, a céu aberto.
     Quando o Brasil terá administradores públicos realmente governantes, só com a preocupação de governar o bem comum? Quando o Brasil se livrará dos maus políticos que fazem do poder público um meio de vida, mais preocupados com a próxima eleição e com a ampliação de seu poder e de sua estrutura político-eleitoral? Pouco somam se o povo está acima ou abaixo do lixo. De que interessam as tragédias anunciadas se elas podem ocorrer depois das eleições e até lá render alguns votos? E se, por azar, ocorrer durante o mandato, decreta-se luto oficial e nada mudará enquanto os processos não transitarem em julgado. Sob a irônica alegação de que “as pessoas têm a necessidade de encontrar culpados” o prefeito de Niterói fez mais um “sacrifício” pelo seu povo e assumiu a culpa, como se pudesse escapar dela.
     Esta tragédia absurda aconteceu em Niterói, uma das mais importantes cidades brasileiras, na região mais desenvolvida do país. Mostra a urgência do Brasil mudar o jeito de conduzir suas cidades. E parece que a hora chegou pois após esta tragédia criminosa, alguns discursos poderosos ficaram diferentes dos repetidos a cada ano, e me acenderam um lusco-fusco de esperança. Mas isso só em outro artigo.
(Publicada em 13/04/2010)

terça-feira, 6 de abril de 2010

CUIABÁ 300-9

José Antonio Lemos dos Santos

     Em um local com grandes pedras claras onde se pescava com flecha-arpão, por isso chamado Ikuiapá, onde um corguinho encontrava um belo rio, o ouro fez surgir - corgo acima - uma cidade que floresceu bonita e se chamou Cuiabá. O pequeno córrego tinha tanto ouro que era chamado Ikuiebo, córrego das estrelas, tantas as pepitas cintilando à luz do sol e da lua aos olhos bororos nativos. Cuiabá, a celula-mater das cidades e estados que enriquecem o oeste brasileiro, completa 291 anos e caminha acelerada para o seu tricentenário.
     Certamente a cidade receberá muitas homenagens no próximo dia 8 de abril, em especial sendo um ano eleitoral. Para mim, porém, presente algum superará ao recebido na semana passada: falo da desocupação da área da antiga foz do Prainha, sobre a qual já viajei tantos projetos, inclusive em artigos. A cidade ao menos por um tempo pode rever livre aquele espaço que originalmente era ocupado pelo corguinho - que já foi piscoso, depois transformado em denso e fétido esgoto, coberto com terra, como fazem os gatos – e ultimamente ocupado por edificações precárias. A cidade se depara com um espaço aberto, a paisagem urbana desobstruída, o ar, o sol e a ventilação plenos, tão importantes nas elevadas temperaturas cuiabanas. A cidade redescobre surpresa que o espaço urbano é composto de edificações e de vazios, assim como uma sinfonia se compõe de sons e silêncios harmoniosamente combinados, e se pergunta em contida alegria: por que não antes?
     E o lugar ficou bonito, talvez pelo contraste com o que era. Até o Atacadão ficou bonito, visto por quem vem da Beira-Rio. Pena ser por pouco tempo, já que essa área foi vendida pela prefeitura em data e valores não noticiados, sendo desconhecido inclusive se o valor foi suficiente para cobrir as despesas públicas de canalização e aterro da área. A esperança é que o Ministério Público, que já interviu na venda da travessa Tuffik Affi, volte seus olhos para essa área contígua, possibilitando que a cidade recupere aquele espaço que um dia foi seu, permitindo-lhe um acesso urbano digno e a correta interseção de duas de suas principais avenidas que passam pelo local. Há também um novo prefeito, uma boa novidade no cenário político, que por certo avaliará o ônus de assumir e implantar um erro urbanístico que não foi seu.
     Em seus quase três séculos, Cuiabá firmou-se como o pólo de apoio a tudo o que aconteceu neste “ocidente do imenso Brasil”. No exato centro geodésico continental, virou o encontro de todos os caminhos regionais. Assim subsistiu e prosperou, e como autêntico coração mato-grossense bombeou o desenvolvimento a todos os rincões de Mato Grosso, hoje o exemplo de maior sucesso entre os estados da federação. Cuiabá não é mais o centro de um vazio. Ao contrário, polariza uma das regiões mais dinâmicas do planeta, que ajudou a construir e que hoje não apenas lhe cobra o apoio, mas também a impulsiona para cima, em um sadio e maduro processo de simbiose regional ascendente.
     A nove anos de seu tricentenário, Cuiabá vive um salto qualitativo iniciado com o novo século, fruto da nova dinâmica regional. Ainda conquistou a propulsão da Copa do Pantanal. Fazer este salto acontecer é a responsabilidade da atual geração de cuiabanos, sua cidadania, autoridades e lideranças, construindo positivamente o futuro, mas também reagindo contra oportunistas previsíveis e manobras geopolíticas dissimuladas adversas. A disposição para uma ação conjunta buscando com que os benefícios do novo tempo se materializem na cidade e na qualidade de vida em todo Mato Grosso, esta seria o maior presente a ser dado a Cuiabá no seu 291º aniversário e em cada um dos anos que faltam na construção da grande festa do tricentenário.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 06/04/2010)

terça-feira, 30 de março de 2010

FERRONORTE, PAC 2 E EIA/RIMA

José Antonio Lemos dos Santos


     Neste mês de março fez 10 anos da realização da única audiência pública para licenciamento ambiental sobre a Ferronorte, na qual foi apreciado o traçado até Cuiabá proposto pela empresa, aprovado anteriormente pelo Ministério dos Transportes. Até então a ligação ferroviária de Cuiabá era considerada viabilíssima tanto pelo Ministério como pela Ferronorte. Estive presente e nela esteve também o senador Vuolo, o “pai da ferrovia”. O traçado proposto foi aceito até Mineirinho, na BR-163, cerca de 60 Km ao sul de Rondonópolis. O restante do trecho até Cuiabá não foi aprovado pelo IBAMA, que acatou parecer da FUNAI, desfavorável pelos impactos que traria à reserva indígena Teresa Cristina, mesmo passando 700 metros fora, repito, fora da reserva. Portanto, a uma distância ainda maior da aldeia.
     Talvez em homenagem aos 10 anos da audiência pública e aos enormes prejuízos econômicos, ambientais e em vidas humanas causados pela falta que a ferrovia fez e faz a Mato Grosso, na semana passada o IBAMA liberou Licença de Instalação (LI) para cerca de 165 quilômetros entre Alto Araguaia e Rondonópolis, de um total de 215 quilômetros. Imagino que essa Licença seja suficiente para a ferrovia chegar a Mineirinho, até onde foi concedida a Licença Prévia há 10 anos. Alvíssaras! Aliás, em maio próximo a concessão federal à Ferronorte completa 21 anos, assistindo invejosa a rapidez com que é tratada a “ferroleste”, já inclusa no Plano Nacional de Viação e no PAC para execução imediata, ainda que sem projeto, sem qualquer apreciação ambiental, mesmo tendo pela frente nada mais nada menos que o Parque Nacional do Xingu e o Araguaia em um de seus pontos mais sensíveis.
     Uma vez em Mineirinho, é urgente que a Ferronorte se aproxime de Rondonópolis e venha para Cuiabá, cumprindo a primeira etapa da concessão. Para tal há que se realizar novos estudos e audiência pública para avaliação dos impactos ambientais das adequações necessárias no traçado original. A chegada dos trilhos a Rondonópolis depende tanto desses estudos quanto a chegada a Cuiabá, pois só foi concedida a LI até Mineirinho. Muito bem conduzido pelo vereador Francisco Vuolo, o Fórum Pró-Ferrovia reivindica há tempos esses estudos e audiências, que são prioritários e devem ser feitos no seu total, isto é, de Mineirinho até Cuiabá, destino da primeira etapa da ferrovia. Sem eles os trilhos não podem avançar além de Mineirinho.
     As primeiras notícias da tarde de ontem, davam conta da inclusão do trecho até Cuiabá no PAC 2, conforme a ministra Dilma havia prometido na sua recente visita à capital mato-grossense. Como promessa de campanha talvez não valha muito. Vale entretanto como reinclusão do projeto da Ferronorte até Cuiabá no discurso oficial do governo federal, de onde havia desaparecido há alguns anos. Mais do que nunca é hora de consolidá-lo cobrando a execução do EIA/RIMA, no seu trajeto total, Mineirinho-Rondonópolis-Cuiabá.
     O traçado original da Ferronorte, como está na concessão federal, consolidará a espinha dorsal do estado – a BR-163 – atendendo diretamente cidades como Sinop, Lucas, Sorriso, Nova Mutum, Nobres, até Santarém, carentes da ferrovia tanto quanto Cuiabá e Várzea Grande. Sua bifurcação para Rondônia, e daí ao Pacífico, pode ser por Lucas e Sapezal, ou por Tangará e Barra do Bugres ou ainda por Diamantino. Permite chegar ao porto de Cáceres e acessar o Pacífico via Bolívia. Se confirmada, que a inclusão no PAC da Ferronorte até Cuiabá não seja apenas um agrado de campanha ao maior reduto eleitoral do estado, mas sim, de fato, um compromisso com a execução imediata da melhor alternativa ferroviária para todas as regiões de Mato Grosso.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 30/03/2010)

terça-feira, 23 de março de 2010

FERRONORTE PARA MATO GROSSO

José Antonio Lemos dos Santos


     Pela sua forma simpática de se expressar, reproduzo um dos comentários referentes ao artigo “Ferronorte já!”, republicado no site EXPRESSOMT, de Lucas do Rio Verde. Diz o prezado leitor e conterrâneo, que se identifica apenas como Curupira: “Se o professor tem ou não razão isso não importa em nada. Na minha opinião, sem dúvida nenhuma, 560km entre Lucas e Rondonópolis é bem mais perto que 1004 km. Num primeiro momento é bem mais interessante a conclusão da ferronorte. Porém, temos algumas colocações. Onde nosso governador tem terras??? Em Itiquira? Lá já tem ferrovia. Em Cuiabá? Claro que não. Em Sapezal? Lógico. Na região de Água Boa? Sim. Na região da Baixada Cuiabana? NNããõoo. Então, meu cumpadi professor, cchhhhhhhhooooorrrrrrraaaaa. Por que se a ferrovia ligando Goiás a Rondônia não sair em 10 anos a ferronorte até Cuiabá não sai nem em 20 anos. É fácil né.”
     Mesmo sendo uma versão bastante ouvida, entendo que a questão da ferrovia em Mato Grosso vai muito além dela, até porque o governador tem terras e interesses em todo o estado. Esta questão envolve a construção ou não de um novo modelo geopolítico para o desenvolvimento do estado. Esta encruzilhada ficou clara agora com o lançamento da “ferroleste” e da pavimentação da BR-242 até a MT-130, fazendo a ligação rodoviária de Lucas direto a Rondonópolis. Combinadas com a idéia de desviar de Cuiabá o traçado da Ferronorte, seguindo de Rondonópolis para Lucas, temos o futuro geopolítico que alguns grupos pretendem para Mato Grosso, com a região platina mato-grossense marginalizada do processo de desenvolvimento que ajudou a construir. Cuiabá viraria a Ouro Preto do agronegócio e o estado seria polarizado por Lucas do Rio Verde, que desbanca regionalmente Sorriso e Sinop, esta já tão maltratada pelas políticas oficiais recentes.
     Esse projeto ficou sendo o principal objetivo do DNIT para Mato Grosso, muito bem camuflado até agora, em demonstração de extrema competência. A mesma competência que não apareceu para fazer andar a Ferronorte, ou para a duplicação rodoviária de Rondonópolis a Posto Gil, nem para a melhoria das demais BRs no estado. Esse quadro ajuda a explicar o descaso oficial pelo corte do gás boliviano para Cuiabá, o descaso pela paralisação da termelétrica e das obras do aeroporto em Várzea Grande, o pouco caso pelo Porto Seco, pela ecovia do Paraguai, pela Base Aérea de Cáceres, etc..
     Sendo uma transversal, a “ferroleste” só toca a Br-163 em um ponto, Lucas, daí seguindo para Sapezal e Vilhena, deixando fora de seu traçado cidades como Sinop, Sorriso, Nova Mutum e Nobres que tanto quanto Cuiabá e Várzea Grande, também necessitam e aguardam para ontem a ferrovia. Já o traçado original da Ferronorte, que consta da concessão federal, passando por Cuiabá – a maior concentração de cargas do estado - consolidará a espinha dorsal do estado – a BR-163 - seguindo a partir dela para Santarém e Porto Velho, e daí até ao Pacífico. Sua bifurcação para Rondônia pode ser por Lucas e Sapezal, ou por Tangará e Barra do Bugres ou ainda por Diamantino. Permite também um ramal integrando o porto de Cáceres, com outro acesso ao Pacífico, via Bolívia. Importante é que a Ferronorte não exclui a “ferroleste”, enquanto que esta inviabiliza a Ferronorte, ao seqüestrar a carga de Mato Grosso para Goiás. A Ferronorte foi concebida para atender todo o estado, em todas as suas regiões e segmentos produtivos, não só para levar, mas também para trazer o desenvolvimento. Preserva a integridade territorial de Mato Grosso, razão principal de seu sucesso. As eleições deste ano definem qual destes dois modelos queremos. E nosso instrumento de escolha é o voto.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 23/03/2010)

terça-feira, 16 de março de 2010

MINISTRA PARABÉNS!

José Antonio Lemos dos Santos


     Parabéns ministra Dilma! Vossa Excelência parece ter percebido a tempo que uma obra tão importante para Mato Grosso – para o bem ou para o mal - como a recém concebida ferrovia ligando Goiás a Rondônia, passando por Lucas do Rio Verde e Sapezal, deveria ter sido ao menos anunciada na capital do estado durante a visita que fez outro dia a Cuiabá. Seria uma consideração mínima a um estado que nas últimas décadas vem despontando como campeão brasileiro em produção, e à sua capital. Vossa Excelência parece ter percebido a tempo que sua candidatura não pode ser rebocada por grupos que acham que seus interesses precedem aos interesses do estado.
     Mato Grosso não suporta mais os altos custos impostos pela sua atual logística de transportes. Nem pode mais esperar por esta criminosa ciranda em que transformaram seu principal projeto ferroviário. A ferrovia é urgente, para ontem, ou mais precisamente, para uns 20 anos atrás. Os trilhos precisam chegar já a Lucas, Nova Mutum, Tapurah, Sorriso, Sinop, e delas a Santarém, Vilhena e ao Pacífico, passando, porém, por Rondonópolis e Cuiabá não só para escoar a produção mato-grossense, mas também para trazer mercadorias e insumos diversos, materiais de construção, combustíveis, etc., reduzindo os custos econômicos e ambientais de nossos produtos, e poupando as vidas cotidianamente ceifadas por uma malha rodoviária defasada e assassina. Lucas do Rio Verde está a cerca de 350 quilometros de Cuiabá, que por sua vez está a uns 210 quilômetros de Rondonópolis, onde os trilhos já estão chegando pelo próprio PAC, na concessão da Ferronorte. Porque então trocar esta alternativa real por outra com mais mil quilômetros, que deve ainda equacionar impactos no Parque do Xingu e cruzar o Araguaia em um de seus pontos mais sensíveis ambientalmente? Aliás, tempos atrás surgiu também um novo trajeto entre Cuiabá e Rondonópolis, com o dobro da distância, sob o pretexto de “viabilizar” a chegada da ferrovia a Cuiabá. Semana passada, em duro discurso no Senado sobre o assunto, o senador Jayme Campos perguntou se tem gente que pensa que o mato-grossense é idiota.
     Cuiabá e Várzea Grande juntas, queiram ou não, formam o maior pólo concentrador de cargas do estado. Passa por elas toda a carga produzida a oeste da área de influência da BR-163 destinada ao sudeste brasileiro, seja para exportação via seus portos ou para consumo interno, e que não se resume à soja. E seguirá passando a não ser que se perprete este verdadeiro seqüestro de cargas de Mato Grosso para Goiás com a construção antecipada da ligação de Lucas a Uruaçu.
     Evidente que é importante a Leste-Oeste, desde que após a implantação do traçado já concedido à Ferronorte, que além de execução mais rápida, consolidará a espinha dorsal de Mato Grosso, marcada pelo eixo da Br-163. A construção precipitada de uma ferrovia transversal, partirá Mato Grosso ao meio, criando duas economias, a nova centrada em Goiás, ambas fracas, voltando à rabeira da economia nacional, sem voz e sem vez. Um campeão nacional não merece ser apunhalado.
     Que bom se em breve a ministra remarcar sua visita a Mato Grosso, desta vez para trazer a inclusão no PAC dos trechos da Ferronorte entre Rondonópolis e Cuiabá e de Cuiabá até Lucas, ou mesmo até Sorriso ou Sinop, em seu total muito mais rápido, mais barato e melhor para Mato Grosso do que essa ferrovia para Goiás. Aí sim uma ferrovia para todo Mato Grosso, integrando o estado sem deixar nenhuma região excluída. E que outros presidenciáveis façam o mesmo. E que prossigam os estudos da Leste-Oeste e de outros projetos realmente importantes para Mato Grosso. Aos mato-grossenses resta o voto.
(Publicado em 16/03/2010)

terça-feira, 9 de março de 2010

O SENHOR DAS ÁGUAS

José Antonio Lemos dos Santos


     Penso que a melhor maneira de homenagear nas poucas linhas de um artigo uma figura tão rica como Domingos Iglesias Valério, seria relembrar uma de suas muitas lições. Nunca fui seu aluno, mas sempre o tive como um mestre no desenvolvimento de Cuiabá e Mato Grosso, jamais se omitindo mesmo sob o risco da polêmica, como homem que entendia que o conhecimento só tem sentido se compartilhado, como demonstrou ao longo da vida, sempre em prol da gente e da terra que adotou com tanto fervor. A socialização do conhecimento em todas as suas dimensões, não apenas o técnico, o compartilhamento, bem pode ter sido sua principal lição. Mas, nesta pequena homenagem, destaco no campo do urbanismo uma das lições de maior utilidade em minhas funções públicas, e que me parece da maior importância não só para Cuiabá, mas para todas as cidades do Brasil, das vilas às metrópoles.
     Nos bancos escolares uma coisa é você ter recebido aula de uma determinada matéria e tê-la em seu currículo. Outra coisa é você entender de fato o que foi aprendido oficialmente. Foi com o “professor Iglesias” - como carinhosamente conhecido - que entendi na prática o conceito das áreas de risco inundáveis, que ele chamava de “império das águas”. Quando colocadas nas lições escolares ou nas letras frias das tantas leis que tratam do assunto no Brasil, as áreas de risco, notadamente às ligadas às águas, parecem perder muito da sua periculosidade, de sua potencialidade de dano, problema só percebido por ocasião das tragédias. Com a expressão “império das águas” o professor, falecido no sábado, ensinou que as áreas inundáveis são os espaços naturais das águas, indispensáveis à sua existência, pois, continuando em sua lição, os corpos d’água respiram como seres vivos que são, como se inspirassem nas cheias e expirassem nas vazantes.
     Até aqui, uma forma bonita de se falar sobre as águas. Esta lição, porém, tem uma outra parte, a parte dura. Por trás de sua extrema docilidade, maleabilidade e generosidade para com a vida, a água é poderosa, e pode ser muito cruel e impiedosa na defesa das áreas que fazem parte de sua existência e integridade. Além das notificações e das multas administrativas oficiais, se fosse possível estas punições da natureza também deveriam estar nas leis pois os homens insistem em fingir não conhecê-las, talvez pela sua prepotência tecnológica ou pelo pouco caso com a vida, principalmente pelas dos outros. Só se lembram quando cobrados cruelmente a cada período de chuvas. E aí as lágrimas de crocodilo, culpando São Pedro ou alegando uma falsa falta de planejamento. Senhor dos segredos da águas dos nossos rios, o professor Iglesias dizia que não eram os rios que invadiam as cidades, mas as cidades que invadiam os rios.
     Quando na Defesa Civil do Estado ele chegou a propor uma marcação física para a “cota de emergência” ao longo do rio Cuiabá, numa tentativa de alertar aqueles que pretendessem se instalar nessas áreas. Para o setor público o recado seria que as ocupações abaixo dessa cota seriam da responsabilidade dos prefeitos, que têm por obrigação impedi-las, como mandam as leis. Seria como um freio a esse processo criminoso de ocupação de áreas de risco. Seguindo a idéia em uma das minhas costumeiras sessões de elocubrações livres, cheguei a pensar que as cidades brasileiras devessem fixar um passivo de ocupações de risco, e cada administrador, com penas previstas em lei, teria a obrigação de não permitir a ampliação, bem como de reduzi-lo a cada gestão, com base em metas de redução de longo prazo estabelecidas nos planos diretores. Mas, de que adiantaria mais uma lei em um país que prefere chorar as catástrofes a cumprir a legislação urbanística?
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 09/03/10)

terça-feira, 2 de março de 2010

FERRONORTE JÁ!

José Antonio Lemos dos Santos


     Em artigo denominado “Trem a jato”, publicado em 27 de janeiro do ano passado, fui um dos primeiros a saudar o projeto da nova ferrovia ligando Uruaçu (GO) a Vilhena (RO), passando por Lucas do Rio Verde e Sapezal em Mato Grosso. Também tive a oportunidade de admirar a rapidez com que tal proposta saiu do nada e entrou no Plano Nacional de Viação. E mais, conseguiu entrar no PAC ainda com “projeto a definir”, façanha não conseguida até hoje pelo trecho da Ferronorte entre Rondonópolis e Cuiabá - cuja concessão completa 21 anos - trecho com maior movimento rodoviário de cargas e acidentes no estado. Quem dera tivéssemos sempre a mesma rapidez. Mas, dias atrás em Cuiabá a ministra Dilma Roussef prometeu avaliar a inclusão no PAC do trecho até Cuiabá. Enquanto isso, avaliamos nosso voto à presidência.
     Claro que é importante a nova ferrovia, desde que executada após a implantação do traçado já concedido à Ferronorte, e, naturalmente, após aprovada pelos devidos estudos de impacto ambiental. Mato Grosso não pode mais esperar por uma ferrovia. Não apenas para levar sua produção, ou trazer as cargas de retorno (mercadorias, insumos diversos, defensivos, fertilizantes, combustíveis, materiais de construção etc.), mas principalmente para reduzir custos de produção, poupar o meio ambiente e as vidas que são ceifadas pela atual sobrecarga das rodovias. É urgente que a ferrovia chegue à Cuiabá, Lucas, Sinop, Sorriso, seguindo de imediato à Santarém e Vilhena, assegurando o escoamento da diversificada produção mato-grossense para o mercado externo e interno, e inclusive a vinda de produtos da Zona Franca de Manaus para o mercado brasileiro, com mais segurança e menores custos. No quesito urgência, não resta dúvida que o trajeto da Ferronorte será de execução muito mais rápida, pois já está praticamente em Rondonópolis, a 200 km de Cuiabá e a 560 de Lucas, sem nenhum Araguaia, Ilha do Bananal ou Parque do Xingú pelo caminho. A outra tem mais de 1000 km para chegar a Lucas.
     A conurbação Cuiabá/Várzea Grande forma o maior pólo concentrador de cargas do estado. Ainda que não produza um grão, passa por ela toda carga a oeste da área de influência da BR-163 destinada ao sudeste brasileiro, seja para exportação via seus portos ou para consumo interno. Por exemplo, no ano passado cerca de 8 milhões de toneladas da soja produzida em Mato Grosso ficaram no mercado interno, isto é, para ficar no Brasil passou por Cuiabá um volume igual à produção do Rio Grande do Sul, terceiro produtor nacional de soja. Só esta carga já viabilizaria a ligação de Cuiabá, fora os demais produtos. A eventual construção antecipada da ligação de Lucas a Uruaçu significaria então um seqüestro para Goiás dessa carga, que deixaria de passar por Mato Grosso e de ajudar a consolidar o estado. Por outro lado, Cuiabá é também o maior centro produtor, consumidor e distribuidor do oeste de Brasil, sendo o principal destino das cargas de retorno de uma ferrovia idealizada não apenas para levar, mas também para trazer o desenvolvimento. Cuiabá é o maior pólo regional de cargas de ida e de volta, sem as quais nenhum frete se viabiliza.
     Unido e trabalhador, Mato Grosso tem na sua dimensão a causa maior do seu sucesso. Sua espinha dorsal, a Br – 163 será fortalecida com a ferrovia ligando Cuiabá a Santarém e Vilhena. A construção de uma ferrovia transversal precedendo ao projeto da FERRONORTE, partirá Mato Grosso na medula, ao meio, criando duas economias, com a nova centrada em Goiás, ambas fracas, de volta à rabeira da economia nacional, sem voz e sem vez. É tudo que Mato Grosso não precisa.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 02/03/2010)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

A LISTA DO CNJ

José Antonio Lemos dos Santos


     Com importantes passos dados ultimamente, as eleições no Brasil voltam a apresentar alguns sinais de esperança. Mais exatamente, dois passos, fundamentais no sentido de fazer da democracia brasileira um instrumento da cidadania nacional, voltada realmente para a construção do bem comum. O primeiro foi a confirmação pelo STF de que não são dos candidatos eleitos os cargos disputados nas eleições proporcionais, e sim dos partidos ou coligações pelos quais foram eleitos. A segunda é a recente decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de publicar a lista dos condenados por improbidade administrativa, de forma acessível e clara a todos.
     A decisão do STF sacolejou os alicerces de nossa incipiente República, pois confirma que o eleitor vota duas vezes nas eleições proporcionais – complicadas mas indispensáveis à democracia. Primeiro vota nos partidos definindo os que serão representados nos parlamentos e quantas cadeiras terão, conforme a totalidade dos votos obtidos pelas legendas e todos os seus candidatos, inclusive pelos menos votados. Depois, o voto do eleitor define quais candidatos ocuparão as vagas disputadas, em ordem decrescente de votos obtidos. Daí a decisão de que os cargos são dos partidos, pois, de fato eles os conquistaram. O que, aliás, era claro para os que seguem as eleições brasileiras, acostumados aos cálculos dos coeficientes e quocientes eleitorais, sobras de votos, etc.. Só não via assim quem não queria ver, ou não queria que fosse assim.
     Essa decisão ainda traz ao eleitor uma lição fundamental: ninguém perde o voto nas eleições proporcionais. Cada voto tem participação direta na definição da distribuição proporcional do poder entre os partidos e na escolha dos ocupantes das vagas em disputa. Seu voto sempre elegerá alguém, mesmo que não seja aquele escolhido por você. Assim, você pode votar em um candidato e eleger outro, e, pior, ficar com a pecha de não saber votar. Esta situação acontece porque o eleitor em geral desconhece que nas eleições proporcionais não basta seu candidato ser um ótimo candidato; ele também não pode estar mal acompanhado na lista de candidatos de seu partido ou coligação. Ao escolher seu candidato o eleitor precisa avaliar a lista em que ele se encontra, para ver se ela abriga algum(ns) candidato(s) que não queira ver eleito(s), caso em que corre o grande risco de eleger um ou mais destes. Assim, nas eleições proporcionais ninguém pode dizer que nada tem a ver com os deputados ou vereadores eleitos alegando não ter votado diretamente em qualquer um deles, ou por ter anulado seu voto.
     Votando ao mesmo tempo no partido e no candidato, o eleitor tem que estar informado sobre todos os candidatos, ao menos os da lista em que escolheu o seu. Daí a relevância da lista do CNJ com os condenados por improbidade administrativa. Para aproveitar a oportunidade de uma sinergia histórica, torna-se agora imprescindível que a Justiça Eleitoral dê um novo passo nessa caminhada de esperança que ela mesmo retomou, determinando que os partidos divulguem a lista de seus candidatos, também de forma clara e acessível a todos. Ou que os próprios TREs divulguem tais listas, organizadas por partido ou coligação e não apenas por ordem alfabética, evitando que o eleitor continue comprando gato por lebre. Na verdade, um dia ainda espero ver retiradas das costas dos tradicionais “santinhos” de propaganda dos candidatos as inconvenientes receitas, calendários, orações, etc., substituídas pela lista dos correligionários de cada um, postulantes à mesma vaga, com orgulho e sem necessidade de escondê-la. Seria mais coerente com a lei, mais útil ao eleitor e à democracia.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 23/02/2010)