José Antonio lemos dos Santos
Em 1420 foi iniciada a construção da cúpula da igreja Santa Maria del Fiore, em Florença, um desafio até então não superado pelo engenho humano. Aí apareceu Filippo Brunelleschi, um joalheiro que precisou de muito esforço para mostrar ser capaz de construir a grandiosa cúpula, tanto que para alguns o desafio do “ovo em pé”, atribuído a Colombo, teria sido posto por Brunelleschi em sua argumentação. Ao final não só construiu a cúpula, mas com ela marcou o início do Renascimento na Arquitetura e fixou as bases do que é hoje o projeto arquitetônico. A sua nova e revolucionária maneira de projetar estabeleceu que qualquer obra deve ser definida em todos os seus detalhes antes de construída, algo tão óbvio hoje que parece ter sido sempre assim.
Em seguida vem Alberti, um quase contemporâneo que levou o mesmo raciocínio para a cidade, considerando-a uma “grande casa”, logo um edifício também sujeito à maneira de projetar de Brunelleschi, ou seja, a cidade também deveria ser concebida totalmente antes de ser construída. Surge então o urbanismo clássico com suas formas geométricas engenhosas, as cidades-estrêla, as perspectivas monumentais, o monumento alvo, etc. Brasília é assim, séculos depois, genialmente concebida in totum, tal como na fórmula primordial renascentista, limitada e definida, sugerindo a forma de um avião.
As possibilidades e a vontade de fazer eram muitas. Porém, os próprios renascentistas não tiveram chances de aplicar a pleno suas teorias urbanísticas. A Europa vinha de um período de longas guerras e epidemias, sem demanda para novas cidades. Quando havia, resumia-se a pequenos arranjos em função das guerras religiosas, defesas militares e portos comerciais. Fora isso, só intervenções em cidades já existentes, não chegando a ver suas idéias aplicadas em uma nova cidade de porte significativo. Teriam que esperar Brasília, a coragem política de JK, a genialidade de Lúcio Costa e a força do trabalho do povo brasileiro. Mas de lá até a construção muita coisa aconteceu na história do mundo e no desenvolvimento do urbanismo.
Arriscando um resumo, nesse ínterim a grande inflexão histórica foi a Revolução Industrial. transformações sociais e as descobertas científicas se sucedem, a urbanização é acelerada e os problemas da recém nascida cidade industrial forçam, no meio do século XIX, o surgimento de novas propostas no urbanismo, como as dos socialistas utópicos e as leis sanitárias de Londres e Paris. Surgem ainda a Cidade Industrial de Garnier, a Cidade Linear de Soria, a Cidade Jardim de Howard, a “unidade de edificação” de Berlage e a “unité d´habitation” de Le Corbusier, como um cadinho efervescente preparando uma solução contemporânea para a nova cidade que surgia. Enfim, abraçando todo esse substrato de proposições históricas, é elaborada em 1933 a Carta de Atenas, documento mestre do Urbanismo Modernista.
Brasília é a materialização da Carta de Atenas e a realização maior do urbanismo renascentista em seus fundamentos, indispensável ao aprendizado crítico concreto de suas muitas virtudes, e sua natural superação pela própria dinâmica da História na prática do urbanismo posterior. Brasília é resultado do pensamento urbanístico acumulado, em especial desde o Renascimento até sua concepção. Ainda que não fosse reconhecida pela UNESCO, mesmo assim seria um dos mais autênticos e expressivos patrimônios da humanidade. Se européia, seria melhor considerada pela cultura oficial brasileira. Brunelleschi e Lúcio Costa formam o alfa e o ômega de um processo de quase 600 anos e precisam ser devidamente reavaliados nos momentos históricos que ajudaram a construir e nos quais foram os principais protagonistas.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 27/04/2010)
José Antonio Lemos dos Santos, arquiteto e urbanista, é professor universitário aposentado . Troféu "João Thimóteo"-1991-IAB/MT/ "Diploma do Mérito IAB 80 Anos"/ Troféu "O Construtor" - Sinduscon MT Ano 2000 / Arquiteto do Ano 2010 pelo CREA-MT/ Comenda do Legislativo Cuiabano 2018/ Ordem do Mérito Cuiabá 300 Anos da Câmara Municipal de Cuiabá 2019.
"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)
terça-feira, 27 de abril de 2010
OS 590 ANOS DE BRASÍLIA
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terça-feira, 20 de abril de 2010
FERRONORTE E OS CONTRÁRIOS
José Antonio Lemos dos Santos
Relembro que a concessão outorgada à Ferronorte - que em maio fará 21 anos, hoje em poder da América Latina Logística (ALL) – é “para o estabelecimento de um sistema de transporte ferroviário de carga abrangendo a construção, operação, exploração e conservação de estrada de ferro entre Cuiabá (MT) e: a) Uberaba/Uberlândia (MG), b) Santa Fé do Sul (SP), na margem direita do rio Paraná, c) Porto Velho (RO) e d) Santarém (PA)”. Mais que a ligação entre dois pontos, trata-se de um macro-projeto para a Amazônia meridional brasileira, centrado em Cuiabá. Sua lei e o contrato de concessão, deixados pelo senador Vuolo são as garantias desse grande projeto. Não deveriam ser mexidos.
A lembrança vem a propósito da notícia trazida na semana passada pelo ministro dos Transportes de que teria determinado à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a suspensão da concessão à ALL do trecho entre Rondonópolis e Cuiabá, decisão tomada “depois que a ALL manifestou desinteresse sobre o trecho à ANTT”. Por coincidência ou não, justo o mais importante da concessão. Seria algo inusitado, como se no transporte coletivo de uma cidade a concessionária escolhesse dentre as linhas objeto da licitação aquelas de seu interesse para prestação dos serviços. Pelo que eu aprendi, neste caso a empresa perderia a concessão por inteiro, e não só os trechos que não lhe interessam. As empresas interessadas em uma concessão fazem seus estudos de viabilidade antes da licitação; não sendo viável, nem entram na disputa. Mas parece que neste caso os outros trechos continuarão concedidos à empresa, pois a própria ALL diz que seu contrato “lhe garante exclusividade para construir outros trechos ferroviários de Cuiabá até Santarém...”! Trechos a escolher também?
Diz ainda o ministro que essa iniciativa visa assegurar que a ferrovia chegue a Cuiabá, já que, afastada a ALL, o “Governo do Estado ficaria com a responsabilidade de fazer o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA), ”o qual segundo o governador Silval Barbosa será feito nos próximos 90 dias pelo governo e seus parceiros no agronegócio”. E o interesse agora parece ser tanto que, mesmo em fim de governo, segundo o Diário de Cuiabá a “expectativa do diretor do Dnit, Luiz Antonio Pagot, é de que até março de 2011 o governo federal possa fazer a licitação para a nova concessão do trecho entre Cuiabá e Rondonópolis, com direito de passagem até o porto de Santos, em São Paulo.” Bom demais! Nada como véspera de eleições! Continuando a matéria, segundo o diretor, “grupos econômicos da China, Índia e Estados Unidos, além da empresa brasileira Vale, estão interessados na obra”, ainda que ao leigo, mas não idiota, seja difícil imaginar que alguém possa se interessar por um pedaço de 200 Km em um sistema de 6000 km pertencente a outra empresa.
É bom lembrar também que já existe um projeto aprovado pelo Ministério do Transporte em 1977, cujo EIA/Rrima foi apresentado em audiência pública e que não recebeu parecer favorável da Funai por passar próximo (fora – rio abaixo) à reserva Teresa Cristina. Cobrando a realização de nova audiência pública, o então presidente da Ferronorte disse em 2001 ”tratar-se de um problema que poderia ser contornado com um pequeno desvio do traçado para não impedir o “direito de perambular” dos índios. São detalhes que podem ser corrigidos com pequenas alterações, que terão ônus para a Ferronorte. Mas isso não importa. O que interessa é que o projeto é viável e só depende de uma decisão política para ter continuidade”. Se era viável, porque teria deixado de ser? Hoje não falta projeto, nem viabilidade; falta vencer a vontade, dissimulada ou explícita, dos que são contra.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 20/04/2010)
Relembro que a concessão outorgada à Ferronorte - que em maio fará 21 anos, hoje em poder da América Latina Logística (ALL) – é “para o estabelecimento de um sistema de transporte ferroviário de carga abrangendo a construção, operação, exploração e conservação de estrada de ferro entre Cuiabá (MT) e: a) Uberaba/Uberlândia (MG), b) Santa Fé do Sul (SP), na margem direita do rio Paraná, c) Porto Velho (RO) e d) Santarém (PA)”. Mais que a ligação entre dois pontos, trata-se de um macro-projeto para a Amazônia meridional brasileira, centrado em Cuiabá. Sua lei e o contrato de concessão, deixados pelo senador Vuolo são as garantias desse grande projeto. Não deveriam ser mexidos.
A lembrança vem a propósito da notícia trazida na semana passada pelo ministro dos Transportes de que teria determinado à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a suspensão da concessão à ALL do trecho entre Rondonópolis e Cuiabá, decisão tomada “depois que a ALL manifestou desinteresse sobre o trecho à ANTT”. Por coincidência ou não, justo o mais importante da concessão. Seria algo inusitado, como se no transporte coletivo de uma cidade a concessionária escolhesse dentre as linhas objeto da licitação aquelas de seu interesse para prestação dos serviços. Pelo que eu aprendi, neste caso a empresa perderia a concessão por inteiro, e não só os trechos que não lhe interessam. As empresas interessadas em uma concessão fazem seus estudos de viabilidade antes da licitação; não sendo viável, nem entram na disputa. Mas parece que neste caso os outros trechos continuarão concedidos à empresa, pois a própria ALL diz que seu contrato “lhe garante exclusividade para construir outros trechos ferroviários de Cuiabá até Santarém...”! Trechos a escolher também?
Diz ainda o ministro que essa iniciativa visa assegurar que a ferrovia chegue a Cuiabá, já que, afastada a ALL, o “Governo do Estado ficaria com a responsabilidade de fazer o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA), ”o qual segundo o governador Silval Barbosa será feito nos próximos 90 dias pelo governo e seus parceiros no agronegócio”. E o interesse agora parece ser tanto que, mesmo em fim de governo, segundo o Diário de Cuiabá a “expectativa do diretor do Dnit, Luiz Antonio Pagot, é de que até março de 2011 o governo federal possa fazer a licitação para a nova concessão do trecho entre Cuiabá e Rondonópolis, com direito de passagem até o porto de Santos, em São Paulo.” Bom demais! Nada como véspera de eleições! Continuando a matéria, segundo o diretor, “grupos econômicos da China, Índia e Estados Unidos, além da empresa brasileira Vale, estão interessados na obra”, ainda que ao leigo, mas não idiota, seja difícil imaginar que alguém possa se interessar por um pedaço de 200 Km em um sistema de 6000 km pertencente a outra empresa.
É bom lembrar também que já existe um projeto aprovado pelo Ministério do Transporte em 1977, cujo EIA/Rrima foi apresentado em audiência pública e que não recebeu parecer favorável da Funai por passar próximo (fora – rio abaixo) à reserva Teresa Cristina. Cobrando a realização de nova audiência pública, o então presidente da Ferronorte disse em 2001 ”tratar-se de um problema que poderia ser contornado com um pequeno desvio do traçado para não impedir o “direito de perambular” dos índios. São detalhes que podem ser corrigidos com pequenas alterações, que terão ônus para a Ferronorte. Mas isso não importa. O que interessa é que o projeto é viável e só depende de uma decisão política para ter continuidade”. Se era viável, porque teria deixado de ser? Hoje não falta projeto, nem viabilidade; falta vencer a vontade, dissimulada ou explícita, dos que são contra.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 20/04/2010)
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terça-feira, 13 de abril de 2010
MARTÍRIO NO LIXÃO
José Antonio Lemos dos Santos
Como infelizmente tenho feito nas últimas viradas de ano, no começo deste escrevi um artigo sobre mais uma dolorosa edição das tragédias urbanas brasileiras das estações chuvosas, achando que a cota anual desse tipo de desgraça havia terminado, e que só restava nos preparar resignados para as novas tragédias da próxima virada de ano. Qual o que! O Brasil sempre nos surpreende, para o bem ou para o mal. Nem bem iniciado o Outono, nova tragédia se abate sobre nós, agora no Rio de Janeiro. Mais uma vez fruto da irresponsabilidade pública, desta vez chegando ao paroxismo da crueldade em Niterói.
No artigo do início do ano pensava que o título “Crimes sob as chuvas” fosse forte o suficiente para expressar com correção a origem daquelas tragédias, sempre eufemisticamente atribuídas a São Pedro e a excessos da natureza, mas que na verdade são crimes públicos por negligência na aplicação da legislação urbanística e ambiental, e/ou na observância de recomendações técnicas competentes. No mínimo! Emocionado como a maioria dos brasileiros, iniciei o artigo de hoje pensando que a palavra crime não seria mais suficiente, seria pouco, para expressar o que ocorreu sob as chuvas de Niterói. O que pensar de um prefeito que acompanha e deixa, desde sua primeira gestão em 1989, o povo ocupar a área de um lixão da própria prefeitura, desativado apenas três anos antes? Como não lembrar dos cruéis comboios nazistas de judeus? O que pensar de um cidadão que exerce pela terceira vez a prefeitura de uma cidade - terceira vez! - e que após a tragédia vem a público dizer que “não tinha conhecimento desse risco todo”? E Niterói é uma cidade desenvolvida, de muitos recursos técnicos.
O drama do Morro do Bumba supera todas as outras dessas tragédias urbanas pois se deu em uma área cujos altos riscos de sua declividade natural foram consideravelmente ampliados pela própria prefeitura com a instalação indevida e tecnicamente incorreta de um lixão no local e depois pela omissão criminosa quando de sua ocupação. Não há como a prefeitura desconhecer; nem o prefeito, administrador da cidade por tanto tempo. Não se pode edificar em antigos lixões horizontais, e muito menos em um com aquele absurdo declive, não só pela geotécnica, mas por problemas como gases tóxicos e inflamáveis, chorume, doenças, etc.. Um crime consciente, gestado por décadas, a céu aberto.
Quando o Brasil terá administradores públicos realmente governantes, só com a preocupação de governar o bem comum? Quando o Brasil se livrará dos maus políticos que fazem do poder público um meio de vida, mais preocupados com a próxima eleição e com a ampliação de seu poder e de sua estrutura político-eleitoral? Pouco somam se o povo está acima ou abaixo do lixo. De que interessam as tragédias anunciadas se elas podem ocorrer depois das eleições e até lá render alguns votos? E se, por azar, ocorrer durante o mandato, decreta-se luto oficial e nada mudará enquanto os processos não transitarem em julgado. Sob a irônica alegação de que “as pessoas têm a necessidade de encontrar culpados” o prefeito de Niterói fez mais um “sacrifício” pelo seu povo e assumiu a culpa, como se pudesse escapar dela.
Esta tragédia absurda aconteceu em Niterói, uma das mais importantes cidades brasileiras, na região mais desenvolvida do país. Mostra a urgência do Brasil mudar o jeito de conduzir suas cidades. E parece que a hora chegou pois após esta tragédia criminosa, alguns discursos poderosos ficaram diferentes dos repetidos a cada ano, e me acenderam um lusco-fusco de esperança. Mas isso só em outro artigo.
(Publicada em 13/04/2010)
Como infelizmente tenho feito nas últimas viradas de ano, no começo deste escrevi um artigo sobre mais uma dolorosa edição das tragédias urbanas brasileiras das estações chuvosas, achando que a cota anual desse tipo de desgraça havia terminado, e que só restava nos preparar resignados para as novas tragédias da próxima virada de ano. Qual o que! O Brasil sempre nos surpreende, para o bem ou para o mal. Nem bem iniciado o Outono, nova tragédia se abate sobre nós, agora no Rio de Janeiro. Mais uma vez fruto da irresponsabilidade pública, desta vez chegando ao paroxismo da crueldade em Niterói.
No artigo do início do ano pensava que o título “Crimes sob as chuvas” fosse forte o suficiente para expressar com correção a origem daquelas tragédias, sempre eufemisticamente atribuídas a São Pedro e a excessos da natureza, mas que na verdade são crimes públicos por negligência na aplicação da legislação urbanística e ambiental, e/ou na observância de recomendações técnicas competentes. No mínimo! Emocionado como a maioria dos brasileiros, iniciei o artigo de hoje pensando que a palavra crime não seria mais suficiente, seria pouco, para expressar o que ocorreu sob as chuvas de Niterói. O que pensar de um prefeito que acompanha e deixa, desde sua primeira gestão em 1989, o povo ocupar a área de um lixão da própria prefeitura, desativado apenas três anos antes? Como não lembrar dos cruéis comboios nazistas de judeus? O que pensar de um cidadão que exerce pela terceira vez a prefeitura de uma cidade - terceira vez! - e que após a tragédia vem a público dizer que “não tinha conhecimento desse risco todo”? E Niterói é uma cidade desenvolvida, de muitos recursos técnicos.
O drama do Morro do Bumba supera todas as outras dessas tragédias urbanas pois se deu em uma área cujos altos riscos de sua declividade natural foram consideravelmente ampliados pela própria prefeitura com a instalação indevida e tecnicamente incorreta de um lixão no local e depois pela omissão criminosa quando de sua ocupação. Não há como a prefeitura desconhecer; nem o prefeito, administrador da cidade por tanto tempo. Não se pode edificar em antigos lixões horizontais, e muito menos em um com aquele absurdo declive, não só pela geotécnica, mas por problemas como gases tóxicos e inflamáveis, chorume, doenças, etc.. Um crime consciente, gestado por décadas, a céu aberto.
Quando o Brasil terá administradores públicos realmente governantes, só com a preocupação de governar o bem comum? Quando o Brasil se livrará dos maus políticos que fazem do poder público um meio de vida, mais preocupados com a próxima eleição e com a ampliação de seu poder e de sua estrutura político-eleitoral? Pouco somam se o povo está acima ou abaixo do lixo. De que interessam as tragédias anunciadas se elas podem ocorrer depois das eleições e até lá render alguns votos? E se, por azar, ocorrer durante o mandato, decreta-se luto oficial e nada mudará enquanto os processos não transitarem em julgado. Sob a irônica alegação de que “as pessoas têm a necessidade de encontrar culpados” o prefeito de Niterói fez mais um “sacrifício” pelo seu povo e assumiu a culpa, como se pudesse escapar dela.
Esta tragédia absurda aconteceu em Niterói, uma das mais importantes cidades brasileiras, na região mais desenvolvida do país. Mostra a urgência do Brasil mudar o jeito de conduzir suas cidades. E parece que a hora chegou pois após esta tragédia criminosa, alguns discursos poderosos ficaram diferentes dos repetidos a cada ano, e me acenderam um lusco-fusco de esperança. Mas isso só em outro artigo.
(Publicada em 13/04/2010)
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terça-feira, 6 de abril de 2010
CUIABÁ 300-9
José Antonio Lemos dos Santos
Em um local com grandes pedras claras onde se pescava com flecha-arpão, por isso chamado Ikuiapá, onde um corguinho encontrava um belo rio, o ouro fez surgir - corgo acima - uma cidade que floresceu bonita e se chamou Cuiabá. O pequeno córrego tinha tanto ouro que era chamado Ikuiebo, córrego das estrelas, tantas as pepitas cintilando à luz do sol e da lua aos olhos bororos nativos. Cuiabá, a celula-mater das cidades e estados que enriquecem o oeste brasileiro, completa 291 anos e caminha acelerada para o seu tricentenário.
Certamente a cidade receberá muitas homenagens no próximo dia 8 de abril, em especial sendo um ano eleitoral. Para mim, porém, presente algum superará ao recebido na semana passada: falo da desocupação da área da antiga foz do Prainha, sobre a qual já viajei tantos projetos, inclusive em artigos. A cidade ao menos por um tempo pode rever livre aquele espaço que originalmente era ocupado pelo corguinho - que já foi piscoso, depois transformado em denso e fétido esgoto, coberto com terra, como fazem os gatos – e ultimamente ocupado por edificações precárias. A cidade se depara com um espaço aberto, a paisagem urbana desobstruída, o ar, o sol e a ventilação plenos, tão importantes nas elevadas temperaturas cuiabanas. A cidade redescobre surpresa que o espaço urbano é composto de edificações e de vazios, assim como uma sinfonia se compõe de sons e silêncios harmoniosamente combinados, e se pergunta em contida alegria: por que não antes?
E o lugar ficou bonito, talvez pelo contraste com o que era. Até o Atacadão ficou bonito, visto por quem vem da Beira-Rio. Pena ser por pouco tempo, já que essa área foi vendida pela prefeitura em data e valores não noticiados, sendo desconhecido inclusive se o valor foi suficiente para cobrir as despesas públicas de canalização e aterro da área. A esperança é que o Ministério Público, que já interviu na venda da travessa Tuffik Affi, volte seus olhos para essa área contígua, possibilitando que a cidade recupere aquele espaço que um dia foi seu, permitindo-lhe um acesso urbano digno e a correta interseção de duas de suas principais avenidas que passam pelo local. Há também um novo prefeito, uma boa novidade no cenário político, que por certo avaliará o ônus de assumir e implantar um erro urbanístico que não foi seu.
Em seus quase três séculos, Cuiabá firmou-se como o pólo de apoio a tudo o que aconteceu neste “ocidente do imenso Brasil”. No exato centro geodésico continental, virou o encontro de todos os caminhos regionais. Assim subsistiu e prosperou, e como autêntico coração mato-grossense bombeou o desenvolvimento a todos os rincões de Mato Grosso, hoje o exemplo de maior sucesso entre os estados da federação. Cuiabá não é mais o centro de um vazio. Ao contrário, polariza uma das regiões mais dinâmicas do planeta, que ajudou a construir e que hoje não apenas lhe cobra o apoio, mas também a impulsiona para cima, em um sadio e maduro processo de simbiose regional ascendente.
A nove anos de seu tricentenário, Cuiabá vive um salto qualitativo iniciado com o novo século, fruto da nova dinâmica regional. Ainda conquistou a propulsão da Copa do Pantanal. Fazer este salto acontecer é a responsabilidade da atual geração de cuiabanos, sua cidadania, autoridades e lideranças, construindo positivamente o futuro, mas também reagindo contra oportunistas previsíveis e manobras geopolíticas dissimuladas adversas. A disposição para uma ação conjunta buscando com que os benefícios do novo tempo se materializem na cidade e na qualidade de vida em todo Mato Grosso, esta seria o maior presente a ser dado a Cuiabá no seu 291º aniversário e em cada um dos anos que faltam na construção da grande festa do tricentenário.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 06/04/2010)
Em um local com grandes pedras claras onde se pescava com flecha-arpão, por isso chamado Ikuiapá, onde um corguinho encontrava um belo rio, o ouro fez surgir - corgo acima - uma cidade que floresceu bonita e se chamou Cuiabá. O pequeno córrego tinha tanto ouro que era chamado Ikuiebo, córrego das estrelas, tantas as pepitas cintilando à luz do sol e da lua aos olhos bororos nativos. Cuiabá, a celula-mater das cidades e estados que enriquecem o oeste brasileiro, completa 291 anos e caminha acelerada para o seu tricentenário.
Certamente a cidade receberá muitas homenagens no próximo dia 8 de abril, em especial sendo um ano eleitoral. Para mim, porém, presente algum superará ao recebido na semana passada: falo da desocupação da área da antiga foz do Prainha, sobre a qual já viajei tantos projetos, inclusive em artigos. A cidade ao menos por um tempo pode rever livre aquele espaço que originalmente era ocupado pelo corguinho - que já foi piscoso, depois transformado em denso e fétido esgoto, coberto com terra, como fazem os gatos – e ultimamente ocupado por edificações precárias. A cidade se depara com um espaço aberto, a paisagem urbana desobstruída, o ar, o sol e a ventilação plenos, tão importantes nas elevadas temperaturas cuiabanas. A cidade redescobre surpresa que o espaço urbano é composto de edificações e de vazios, assim como uma sinfonia se compõe de sons e silêncios harmoniosamente combinados, e se pergunta em contida alegria: por que não antes?
E o lugar ficou bonito, talvez pelo contraste com o que era. Até o Atacadão ficou bonito, visto por quem vem da Beira-Rio. Pena ser por pouco tempo, já que essa área foi vendida pela prefeitura em data e valores não noticiados, sendo desconhecido inclusive se o valor foi suficiente para cobrir as despesas públicas de canalização e aterro da área. A esperança é que o Ministério Público, que já interviu na venda da travessa Tuffik Affi, volte seus olhos para essa área contígua, possibilitando que a cidade recupere aquele espaço que um dia foi seu, permitindo-lhe um acesso urbano digno e a correta interseção de duas de suas principais avenidas que passam pelo local. Há também um novo prefeito, uma boa novidade no cenário político, que por certo avaliará o ônus de assumir e implantar um erro urbanístico que não foi seu.
Em seus quase três séculos, Cuiabá firmou-se como o pólo de apoio a tudo o que aconteceu neste “ocidente do imenso Brasil”. No exato centro geodésico continental, virou o encontro de todos os caminhos regionais. Assim subsistiu e prosperou, e como autêntico coração mato-grossense bombeou o desenvolvimento a todos os rincões de Mato Grosso, hoje o exemplo de maior sucesso entre os estados da federação. Cuiabá não é mais o centro de um vazio. Ao contrário, polariza uma das regiões mais dinâmicas do planeta, que ajudou a construir e que hoje não apenas lhe cobra o apoio, mas também a impulsiona para cima, em um sadio e maduro processo de simbiose regional ascendente.
A nove anos de seu tricentenário, Cuiabá vive um salto qualitativo iniciado com o novo século, fruto da nova dinâmica regional. Ainda conquistou a propulsão da Copa do Pantanal. Fazer este salto acontecer é a responsabilidade da atual geração de cuiabanos, sua cidadania, autoridades e lideranças, construindo positivamente o futuro, mas também reagindo contra oportunistas previsíveis e manobras geopolíticas dissimuladas adversas. A disposição para uma ação conjunta buscando com que os benefícios do novo tempo se materializem na cidade e na qualidade de vida em todo Mato Grosso, esta seria o maior presente a ser dado a Cuiabá no seu 291º aniversário e em cada um dos anos que faltam na construção da grande festa do tricentenário.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 06/04/2010)
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terça-feira, 30 de março de 2010
FERRONORTE, PAC 2 E EIA/RIMA
José Antonio Lemos dos Santos
Neste mês de março fez 10 anos da realização da única audiência pública para licenciamento ambiental sobre a Ferronorte, na qual foi apreciado o traçado até Cuiabá proposto pela empresa, aprovado anteriormente pelo Ministério dos Transportes. Até então a ligação ferroviária de Cuiabá era considerada viabilíssima tanto pelo Ministério como pela Ferronorte. Estive presente e nela esteve também o senador Vuolo, o “pai da ferrovia”. O traçado proposto foi aceito até Mineirinho, na BR-163, cerca de 60 Km ao sul de Rondonópolis. O restante do trecho até Cuiabá não foi aprovado pelo IBAMA, que acatou parecer da FUNAI, desfavorável pelos impactos que traria à reserva indígena Teresa Cristina, mesmo passando 700 metros fora, repito, fora da reserva. Portanto, a uma distância ainda maior da aldeia.
Talvez em homenagem aos 10 anos da audiência pública e aos enormes prejuízos econômicos, ambientais e em vidas humanas causados pela falta que a ferrovia fez e faz a Mato Grosso, na semana passada o IBAMA liberou Licença de Instalação (LI) para cerca de 165 quilômetros entre Alto Araguaia e Rondonópolis, de um total de 215 quilômetros. Imagino que essa Licença seja suficiente para a ferrovia chegar a Mineirinho, até onde foi concedida a Licença Prévia há 10 anos. Alvíssaras! Aliás, em maio próximo a concessão federal à Ferronorte completa 21 anos, assistindo invejosa a rapidez com que é tratada a “ferroleste”, já inclusa no Plano Nacional de Viação e no PAC para execução imediata, ainda que sem projeto, sem qualquer apreciação ambiental, mesmo tendo pela frente nada mais nada menos que o Parque Nacional do Xingu e o Araguaia em um de seus pontos mais sensíveis.
Uma vez em Mineirinho, é urgente que a Ferronorte se aproxime de Rondonópolis e venha para Cuiabá, cumprindo a primeira etapa da concessão. Para tal há que se realizar novos estudos e audiência pública para avaliação dos impactos ambientais das adequações necessárias no traçado original. A chegada dos trilhos a Rondonópolis depende tanto desses estudos quanto a chegada a Cuiabá, pois só foi concedida a LI até Mineirinho. Muito bem conduzido pelo vereador Francisco Vuolo, o Fórum Pró-Ferrovia reivindica há tempos esses estudos e audiências, que são prioritários e devem ser feitos no seu total, isto é, de Mineirinho até Cuiabá, destino da primeira etapa da ferrovia. Sem eles os trilhos não podem avançar além de Mineirinho.
As primeiras notícias da tarde de ontem, davam conta da inclusão do trecho até Cuiabá no PAC 2, conforme a ministra Dilma havia prometido na sua recente visita à capital mato-grossense. Como promessa de campanha talvez não valha muito. Vale entretanto como reinclusão do projeto da Ferronorte até Cuiabá no discurso oficial do governo federal, de onde havia desaparecido há alguns anos. Mais do que nunca é hora de consolidá-lo cobrando a execução do EIA/RIMA, no seu trajeto total, Mineirinho-Rondonópolis-Cuiabá.
O traçado original da Ferronorte, como está na concessão federal, consolidará a espinha dorsal do estado – a BR-163 – atendendo diretamente cidades como Sinop, Lucas, Sorriso, Nova Mutum, Nobres, até Santarém, carentes da ferrovia tanto quanto Cuiabá e Várzea Grande. Sua bifurcação para Rondônia, e daí ao Pacífico, pode ser por Lucas e Sapezal, ou por Tangará e Barra do Bugres ou ainda por Diamantino. Permite chegar ao porto de Cáceres e acessar o Pacífico via Bolívia. Se confirmada, que a inclusão no PAC da Ferronorte até Cuiabá não seja apenas um agrado de campanha ao maior reduto eleitoral do estado, mas sim, de fato, um compromisso com a execução imediata da melhor alternativa ferroviária para todas as regiões de Mato Grosso.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 30/03/2010)
Neste mês de março fez 10 anos da realização da única audiência pública para licenciamento ambiental sobre a Ferronorte, na qual foi apreciado o traçado até Cuiabá proposto pela empresa, aprovado anteriormente pelo Ministério dos Transportes. Até então a ligação ferroviária de Cuiabá era considerada viabilíssima tanto pelo Ministério como pela Ferronorte. Estive presente e nela esteve também o senador Vuolo, o “pai da ferrovia”. O traçado proposto foi aceito até Mineirinho, na BR-163, cerca de 60 Km ao sul de Rondonópolis. O restante do trecho até Cuiabá não foi aprovado pelo IBAMA, que acatou parecer da FUNAI, desfavorável pelos impactos que traria à reserva indígena Teresa Cristina, mesmo passando 700 metros fora, repito, fora da reserva. Portanto, a uma distância ainda maior da aldeia.
Talvez em homenagem aos 10 anos da audiência pública e aos enormes prejuízos econômicos, ambientais e em vidas humanas causados pela falta que a ferrovia fez e faz a Mato Grosso, na semana passada o IBAMA liberou Licença de Instalação (LI) para cerca de 165 quilômetros entre Alto Araguaia e Rondonópolis, de um total de 215 quilômetros. Imagino que essa Licença seja suficiente para a ferrovia chegar a Mineirinho, até onde foi concedida a Licença Prévia há 10 anos. Alvíssaras! Aliás, em maio próximo a concessão federal à Ferronorte completa 21 anos, assistindo invejosa a rapidez com que é tratada a “ferroleste”, já inclusa no Plano Nacional de Viação e no PAC para execução imediata, ainda que sem projeto, sem qualquer apreciação ambiental, mesmo tendo pela frente nada mais nada menos que o Parque Nacional do Xingu e o Araguaia em um de seus pontos mais sensíveis.
Uma vez em Mineirinho, é urgente que a Ferronorte se aproxime de Rondonópolis e venha para Cuiabá, cumprindo a primeira etapa da concessão. Para tal há que se realizar novos estudos e audiência pública para avaliação dos impactos ambientais das adequações necessárias no traçado original. A chegada dos trilhos a Rondonópolis depende tanto desses estudos quanto a chegada a Cuiabá, pois só foi concedida a LI até Mineirinho. Muito bem conduzido pelo vereador Francisco Vuolo, o Fórum Pró-Ferrovia reivindica há tempos esses estudos e audiências, que são prioritários e devem ser feitos no seu total, isto é, de Mineirinho até Cuiabá, destino da primeira etapa da ferrovia. Sem eles os trilhos não podem avançar além de Mineirinho.
As primeiras notícias da tarde de ontem, davam conta da inclusão do trecho até Cuiabá no PAC 2, conforme a ministra Dilma havia prometido na sua recente visita à capital mato-grossense. Como promessa de campanha talvez não valha muito. Vale entretanto como reinclusão do projeto da Ferronorte até Cuiabá no discurso oficial do governo federal, de onde havia desaparecido há alguns anos. Mais do que nunca é hora de consolidá-lo cobrando a execução do EIA/RIMA, no seu trajeto total, Mineirinho-Rondonópolis-Cuiabá.
O traçado original da Ferronorte, como está na concessão federal, consolidará a espinha dorsal do estado – a BR-163 – atendendo diretamente cidades como Sinop, Lucas, Sorriso, Nova Mutum, Nobres, até Santarém, carentes da ferrovia tanto quanto Cuiabá e Várzea Grande. Sua bifurcação para Rondônia, e daí ao Pacífico, pode ser por Lucas e Sapezal, ou por Tangará e Barra do Bugres ou ainda por Diamantino. Permite chegar ao porto de Cáceres e acessar o Pacífico via Bolívia. Se confirmada, que a inclusão no PAC da Ferronorte até Cuiabá não seja apenas um agrado de campanha ao maior reduto eleitoral do estado, mas sim, de fato, um compromisso com a execução imediata da melhor alternativa ferroviária para todas as regiões de Mato Grosso.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 30/03/2010)
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terça-feira, 23 de março de 2010
FERRONORTE PARA MATO GROSSO
José Antonio Lemos dos Santos
Pela sua forma simpática de se expressar, reproduzo um dos comentários referentes ao artigo “Ferronorte já!”, republicado no site EXPRESSOMT, de Lucas do Rio Verde. Diz o prezado leitor e conterrâneo, que se identifica apenas como Curupira: “Se o professor tem ou não razão isso não importa em nada. Na minha opinião, sem dúvida nenhuma, 560km entre Lucas e Rondonópolis é bem mais perto que 1004 km. Num primeiro momento é bem mais interessante a conclusão da ferronorte. Porém, temos algumas colocações. Onde nosso governador tem terras??? Em Itiquira? Lá já tem ferrovia. Em Cuiabá? Claro que não. Em Sapezal? Lógico. Na região de Água Boa? Sim. Na região da Baixada Cuiabana? NNããõoo. Então, meu cumpadi professor, cchhhhhhhhooooorrrrrrraaaaa. Por que se a ferrovia ligando Goiás a Rondônia não sair em 10 anos a ferronorte até Cuiabá não sai nem em 20 anos. É fácil né.”
Mesmo sendo uma versão bastante ouvida, entendo que a questão da ferrovia em Mato Grosso vai muito além dela, até porque o governador tem terras e interesses em todo o estado. Esta questão envolve a construção ou não de um novo modelo geopolítico para o desenvolvimento do estado. Esta encruzilhada ficou clara agora com o lançamento da “ferroleste” e da pavimentação da BR-242 até a MT-130, fazendo a ligação rodoviária de Lucas direto a Rondonópolis. Combinadas com a idéia de desviar de Cuiabá o traçado da Ferronorte, seguindo de Rondonópolis para Lucas, temos o futuro geopolítico que alguns grupos pretendem para Mato Grosso, com a região platina mato-grossense marginalizada do processo de desenvolvimento que ajudou a construir. Cuiabá viraria a Ouro Preto do agronegócio e o estado seria polarizado por Lucas do Rio Verde, que desbanca regionalmente Sorriso e Sinop, esta já tão maltratada pelas políticas oficiais recentes.
Esse projeto ficou sendo o principal objetivo do DNIT para Mato Grosso, muito bem camuflado até agora, em demonstração de extrema competência. A mesma competência que não apareceu para fazer andar a Ferronorte, ou para a duplicação rodoviária de Rondonópolis a Posto Gil, nem para a melhoria das demais BRs no estado. Esse quadro ajuda a explicar o descaso oficial pelo corte do gás boliviano para Cuiabá, o descaso pela paralisação da termelétrica e das obras do aeroporto em Várzea Grande, o pouco caso pelo Porto Seco, pela ecovia do Paraguai, pela Base Aérea de Cáceres, etc..
Sendo uma transversal, a “ferroleste” só toca a Br-163 em um ponto, Lucas, daí seguindo para Sapezal e Vilhena, deixando fora de seu traçado cidades como Sinop, Sorriso, Nova Mutum e Nobres que tanto quanto Cuiabá e Várzea Grande, também necessitam e aguardam para ontem a ferrovia. Já o traçado original da Ferronorte, que consta da concessão federal, passando por Cuiabá – a maior concentração de cargas do estado - consolidará a espinha dorsal do estado – a BR-163 - seguindo a partir dela para Santarém e Porto Velho, e daí até ao Pacífico. Sua bifurcação para Rondônia pode ser por Lucas e Sapezal, ou por Tangará e Barra do Bugres ou ainda por Diamantino. Permite também um ramal integrando o porto de Cáceres, com outro acesso ao Pacífico, via Bolívia. Importante é que a Ferronorte não exclui a “ferroleste”, enquanto que esta inviabiliza a Ferronorte, ao seqüestrar a carga de Mato Grosso para Goiás. A Ferronorte foi concebida para atender todo o estado, em todas as suas regiões e segmentos produtivos, não só para levar, mas também para trazer o desenvolvimento. Preserva a integridade territorial de Mato Grosso, razão principal de seu sucesso. As eleições deste ano definem qual destes dois modelos queremos. E nosso instrumento de escolha é o voto.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 23/03/2010)
Pela sua forma simpática de se expressar, reproduzo um dos comentários referentes ao artigo “Ferronorte já!”, republicado no site EXPRESSOMT, de Lucas do Rio Verde. Diz o prezado leitor e conterrâneo, que se identifica apenas como Curupira: “Se o professor tem ou não razão isso não importa em nada. Na minha opinião, sem dúvida nenhuma, 560km entre Lucas e Rondonópolis é bem mais perto que 1004 km. Num primeiro momento é bem mais interessante a conclusão da ferronorte. Porém, temos algumas colocações. Onde nosso governador tem terras??? Em Itiquira? Lá já tem ferrovia. Em Cuiabá? Claro que não. Em Sapezal? Lógico. Na região de Água Boa? Sim. Na região da Baixada Cuiabana? NNããõoo. Então, meu cumpadi professor, cchhhhhhhhooooorrrrrrraaaaa. Por que se a ferrovia ligando Goiás a Rondônia não sair em 10 anos a ferronorte até Cuiabá não sai nem em 20 anos. É fácil né.”
Mesmo sendo uma versão bastante ouvida, entendo que a questão da ferrovia em Mato Grosso vai muito além dela, até porque o governador tem terras e interesses em todo o estado. Esta questão envolve a construção ou não de um novo modelo geopolítico para o desenvolvimento do estado. Esta encruzilhada ficou clara agora com o lançamento da “ferroleste” e da pavimentação da BR-242 até a MT-130, fazendo a ligação rodoviária de Lucas direto a Rondonópolis. Combinadas com a idéia de desviar de Cuiabá o traçado da Ferronorte, seguindo de Rondonópolis para Lucas, temos o futuro geopolítico que alguns grupos pretendem para Mato Grosso, com a região platina mato-grossense marginalizada do processo de desenvolvimento que ajudou a construir. Cuiabá viraria a Ouro Preto do agronegócio e o estado seria polarizado por Lucas do Rio Verde, que desbanca regionalmente Sorriso e Sinop, esta já tão maltratada pelas políticas oficiais recentes.
Esse projeto ficou sendo o principal objetivo do DNIT para Mato Grosso, muito bem camuflado até agora, em demonstração de extrema competência. A mesma competência que não apareceu para fazer andar a Ferronorte, ou para a duplicação rodoviária de Rondonópolis a Posto Gil, nem para a melhoria das demais BRs no estado. Esse quadro ajuda a explicar o descaso oficial pelo corte do gás boliviano para Cuiabá, o descaso pela paralisação da termelétrica e das obras do aeroporto em Várzea Grande, o pouco caso pelo Porto Seco, pela ecovia do Paraguai, pela Base Aérea de Cáceres, etc..
Sendo uma transversal, a “ferroleste” só toca a Br-163 em um ponto, Lucas, daí seguindo para Sapezal e Vilhena, deixando fora de seu traçado cidades como Sinop, Sorriso, Nova Mutum e Nobres que tanto quanto Cuiabá e Várzea Grande, também necessitam e aguardam para ontem a ferrovia. Já o traçado original da Ferronorte, que consta da concessão federal, passando por Cuiabá – a maior concentração de cargas do estado - consolidará a espinha dorsal do estado – a BR-163 - seguindo a partir dela para Santarém e Porto Velho, e daí até ao Pacífico. Sua bifurcação para Rondônia pode ser por Lucas e Sapezal, ou por Tangará e Barra do Bugres ou ainda por Diamantino. Permite também um ramal integrando o porto de Cáceres, com outro acesso ao Pacífico, via Bolívia. Importante é que a Ferronorte não exclui a “ferroleste”, enquanto que esta inviabiliza a Ferronorte, ao seqüestrar a carga de Mato Grosso para Goiás. A Ferronorte foi concebida para atender todo o estado, em todas as suas regiões e segmentos produtivos, não só para levar, mas também para trazer o desenvolvimento. Preserva a integridade territorial de Mato Grosso, razão principal de seu sucesso. As eleições deste ano definem qual destes dois modelos queremos. E nosso instrumento de escolha é o voto.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 23/03/2010)
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terça-feira, 16 de março de 2010
MINISTRA PARABÉNS!
José Antonio Lemos dos Santos
Parabéns ministra Dilma! Vossa Excelência parece ter percebido a tempo que uma obra tão importante para Mato Grosso – para o bem ou para o mal - como a recém concebida ferrovia ligando Goiás a Rondônia, passando por Lucas do Rio Verde e Sapezal, deveria ter sido ao menos anunciada na capital do estado durante a visita que fez outro dia a Cuiabá. Seria uma consideração mínima a um estado que nas últimas décadas vem despontando como campeão brasileiro em produção, e à sua capital. Vossa Excelência parece ter percebido a tempo que sua candidatura não pode ser rebocada por grupos que acham que seus interesses precedem aos interesses do estado.
Mato Grosso não suporta mais os altos custos impostos pela sua atual logística de transportes. Nem pode mais esperar por esta criminosa ciranda em que transformaram seu principal projeto ferroviário. A ferrovia é urgente, para ontem, ou mais precisamente, para uns 20 anos atrás. Os trilhos precisam chegar já a Lucas, Nova Mutum, Tapurah, Sorriso, Sinop, e delas a Santarém, Vilhena e ao Pacífico, passando, porém, por Rondonópolis e Cuiabá não só para escoar a produção mato-grossense, mas também para trazer mercadorias e insumos diversos, materiais de construção, combustíveis, etc., reduzindo os custos econômicos e ambientais de nossos produtos, e poupando as vidas cotidianamente ceifadas por uma malha rodoviária defasada e assassina. Lucas do Rio Verde está a cerca de 350 quilometros de Cuiabá, que por sua vez está a uns 210 quilômetros de Rondonópolis, onde os trilhos já estão chegando pelo próprio PAC, na concessão da Ferronorte. Porque então trocar esta alternativa real por outra com mais mil quilômetros, que deve ainda equacionar impactos no Parque do Xingu e cruzar o Araguaia em um de seus pontos mais sensíveis ambientalmente? Aliás, tempos atrás surgiu também um novo trajeto entre Cuiabá e Rondonópolis, com o dobro da distância, sob o pretexto de “viabilizar” a chegada da ferrovia a Cuiabá. Semana passada, em duro discurso no Senado sobre o assunto, o senador Jayme Campos perguntou se tem gente que pensa que o mato-grossense é idiota.
Cuiabá e Várzea Grande juntas, queiram ou não, formam o maior pólo concentrador de cargas do estado. Passa por elas toda a carga produzida a oeste da área de influência da BR-163 destinada ao sudeste brasileiro, seja para exportação via seus portos ou para consumo interno, e que não se resume à soja. E seguirá passando a não ser que se perprete este verdadeiro seqüestro de cargas de Mato Grosso para Goiás com a construção antecipada da ligação de Lucas a Uruaçu.
Evidente que é importante a Leste-Oeste, desde que após a implantação do traçado já concedido à Ferronorte, que além de execução mais rápida, consolidará a espinha dorsal de Mato Grosso, marcada pelo eixo da Br-163. A construção precipitada de uma ferrovia transversal, partirá Mato Grosso ao meio, criando duas economias, a nova centrada em Goiás, ambas fracas, voltando à rabeira da economia nacional, sem voz e sem vez. Um campeão nacional não merece ser apunhalado.
Que bom se em breve a ministra remarcar sua visita a Mato Grosso, desta vez para trazer a inclusão no PAC dos trechos da Ferronorte entre Rondonópolis e Cuiabá e de Cuiabá até Lucas, ou mesmo até Sorriso ou Sinop, em seu total muito mais rápido, mais barato e melhor para Mato Grosso do que essa ferrovia para Goiás. Aí sim uma ferrovia para todo Mato Grosso, integrando o estado sem deixar nenhuma região excluída. E que outros presidenciáveis façam o mesmo. E que prossigam os estudos da Leste-Oeste e de outros projetos realmente importantes para Mato Grosso. Aos mato-grossenses resta o voto.
(Publicado em 16/03/2010)
Parabéns ministra Dilma! Vossa Excelência parece ter percebido a tempo que uma obra tão importante para Mato Grosso – para o bem ou para o mal - como a recém concebida ferrovia ligando Goiás a Rondônia, passando por Lucas do Rio Verde e Sapezal, deveria ter sido ao menos anunciada na capital do estado durante a visita que fez outro dia a Cuiabá. Seria uma consideração mínima a um estado que nas últimas décadas vem despontando como campeão brasileiro em produção, e à sua capital. Vossa Excelência parece ter percebido a tempo que sua candidatura não pode ser rebocada por grupos que acham que seus interesses precedem aos interesses do estado.
Mato Grosso não suporta mais os altos custos impostos pela sua atual logística de transportes. Nem pode mais esperar por esta criminosa ciranda em que transformaram seu principal projeto ferroviário. A ferrovia é urgente, para ontem, ou mais precisamente, para uns 20 anos atrás. Os trilhos precisam chegar já a Lucas, Nova Mutum, Tapurah, Sorriso, Sinop, e delas a Santarém, Vilhena e ao Pacífico, passando, porém, por Rondonópolis e Cuiabá não só para escoar a produção mato-grossense, mas também para trazer mercadorias e insumos diversos, materiais de construção, combustíveis, etc., reduzindo os custos econômicos e ambientais de nossos produtos, e poupando as vidas cotidianamente ceifadas por uma malha rodoviária defasada e assassina. Lucas do Rio Verde está a cerca de 350 quilometros de Cuiabá, que por sua vez está a uns 210 quilômetros de Rondonópolis, onde os trilhos já estão chegando pelo próprio PAC, na concessão da Ferronorte. Porque então trocar esta alternativa real por outra com mais mil quilômetros, que deve ainda equacionar impactos no Parque do Xingu e cruzar o Araguaia em um de seus pontos mais sensíveis ambientalmente? Aliás, tempos atrás surgiu também um novo trajeto entre Cuiabá e Rondonópolis, com o dobro da distância, sob o pretexto de “viabilizar” a chegada da ferrovia a Cuiabá. Semana passada, em duro discurso no Senado sobre o assunto, o senador Jayme Campos perguntou se tem gente que pensa que o mato-grossense é idiota.
Cuiabá e Várzea Grande juntas, queiram ou não, formam o maior pólo concentrador de cargas do estado. Passa por elas toda a carga produzida a oeste da área de influência da BR-163 destinada ao sudeste brasileiro, seja para exportação via seus portos ou para consumo interno, e que não se resume à soja. E seguirá passando a não ser que se perprete este verdadeiro seqüestro de cargas de Mato Grosso para Goiás com a construção antecipada da ligação de Lucas a Uruaçu.
Evidente que é importante a Leste-Oeste, desde que após a implantação do traçado já concedido à Ferronorte, que além de execução mais rápida, consolidará a espinha dorsal de Mato Grosso, marcada pelo eixo da Br-163. A construção precipitada de uma ferrovia transversal, partirá Mato Grosso ao meio, criando duas economias, a nova centrada em Goiás, ambas fracas, voltando à rabeira da economia nacional, sem voz e sem vez. Um campeão nacional não merece ser apunhalado.
Que bom se em breve a ministra remarcar sua visita a Mato Grosso, desta vez para trazer a inclusão no PAC dos trechos da Ferronorte entre Rondonópolis e Cuiabá e de Cuiabá até Lucas, ou mesmo até Sorriso ou Sinop, em seu total muito mais rápido, mais barato e melhor para Mato Grosso do que essa ferrovia para Goiás. Aí sim uma ferrovia para todo Mato Grosso, integrando o estado sem deixar nenhuma região excluída. E que outros presidenciáveis façam o mesmo. E que prossigam os estudos da Leste-Oeste e de outros projetos realmente importantes para Mato Grosso. Aos mato-grossenses resta o voto.
(Publicado em 16/03/2010)
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terça-feira, 9 de março de 2010
O SENHOR DAS ÁGUAS
José Antonio Lemos dos Santos
Penso que a melhor maneira de homenagear nas poucas linhas de um artigo uma figura tão rica como Domingos Iglesias Valério, seria relembrar uma de suas muitas lições. Nunca fui seu aluno, mas sempre o tive como um mestre no desenvolvimento de Cuiabá e Mato Grosso, jamais se omitindo mesmo sob o risco da polêmica, como homem que entendia que o conhecimento só tem sentido se compartilhado, como demonstrou ao longo da vida, sempre em prol da gente e da terra que adotou com tanto fervor. A socialização do conhecimento em todas as suas dimensões, não apenas o técnico, o compartilhamento, bem pode ter sido sua principal lição. Mas, nesta pequena homenagem, destaco no campo do urbanismo uma das lições de maior utilidade em minhas funções públicas, e que me parece da maior importância não só para Cuiabá, mas para todas as cidades do Brasil, das vilas às metrópoles.
Nos bancos escolares uma coisa é você ter recebido aula de uma determinada matéria e tê-la em seu currículo. Outra coisa é você entender de fato o que foi aprendido oficialmente. Foi com o “professor Iglesias” - como carinhosamente conhecido - que entendi na prática o conceito das áreas de risco inundáveis, que ele chamava de “império das águas”. Quando colocadas nas lições escolares ou nas letras frias das tantas leis que tratam do assunto no Brasil, as áreas de risco, notadamente às ligadas às águas, parecem perder muito da sua periculosidade, de sua potencialidade de dano, problema só percebido por ocasião das tragédias. Com a expressão “império das águas” o professor, falecido no sábado, ensinou que as áreas inundáveis são os espaços naturais das águas, indispensáveis à sua existência, pois, continuando em sua lição, os corpos d’água respiram como seres vivos que são, como se inspirassem nas cheias e expirassem nas vazantes.
Até aqui, uma forma bonita de se falar sobre as águas. Esta lição, porém, tem uma outra parte, a parte dura. Por trás de sua extrema docilidade, maleabilidade e generosidade para com a vida, a água é poderosa, e pode ser muito cruel e impiedosa na defesa das áreas que fazem parte de sua existência e integridade. Além das notificações e das multas administrativas oficiais, se fosse possível estas punições da natureza também deveriam estar nas leis pois os homens insistem em fingir não conhecê-las, talvez pela sua prepotência tecnológica ou pelo pouco caso com a vida, principalmente pelas dos outros. Só se lembram quando cobrados cruelmente a cada período de chuvas. E aí as lágrimas de crocodilo, culpando São Pedro ou alegando uma falsa falta de planejamento. Senhor dos segredos da águas dos nossos rios, o professor Iglesias dizia que não eram os rios que invadiam as cidades, mas as cidades que invadiam os rios.
Quando na Defesa Civil do Estado ele chegou a propor uma marcação física para a “cota de emergência” ao longo do rio Cuiabá, numa tentativa de alertar aqueles que pretendessem se instalar nessas áreas. Para o setor público o recado seria que as ocupações abaixo dessa cota seriam da responsabilidade dos prefeitos, que têm por obrigação impedi-las, como mandam as leis. Seria como um freio a esse processo criminoso de ocupação de áreas de risco. Seguindo a idéia em uma das minhas costumeiras sessões de elocubrações livres, cheguei a pensar que as cidades brasileiras devessem fixar um passivo de ocupações de risco, e cada administrador, com penas previstas em lei, teria a obrigação de não permitir a ampliação, bem como de reduzi-lo a cada gestão, com base em metas de redução de longo prazo estabelecidas nos planos diretores. Mas, de que adiantaria mais uma lei em um país que prefere chorar as catástrofes a cumprir a legislação urbanística?
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 09/03/10)
Penso que a melhor maneira de homenagear nas poucas linhas de um artigo uma figura tão rica como Domingos Iglesias Valério, seria relembrar uma de suas muitas lições. Nunca fui seu aluno, mas sempre o tive como um mestre no desenvolvimento de Cuiabá e Mato Grosso, jamais se omitindo mesmo sob o risco da polêmica, como homem que entendia que o conhecimento só tem sentido se compartilhado, como demonstrou ao longo da vida, sempre em prol da gente e da terra que adotou com tanto fervor. A socialização do conhecimento em todas as suas dimensões, não apenas o técnico, o compartilhamento, bem pode ter sido sua principal lição. Mas, nesta pequena homenagem, destaco no campo do urbanismo uma das lições de maior utilidade em minhas funções públicas, e que me parece da maior importância não só para Cuiabá, mas para todas as cidades do Brasil, das vilas às metrópoles.
Nos bancos escolares uma coisa é você ter recebido aula de uma determinada matéria e tê-la em seu currículo. Outra coisa é você entender de fato o que foi aprendido oficialmente. Foi com o “professor Iglesias” - como carinhosamente conhecido - que entendi na prática o conceito das áreas de risco inundáveis, que ele chamava de “império das águas”. Quando colocadas nas lições escolares ou nas letras frias das tantas leis que tratam do assunto no Brasil, as áreas de risco, notadamente às ligadas às águas, parecem perder muito da sua periculosidade, de sua potencialidade de dano, problema só percebido por ocasião das tragédias. Com a expressão “império das águas” o professor, falecido no sábado, ensinou que as áreas inundáveis são os espaços naturais das águas, indispensáveis à sua existência, pois, continuando em sua lição, os corpos d’água respiram como seres vivos que são, como se inspirassem nas cheias e expirassem nas vazantes.
Até aqui, uma forma bonita de se falar sobre as águas. Esta lição, porém, tem uma outra parte, a parte dura. Por trás de sua extrema docilidade, maleabilidade e generosidade para com a vida, a água é poderosa, e pode ser muito cruel e impiedosa na defesa das áreas que fazem parte de sua existência e integridade. Além das notificações e das multas administrativas oficiais, se fosse possível estas punições da natureza também deveriam estar nas leis pois os homens insistem em fingir não conhecê-las, talvez pela sua prepotência tecnológica ou pelo pouco caso com a vida, principalmente pelas dos outros. Só se lembram quando cobrados cruelmente a cada período de chuvas. E aí as lágrimas de crocodilo, culpando São Pedro ou alegando uma falsa falta de planejamento. Senhor dos segredos da águas dos nossos rios, o professor Iglesias dizia que não eram os rios que invadiam as cidades, mas as cidades que invadiam os rios.
Quando na Defesa Civil do Estado ele chegou a propor uma marcação física para a “cota de emergência” ao longo do rio Cuiabá, numa tentativa de alertar aqueles que pretendessem se instalar nessas áreas. Para o setor público o recado seria que as ocupações abaixo dessa cota seriam da responsabilidade dos prefeitos, que têm por obrigação impedi-las, como mandam as leis. Seria como um freio a esse processo criminoso de ocupação de áreas de risco. Seguindo a idéia em uma das minhas costumeiras sessões de elocubrações livres, cheguei a pensar que as cidades brasileiras devessem fixar um passivo de ocupações de risco, e cada administrador, com penas previstas em lei, teria a obrigação de não permitir a ampliação, bem como de reduzi-lo a cada gestão, com base em metas de redução de longo prazo estabelecidas nos planos diretores. Mas, de que adiantaria mais uma lei em um país que prefere chorar as catástrofes a cumprir a legislação urbanística?
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 09/03/10)
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terça-feira, 2 de março de 2010
FERRONORTE JÁ!
José Antonio Lemos dos Santos
Em artigo denominado “Trem a jato”, publicado em 27 de janeiro do ano passado, fui um dos primeiros a saudar o projeto da nova ferrovia ligando Uruaçu (GO) a Vilhena (RO), passando por Lucas do Rio Verde e Sapezal em Mato Grosso. Também tive a oportunidade de admirar a rapidez com que tal proposta saiu do nada e entrou no Plano Nacional de Viação. E mais, conseguiu entrar no PAC ainda com “projeto a definir”, façanha não conseguida até hoje pelo trecho da Ferronorte entre Rondonópolis e Cuiabá - cuja concessão completa 21 anos - trecho com maior movimento rodoviário de cargas e acidentes no estado. Quem dera tivéssemos sempre a mesma rapidez. Mas, dias atrás em Cuiabá a ministra Dilma Roussef prometeu avaliar a inclusão no PAC do trecho até Cuiabá. Enquanto isso, avaliamos nosso voto à presidência.
Claro que é importante a nova ferrovia, desde que executada após a implantação do traçado já concedido à Ferronorte, e, naturalmente, após aprovada pelos devidos estudos de impacto ambiental. Mato Grosso não pode mais esperar por uma ferrovia. Não apenas para levar sua produção, ou trazer as cargas de retorno (mercadorias, insumos diversos, defensivos, fertilizantes, combustíveis, materiais de construção etc.), mas principalmente para reduzir custos de produção, poupar o meio ambiente e as vidas que são ceifadas pela atual sobrecarga das rodovias. É urgente que a ferrovia chegue à Cuiabá, Lucas, Sinop, Sorriso, seguindo de imediato à Santarém e Vilhena, assegurando o escoamento da diversificada produção mato-grossense para o mercado externo e interno, e inclusive a vinda de produtos da Zona Franca de Manaus para o mercado brasileiro, com mais segurança e menores custos. No quesito urgência, não resta dúvida que o trajeto da Ferronorte será de execução muito mais rápida, pois já está praticamente em Rondonópolis, a 200 km de Cuiabá e a 560 de Lucas, sem nenhum Araguaia, Ilha do Bananal ou Parque do Xingú pelo caminho. A outra tem mais de 1000 km para chegar a Lucas.
A conurbação Cuiabá/Várzea Grande forma o maior pólo concentrador de cargas do estado. Ainda que não produza um grão, passa por ela toda carga a oeste da área de influência da BR-163 destinada ao sudeste brasileiro, seja para exportação via seus portos ou para consumo interno. Por exemplo, no ano passado cerca de 8 milhões de toneladas da soja produzida em Mato Grosso ficaram no mercado interno, isto é, para ficar no Brasil passou por Cuiabá um volume igual à produção do Rio Grande do Sul, terceiro produtor nacional de soja. Só esta carga já viabilizaria a ligação de Cuiabá, fora os demais produtos. A eventual construção antecipada da ligação de Lucas a Uruaçu significaria então um seqüestro para Goiás dessa carga, que deixaria de passar por Mato Grosso e de ajudar a consolidar o estado. Por outro lado, Cuiabá é também o maior centro produtor, consumidor e distribuidor do oeste de Brasil, sendo o principal destino das cargas de retorno de uma ferrovia idealizada não apenas para levar, mas também para trazer o desenvolvimento. Cuiabá é o maior pólo regional de cargas de ida e de volta, sem as quais nenhum frete se viabiliza.
Unido e trabalhador, Mato Grosso tem na sua dimensão a causa maior do seu sucesso. Sua espinha dorsal, a Br – 163 será fortalecida com a ferrovia ligando Cuiabá a Santarém e Vilhena. A construção de uma ferrovia transversal precedendo ao projeto da FERRONORTE, partirá Mato Grosso na medula, ao meio, criando duas economias, com a nova centrada em Goiás, ambas fracas, de volta à rabeira da economia nacional, sem voz e sem vez. É tudo que Mato Grosso não precisa.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 02/03/2010)
Em artigo denominado “Trem a jato”, publicado em 27 de janeiro do ano passado, fui um dos primeiros a saudar o projeto da nova ferrovia ligando Uruaçu (GO) a Vilhena (RO), passando por Lucas do Rio Verde e Sapezal em Mato Grosso. Também tive a oportunidade de admirar a rapidez com que tal proposta saiu do nada e entrou no Plano Nacional de Viação. E mais, conseguiu entrar no PAC ainda com “projeto a definir”, façanha não conseguida até hoje pelo trecho da Ferronorte entre Rondonópolis e Cuiabá - cuja concessão completa 21 anos - trecho com maior movimento rodoviário de cargas e acidentes no estado. Quem dera tivéssemos sempre a mesma rapidez. Mas, dias atrás em Cuiabá a ministra Dilma Roussef prometeu avaliar a inclusão no PAC do trecho até Cuiabá. Enquanto isso, avaliamos nosso voto à presidência.
Claro que é importante a nova ferrovia, desde que executada após a implantação do traçado já concedido à Ferronorte, e, naturalmente, após aprovada pelos devidos estudos de impacto ambiental. Mato Grosso não pode mais esperar por uma ferrovia. Não apenas para levar sua produção, ou trazer as cargas de retorno (mercadorias, insumos diversos, defensivos, fertilizantes, combustíveis, materiais de construção etc.), mas principalmente para reduzir custos de produção, poupar o meio ambiente e as vidas que são ceifadas pela atual sobrecarga das rodovias. É urgente que a ferrovia chegue à Cuiabá, Lucas, Sinop, Sorriso, seguindo de imediato à Santarém e Vilhena, assegurando o escoamento da diversificada produção mato-grossense para o mercado externo e interno, e inclusive a vinda de produtos da Zona Franca de Manaus para o mercado brasileiro, com mais segurança e menores custos. No quesito urgência, não resta dúvida que o trajeto da Ferronorte será de execução muito mais rápida, pois já está praticamente em Rondonópolis, a 200 km de Cuiabá e a 560 de Lucas, sem nenhum Araguaia, Ilha do Bananal ou Parque do Xingú pelo caminho. A outra tem mais de 1000 km para chegar a Lucas.
A conurbação Cuiabá/Várzea Grande forma o maior pólo concentrador de cargas do estado. Ainda que não produza um grão, passa por ela toda carga a oeste da área de influência da BR-163 destinada ao sudeste brasileiro, seja para exportação via seus portos ou para consumo interno. Por exemplo, no ano passado cerca de 8 milhões de toneladas da soja produzida em Mato Grosso ficaram no mercado interno, isto é, para ficar no Brasil passou por Cuiabá um volume igual à produção do Rio Grande do Sul, terceiro produtor nacional de soja. Só esta carga já viabilizaria a ligação de Cuiabá, fora os demais produtos. A eventual construção antecipada da ligação de Lucas a Uruaçu significaria então um seqüestro para Goiás dessa carga, que deixaria de passar por Mato Grosso e de ajudar a consolidar o estado. Por outro lado, Cuiabá é também o maior centro produtor, consumidor e distribuidor do oeste de Brasil, sendo o principal destino das cargas de retorno de uma ferrovia idealizada não apenas para levar, mas também para trazer o desenvolvimento. Cuiabá é o maior pólo regional de cargas de ida e de volta, sem as quais nenhum frete se viabiliza.
Unido e trabalhador, Mato Grosso tem na sua dimensão a causa maior do seu sucesso. Sua espinha dorsal, a Br – 163 será fortalecida com a ferrovia ligando Cuiabá a Santarém e Vilhena. A construção de uma ferrovia transversal precedendo ao projeto da FERRONORTE, partirá Mato Grosso na medula, ao meio, criando duas economias, com a nova centrada em Goiás, ambas fracas, de volta à rabeira da economia nacional, sem voz e sem vez. É tudo que Mato Grosso não precisa.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 02/03/2010)
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terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
A LISTA DO CNJ
José Antonio Lemos dos Santos
Com importantes passos dados ultimamente, as eleições no Brasil voltam a apresentar alguns sinais de esperança. Mais exatamente, dois passos, fundamentais no sentido de fazer da democracia brasileira um instrumento da cidadania nacional, voltada realmente para a construção do bem comum. O primeiro foi a confirmação pelo STF de que não são dos candidatos eleitos os cargos disputados nas eleições proporcionais, e sim dos partidos ou coligações pelos quais foram eleitos. A segunda é a recente decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de publicar a lista dos condenados por improbidade administrativa, de forma acessível e clara a todos.
A decisão do STF sacolejou os alicerces de nossa incipiente República, pois confirma que o eleitor vota duas vezes nas eleições proporcionais – complicadas mas indispensáveis à democracia. Primeiro vota nos partidos definindo os que serão representados nos parlamentos e quantas cadeiras terão, conforme a totalidade dos votos obtidos pelas legendas e todos os seus candidatos, inclusive pelos menos votados. Depois, o voto do eleitor define quais candidatos ocuparão as vagas disputadas, em ordem decrescente de votos obtidos. Daí a decisão de que os cargos são dos partidos, pois, de fato eles os conquistaram. O que, aliás, era claro para os que seguem as eleições brasileiras, acostumados aos cálculos dos coeficientes e quocientes eleitorais, sobras de votos, etc.. Só não via assim quem não queria ver, ou não queria que fosse assim.
Essa decisão ainda traz ao eleitor uma lição fundamental: ninguém perde o voto nas eleições proporcionais. Cada voto tem participação direta na definição da distribuição proporcional do poder entre os partidos e na escolha dos ocupantes das vagas em disputa. Seu voto sempre elegerá alguém, mesmo que não seja aquele escolhido por você. Assim, você pode votar em um candidato e eleger outro, e, pior, ficar com a pecha de não saber votar. Esta situação acontece porque o eleitor em geral desconhece que nas eleições proporcionais não basta seu candidato ser um ótimo candidato; ele também não pode estar mal acompanhado na lista de candidatos de seu partido ou coligação. Ao escolher seu candidato o eleitor precisa avaliar a lista em que ele se encontra, para ver se ela abriga algum(ns) candidato(s) que não queira ver eleito(s), caso em que corre o grande risco de eleger um ou mais destes. Assim, nas eleições proporcionais ninguém pode dizer que nada tem a ver com os deputados ou vereadores eleitos alegando não ter votado diretamente em qualquer um deles, ou por ter anulado seu voto.
Votando ao mesmo tempo no partido e no candidato, o eleitor tem que estar informado sobre todos os candidatos, ao menos os da lista em que escolheu o seu. Daí a relevância da lista do CNJ com os condenados por improbidade administrativa. Para aproveitar a oportunidade de uma sinergia histórica, torna-se agora imprescindível que a Justiça Eleitoral dê um novo passo nessa caminhada de esperança que ela mesmo retomou, determinando que os partidos divulguem a lista de seus candidatos, também de forma clara e acessível a todos. Ou que os próprios TREs divulguem tais listas, organizadas por partido ou coligação e não apenas por ordem alfabética, evitando que o eleitor continue comprando gato por lebre. Na verdade, um dia ainda espero ver retiradas das costas dos tradicionais “santinhos” de propaganda dos candidatos as inconvenientes receitas, calendários, orações, etc., substituídas pela lista dos correligionários de cada um, postulantes à mesma vaga, com orgulho e sem necessidade de escondê-la. Seria mais coerente com a lei, mais útil ao eleitor e à democracia.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 23/02/2010)
Com importantes passos dados ultimamente, as eleições no Brasil voltam a apresentar alguns sinais de esperança. Mais exatamente, dois passos, fundamentais no sentido de fazer da democracia brasileira um instrumento da cidadania nacional, voltada realmente para a construção do bem comum. O primeiro foi a confirmação pelo STF de que não são dos candidatos eleitos os cargos disputados nas eleições proporcionais, e sim dos partidos ou coligações pelos quais foram eleitos. A segunda é a recente decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de publicar a lista dos condenados por improbidade administrativa, de forma acessível e clara a todos.
A decisão do STF sacolejou os alicerces de nossa incipiente República, pois confirma que o eleitor vota duas vezes nas eleições proporcionais – complicadas mas indispensáveis à democracia. Primeiro vota nos partidos definindo os que serão representados nos parlamentos e quantas cadeiras terão, conforme a totalidade dos votos obtidos pelas legendas e todos os seus candidatos, inclusive pelos menos votados. Depois, o voto do eleitor define quais candidatos ocuparão as vagas disputadas, em ordem decrescente de votos obtidos. Daí a decisão de que os cargos são dos partidos, pois, de fato eles os conquistaram. O que, aliás, era claro para os que seguem as eleições brasileiras, acostumados aos cálculos dos coeficientes e quocientes eleitorais, sobras de votos, etc.. Só não via assim quem não queria ver, ou não queria que fosse assim.
Essa decisão ainda traz ao eleitor uma lição fundamental: ninguém perde o voto nas eleições proporcionais. Cada voto tem participação direta na definição da distribuição proporcional do poder entre os partidos e na escolha dos ocupantes das vagas em disputa. Seu voto sempre elegerá alguém, mesmo que não seja aquele escolhido por você. Assim, você pode votar em um candidato e eleger outro, e, pior, ficar com a pecha de não saber votar. Esta situação acontece porque o eleitor em geral desconhece que nas eleições proporcionais não basta seu candidato ser um ótimo candidato; ele também não pode estar mal acompanhado na lista de candidatos de seu partido ou coligação. Ao escolher seu candidato o eleitor precisa avaliar a lista em que ele se encontra, para ver se ela abriga algum(ns) candidato(s) que não queira ver eleito(s), caso em que corre o grande risco de eleger um ou mais destes. Assim, nas eleições proporcionais ninguém pode dizer que nada tem a ver com os deputados ou vereadores eleitos alegando não ter votado diretamente em qualquer um deles, ou por ter anulado seu voto.
Votando ao mesmo tempo no partido e no candidato, o eleitor tem que estar informado sobre todos os candidatos, ao menos os da lista em que escolheu o seu. Daí a relevância da lista do CNJ com os condenados por improbidade administrativa. Para aproveitar a oportunidade de uma sinergia histórica, torna-se agora imprescindível que a Justiça Eleitoral dê um novo passo nessa caminhada de esperança que ela mesmo retomou, determinando que os partidos divulguem a lista de seus candidatos, também de forma clara e acessível a todos. Ou que os próprios TREs divulguem tais listas, organizadas por partido ou coligação e não apenas por ordem alfabética, evitando que o eleitor continue comprando gato por lebre. Na verdade, um dia ainda espero ver retiradas das costas dos tradicionais “santinhos” de propaganda dos candidatos as inconvenientes receitas, calendários, orações, etc., substituídas pela lista dos correligionários de cada um, postulantes à mesma vaga, com orgulho e sem necessidade de escondê-la. Seria mais coerente com a lei, mais útil ao eleitor e à democracia.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 23/02/2010)
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terça-feira, 9 de fevereiro de 2010
10 ANOS DO AQUÁRIO
José Antonio Lemos dos Santos
Não há como deixar de comemorar os 10 anos do Aquário Municipal de Cuiabá, completados no último dia 5 de fevereiro. Um dos equipamentos urbanos mais queridos da população, sendo inclusive adotado como um dos cartões postais da cidade, o Aquário é um dos projetos que mais me agrada, desde sua elaboração até os dias de hoje, na continuidade de sua visitação, com a alegria das crianças surpresas diante dos peixes colocados bem à altura de seus olhos ou disputando a ração que jogam no tanque externo. Satisfação que continua no semblante dos pais e mães, avos e avós, acompanhantes extasiados com a felicidade de seus pequenos, ou mesmo encantados com a visão de uma espécie que, mesmo adultos, ainda não tinham conhecido, ou cuja beleza plástica nunca haviam percebido com vida, só como protagonista de muitas das diversas maravilhas de nossa culinária. Um passeio que também é uma aula para crianças e adultos.
O aquário entusiasmou todos desde que surgiu a idéia. O então prefeito Roberto França iniciando seu primeiro mandato aprovou a proposta de revitalização da Beira-Rio e do Porto que vinha das administrações anteriores, mas entendeu que no projeto do Museu do Rio faltava o personagem principal, o peixe. Determinou então que fosse projetado um aquário anexo, onde pudessem estar expostas todas as espécies de peixes do rio Cuiabá e pantanal. O tempo era escasso pois os recursos tinham curto prazo para aplicação e as referências para projeto de um aquário estavam sempre além do que podia a prefeitura. Com o arquiteto Ademar Poppi encontramos uma solução própria, um partido arquitetônico adequado e exeqüível nas condições existentes, e que virou referência para projetos similares em outros estados.
E depois do projeto, a construção e a maratona para coleta dos exemplares que iriam ocupar o aquário. No dia da inauguração o professor doutor Francisco Machado ainda mergulhava no Pantanal atrás de um certo camarão e uma espécie de acará que faltavam. A poucas horas da inauguração o prefeito trazia pessoalmente de seus tanques de criação as piraputangas e pacus, alguns dos quais ainda vivos hoje no aquário. Ao mesmo tempo a engenheira Maristela Okamura produzia as placas e banners informativos, tudo sempre com a presença de Teruo Izawa, o anjo do Aquário, cuidando até hoje dos peixes, ainda que sem nunca ter recebido o justo e merecido reconhecimento da prefeitura.
Milhares de pessoas estiveram na inauguração do Aquário, que recebeu nestes 10 anos mais de 1 milhão de visitantes. Hoje tem uma média superior a 100 visitantes por dia. Poderia estar em melhores condições, mas sua manutenção nunca foi equacionada, desde o início. Uma pena pois foi idealizado como uma estrutura auto-sustentável, junto ao Museu do Rio. A sustentabilidade que jamais conseguimos viria da venda de lembranças relacionadas ao Aquário, ao rio e sua cultura, como chaveiros, bonés, camisetas, fotos, livros diversos, vídeos e CDs, etc. Embora não viabilizadas, buscou-se também parcerias com as secretarias de educação do município e do estado, em troca do baita equipamento educacional utilizado por muitas escolas de Cuiabá e do estado ao longo destes 10 anos. Buscou-se ainda as faculdades de veterinária da cidade, infrutiferamente. Pretendia-se evitar a cobrança de ingressos que hoje é a única garantia de sobrevivência do Aquário, cobrança que não discordo na situação, pois se paga bem mais só para estacionar um carro em qualquer shopping ou em ruas centrais da cidade, em especial no nosso aeroporto - o muquifo internacional em que a Infraero recepciona/decepciona os que chegam a Mato Grosso. Quem sabe a Copa venha a ser também a chance de viabilização do Aquário?
(Publicado no Diário de Cuiabá em 09/02/2010)
Não há como deixar de comemorar os 10 anos do Aquário Municipal de Cuiabá, completados no último dia 5 de fevereiro. Um dos equipamentos urbanos mais queridos da população, sendo inclusive adotado como um dos cartões postais da cidade, o Aquário é um dos projetos que mais me agrada, desde sua elaboração até os dias de hoje, na continuidade de sua visitação, com a alegria das crianças surpresas diante dos peixes colocados bem à altura de seus olhos ou disputando a ração que jogam no tanque externo. Satisfação que continua no semblante dos pais e mães, avos e avós, acompanhantes extasiados com a felicidade de seus pequenos, ou mesmo encantados com a visão de uma espécie que, mesmo adultos, ainda não tinham conhecido, ou cuja beleza plástica nunca haviam percebido com vida, só como protagonista de muitas das diversas maravilhas de nossa culinária. Um passeio que também é uma aula para crianças e adultos.
O aquário entusiasmou todos desde que surgiu a idéia. O então prefeito Roberto França iniciando seu primeiro mandato aprovou a proposta de revitalização da Beira-Rio e do Porto que vinha das administrações anteriores, mas entendeu que no projeto do Museu do Rio faltava o personagem principal, o peixe. Determinou então que fosse projetado um aquário anexo, onde pudessem estar expostas todas as espécies de peixes do rio Cuiabá e pantanal. O tempo era escasso pois os recursos tinham curto prazo para aplicação e as referências para projeto de um aquário estavam sempre além do que podia a prefeitura. Com o arquiteto Ademar Poppi encontramos uma solução própria, um partido arquitetônico adequado e exeqüível nas condições existentes, e que virou referência para projetos similares em outros estados.
E depois do projeto, a construção e a maratona para coleta dos exemplares que iriam ocupar o aquário. No dia da inauguração o professor doutor Francisco Machado ainda mergulhava no Pantanal atrás de um certo camarão e uma espécie de acará que faltavam. A poucas horas da inauguração o prefeito trazia pessoalmente de seus tanques de criação as piraputangas e pacus, alguns dos quais ainda vivos hoje no aquário. Ao mesmo tempo a engenheira Maristela Okamura produzia as placas e banners informativos, tudo sempre com a presença de Teruo Izawa, o anjo do Aquário, cuidando até hoje dos peixes, ainda que sem nunca ter recebido o justo e merecido reconhecimento da prefeitura.
Milhares de pessoas estiveram na inauguração do Aquário, que recebeu nestes 10 anos mais de 1 milhão de visitantes. Hoje tem uma média superior a 100 visitantes por dia. Poderia estar em melhores condições, mas sua manutenção nunca foi equacionada, desde o início. Uma pena pois foi idealizado como uma estrutura auto-sustentável, junto ao Museu do Rio. A sustentabilidade que jamais conseguimos viria da venda de lembranças relacionadas ao Aquário, ao rio e sua cultura, como chaveiros, bonés, camisetas, fotos, livros diversos, vídeos e CDs, etc. Embora não viabilizadas, buscou-se também parcerias com as secretarias de educação do município e do estado, em troca do baita equipamento educacional utilizado por muitas escolas de Cuiabá e do estado ao longo destes 10 anos. Buscou-se ainda as faculdades de veterinária da cidade, infrutiferamente. Pretendia-se evitar a cobrança de ingressos que hoje é a única garantia de sobrevivência do Aquário, cobrança que não discordo na situação, pois se paga bem mais só para estacionar um carro em qualquer shopping ou em ruas centrais da cidade, em especial no nosso aeroporto - o muquifo internacional em que a Infraero recepciona/decepciona os que chegam a Mato Grosso. Quem sabe a Copa venha a ser também a chance de viabilização do Aquário?
(Publicado no Diário de Cuiabá em 09/02/2010)
terça-feira, 2 de fevereiro de 2010
A DECISÃO DA ESPERANÇA
José Antonio Lemos dos Santos
Ia escrever sobre o décimo aniversário do Aquário Municipal de Cuiabá, a ser festejado no dia 5 de fevereiro próximo. Porém, esta singela mas justa homenagem, fica adiada devido a decisão do juiz Luis Aparecido Bertolucci Júnior concedendo liminar ao Ministério Público Estadual (MPE) e suspendendo a venda da rua Tuffik Affi. É ótimo quando escolhemos nosso tema semanal entre fatos auspiciosos, positivos. Nos meus artigos sobre a cidade e assuntos correlatos busco sempre manter uma postura positiva, otimista, usando as boas perspectivas, apresentando propostas, aplaudindo e elogiando as boas iniciativas e os bons exemplos presentes e passados de nossa terra. Infelizmente, trata-se de um exercício difícil, sendo bem vindas ocasiões como desta semana, onde aspectos positivos da realidade preponderam sobre os negativos, ao menos na cabeça deste articulista neófito.
A importância da decisão da Vara Especial do Meio Ambiente envolve uma questão que se assemelha a um imenso iceberg, cuja ponta visível, mínima, é a rua Tuffik Affi e a liminar concedida. Logo ao vir à luz, a venda da rua já trouxe consigo – inclusive como uma de suas justificativas - a notícia da venda de uma área contígua, também pública e com dimensões muito maiores, em data e valor até hoje desconhecidos e utilizando os mesmos métodos questionados pelo MPE, ao menos quanto ao desconhecimento e falta de discussão pública. Só se sabe que o comprador foi o mesmo. Trata-se de uma área de quase 2 hectares, uma das últimas áreas públicas urbanas dessa magnitude disponíveis em pleno coração da Grande Cuiabá, na principal entrada da capital mato-grossense. Quero crer que o MPE tenha deixado para um segundo momento o questionamento da venda desta outra área, coroando então, no caso, sua exitosa vigilância com a aplicação das leis, e na recuperação daquele valioso patrimônio público para uso da cidade.
Tão logo foi divulgada a notícia da venda da rua, a opinião pública manifestou sua indignação nos meios de comunicação através de artigos, cartas de leitores, reportagens e comentários diversos, como eu próprio tive oportunidade de fazê-lo. Na ocasião muitos leitores me escreveram compartilhando a indignação, mas convencidos de que a opinião da sociedade mais uma vez seria inócua e logo esquecida pelo próximo escândalo. Eu mesmo, cético, cheguei a dizer no meu artigo que só me manifestava para “desopilar o fígado”. Mas, ao contrário, a ação do MPE foi imediata, e a decisão do juiz já estimulou alguns e-mails de leitores, desta vez esperançosos com algo novo surgindo no trato da coisa pública. Qualquer que seja o resultado final do processo, a atual decisão concedendo a liminar reacendeu a esperança, ainda que tênue, em uma cidadania descrente.
Trabalhando de um modo geral com cidades, e em especial Cuiabá e Várzea Grande, aprendi que o tão esperado e urgente salto qualitativo de nossas cidades – que matam e estão matando cada vez mais - só se dará quando a cidadania assumir que a cidade é sua e que a qualidade do desenvolvimento urbano depende diretamente de seu interesse e empenho. Que os prefeitos, governadores ou presidentes da república são gestores da res-publica, e não donos do bem comum. O destino das cidades no Brasil, que afinal é nosso próprio destino, não pode mais depender exclusivamente da ação ou omissão de seus administradores. É preciso a participação de cada um fazendo sua parte, mas também criticando e exigindo, pelos caminhos legais disponíveis, retidão e transparência nas coisas públicas. Como se deu com a Rua Tuffik Affi. Quem dera este caso fosse de fato um sinal das mudanças tão desejadas e necessárias na forma da nossa gestão urbana, ao menos em Cuiabá.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 02/02/2010)
Ia escrever sobre o décimo aniversário do Aquário Municipal de Cuiabá, a ser festejado no dia 5 de fevereiro próximo. Porém, esta singela mas justa homenagem, fica adiada devido a decisão do juiz Luis Aparecido Bertolucci Júnior concedendo liminar ao Ministério Público Estadual (MPE) e suspendendo a venda da rua Tuffik Affi. É ótimo quando escolhemos nosso tema semanal entre fatos auspiciosos, positivos. Nos meus artigos sobre a cidade e assuntos correlatos busco sempre manter uma postura positiva, otimista, usando as boas perspectivas, apresentando propostas, aplaudindo e elogiando as boas iniciativas e os bons exemplos presentes e passados de nossa terra. Infelizmente, trata-se de um exercício difícil, sendo bem vindas ocasiões como desta semana, onde aspectos positivos da realidade preponderam sobre os negativos, ao menos na cabeça deste articulista neófito.
A importância da decisão da Vara Especial do Meio Ambiente envolve uma questão que se assemelha a um imenso iceberg, cuja ponta visível, mínima, é a rua Tuffik Affi e a liminar concedida. Logo ao vir à luz, a venda da rua já trouxe consigo – inclusive como uma de suas justificativas - a notícia da venda de uma área contígua, também pública e com dimensões muito maiores, em data e valor até hoje desconhecidos e utilizando os mesmos métodos questionados pelo MPE, ao menos quanto ao desconhecimento e falta de discussão pública. Só se sabe que o comprador foi o mesmo. Trata-se de uma área de quase 2 hectares, uma das últimas áreas públicas urbanas dessa magnitude disponíveis em pleno coração da Grande Cuiabá, na principal entrada da capital mato-grossense. Quero crer que o MPE tenha deixado para um segundo momento o questionamento da venda desta outra área, coroando então, no caso, sua exitosa vigilância com a aplicação das leis, e na recuperação daquele valioso patrimônio público para uso da cidade.
Tão logo foi divulgada a notícia da venda da rua, a opinião pública manifestou sua indignação nos meios de comunicação através de artigos, cartas de leitores, reportagens e comentários diversos, como eu próprio tive oportunidade de fazê-lo. Na ocasião muitos leitores me escreveram compartilhando a indignação, mas convencidos de que a opinião da sociedade mais uma vez seria inócua e logo esquecida pelo próximo escândalo. Eu mesmo, cético, cheguei a dizer no meu artigo que só me manifestava para “desopilar o fígado”. Mas, ao contrário, a ação do MPE foi imediata, e a decisão do juiz já estimulou alguns e-mails de leitores, desta vez esperançosos com algo novo surgindo no trato da coisa pública. Qualquer que seja o resultado final do processo, a atual decisão concedendo a liminar reacendeu a esperança, ainda que tênue, em uma cidadania descrente.
Trabalhando de um modo geral com cidades, e em especial Cuiabá e Várzea Grande, aprendi que o tão esperado e urgente salto qualitativo de nossas cidades – que matam e estão matando cada vez mais - só se dará quando a cidadania assumir que a cidade é sua e que a qualidade do desenvolvimento urbano depende diretamente de seu interesse e empenho. Que os prefeitos, governadores ou presidentes da república são gestores da res-publica, e não donos do bem comum. O destino das cidades no Brasil, que afinal é nosso próprio destino, não pode mais depender exclusivamente da ação ou omissão de seus administradores. É preciso a participação de cada um fazendo sua parte, mas também criticando e exigindo, pelos caminhos legais disponíveis, retidão e transparência nas coisas públicas. Como se deu com a Rua Tuffik Affi. Quem dera este caso fosse de fato um sinal das mudanças tão desejadas e necessárias na forma da nossa gestão urbana, ao menos em Cuiabá.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 02/02/2010)
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terça-feira, 26 de janeiro de 2010
A VENDA DA RUA
José Antonio Lemos dos Santos
Volto à questão da venda da rua Tuffik Affi, que seria melhor tratada como a venda da entrada da cidade. Na verdade ao vir a público a venda da rua, aflorou também a venda da área lindeira acontecida anteriormente, pelo mesmo questionável “método” usado na venda da rua, por razões, valor e data até hoje do desconhecimento público. O conjunto rua/área localiza-se na principal entrada da cidade, vindo do aeroporto, uma ampla área pública predestinada a receber um tratamento urbanístico especial, digno das entradas das verdadeiras civitas, capaz de envaidecer os cidadãos e bem recepcionar o turista nacional e internacional com uma boa primeira impressão, que é a que fica. A prefeitura vendeu a entrada da cidade, não apenas uma rua.
Mas a importância desta área vai além, pois é também local privilegiado de fruição do rio Cuiabá em todas as suas dimensões, em especial pelo que representa como história, paisagem, ou ambiente natural aberto. Ressalte-se que fica justo sobre a canalização do córrego da Prainha e contígua à sua foz, onde ainda resistem as pedras do I-Kuia-pá, origem do próprio nome da cidade. Está também na interseção de duas importantes avenidas da Grande Cuiabá, a avenida Manuel José da Arruda (a Beira-Rio) e o binário XV/Cel.Duarte, que junto com a avenida da FEB formam o eixo estrutural que corta a Grande Cuiabá de norte a sul, do Mapin até o CPA.
Portanto, não se trata de uma área qualquer da cidade, mas sim de uma de suas áreas mais nobres, urbanisticamente falando. Ao contrário do que aconteceu, se fosse de propriedade privada, certamente deveria ser desapropriada, mormente agora com a aprovação pelo governo federal do projeto da calha central para o BRT, proposto pela própria prefeitura, que vai passar por ali, com o prefeito falando inclusive na construção de uma nova ponte no local. Como vai acontecer? Pela sua importância certamente esta interseção precisará de espaço, o máximo possível, para que possam ser acomodados seus raios de curvas, faixas de rolamento, canteiros e calçadas, generosas, permitindo fluidez, conforto e segurança aos transeuntes, pedestres ou motorizados, inclusive, para a circulação exclusiva do novo transporte coletivo.
Dois meses após a venda da rua ter vindo à luz, a prefeitura ainda não explicou a razão da venda. “Pouco movimento” não basta para desafetar uma rua. Só se integrante de um projeto urbanístico para a área, que tivesse sido apresentado antes à população ou, no mínimo, aos vereadores para discussão sobre sua utilidade pública. Até hoje nenhum projeto. Aliás, a situação esdrúxula é bem ilustrada na imprensa pelo vereador Francisco Vuolo ao dizer que o projeto “chegou no Legislativo no mesmo dia, minutos antes de ser colocado em votação”, e pelo vereador Toninho de Souza: "Eu nunca iria votar um projeto desse para vender uma rua. Isso não existe. Se eu fizesse isso, teria que sair preso da Câmara. O projeto que aprovamos não dizia nada sobre venda de rua e, se isso aconteceu, fomos enganados.".
A indignação manifestada pela população em todos os meios de comunicação e a pronta ação do Ministério Público junto ao Judiciário, através do promotor Gérson Barbosa, trazem a certeza de que o assunto não está encerrado e a cidade poderá ainda voltar a dispor de seu valioso patrimônio urbanístico. Este assunto é fundamental para a tão necessária elevação dos padrões urbanísticos de Cuiabá e não pode ser jogado na vala comum dos bate-bocas emocionais das eleições que se avizinham nem, muito menos, ser abandonado no estoque dos escândalos que tanto indignam nossa gente, mas que logo são esquecidos.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 26/01/2010)
Volto à questão da venda da rua Tuffik Affi, que seria melhor tratada como a venda da entrada da cidade. Na verdade ao vir a público a venda da rua, aflorou também a venda da área lindeira acontecida anteriormente, pelo mesmo questionável “método” usado na venda da rua, por razões, valor e data até hoje do desconhecimento público. O conjunto rua/área localiza-se na principal entrada da cidade, vindo do aeroporto, uma ampla área pública predestinada a receber um tratamento urbanístico especial, digno das entradas das verdadeiras civitas, capaz de envaidecer os cidadãos e bem recepcionar o turista nacional e internacional com uma boa primeira impressão, que é a que fica. A prefeitura vendeu a entrada da cidade, não apenas uma rua.
Mas a importância desta área vai além, pois é também local privilegiado de fruição do rio Cuiabá em todas as suas dimensões, em especial pelo que representa como história, paisagem, ou ambiente natural aberto. Ressalte-se que fica justo sobre a canalização do córrego da Prainha e contígua à sua foz, onde ainda resistem as pedras do I-Kuia-pá, origem do próprio nome da cidade. Está também na interseção de duas importantes avenidas da Grande Cuiabá, a avenida Manuel José da Arruda (a Beira-Rio) e o binário XV/Cel.Duarte, que junto com a avenida da FEB formam o eixo estrutural que corta a Grande Cuiabá de norte a sul, do Mapin até o CPA.
Portanto, não se trata de uma área qualquer da cidade, mas sim de uma de suas áreas mais nobres, urbanisticamente falando. Ao contrário do que aconteceu, se fosse de propriedade privada, certamente deveria ser desapropriada, mormente agora com a aprovação pelo governo federal do projeto da calha central para o BRT, proposto pela própria prefeitura, que vai passar por ali, com o prefeito falando inclusive na construção de uma nova ponte no local. Como vai acontecer? Pela sua importância certamente esta interseção precisará de espaço, o máximo possível, para que possam ser acomodados seus raios de curvas, faixas de rolamento, canteiros e calçadas, generosas, permitindo fluidez, conforto e segurança aos transeuntes, pedestres ou motorizados, inclusive, para a circulação exclusiva do novo transporte coletivo.
Dois meses após a venda da rua ter vindo à luz, a prefeitura ainda não explicou a razão da venda. “Pouco movimento” não basta para desafetar uma rua. Só se integrante de um projeto urbanístico para a área, que tivesse sido apresentado antes à população ou, no mínimo, aos vereadores para discussão sobre sua utilidade pública. Até hoje nenhum projeto. Aliás, a situação esdrúxula é bem ilustrada na imprensa pelo vereador Francisco Vuolo ao dizer que o projeto “chegou no Legislativo no mesmo dia, minutos antes de ser colocado em votação”, e pelo vereador Toninho de Souza: "Eu nunca iria votar um projeto desse para vender uma rua. Isso não existe. Se eu fizesse isso, teria que sair preso da Câmara. O projeto que aprovamos não dizia nada sobre venda de rua e, se isso aconteceu, fomos enganados.".
A indignação manifestada pela população em todos os meios de comunicação e a pronta ação do Ministério Público junto ao Judiciário, através do promotor Gérson Barbosa, trazem a certeza de que o assunto não está encerrado e a cidade poderá ainda voltar a dispor de seu valioso patrimônio urbanístico. Este assunto é fundamental para a tão necessária elevação dos padrões urbanísticos de Cuiabá e não pode ser jogado na vala comum dos bate-bocas emocionais das eleições que se avizinham nem, muito menos, ser abandonado no estoque dos escândalos que tanto indignam nossa gente, mas que logo são esquecidos.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 26/01/2010)
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terça-feira, 19 de janeiro de 2010
MATO GROSSO, O NOVO GIGANTE
José Antonio Lemos dos Santos
A recente divulgação dos números da balança comercial do Brasil é mais uma oportunidade de reflexão sobre a nova situação de Mato Grosso no contexto econômico nacional e no quadro de distribuição de poder entre as unidades federativas. Convém registrar este momento de Mato Grosso nem que seja como uma homenagem ao trabalhador mato-grossense de todos os recantos do estado – autônomo, patrão ou empregado - que realmente produziu esses números tão extraordinários, apesar de todas as dificuldades, dos governos e dos políticos, mostrando mais uma vez que Mato Grosso unido é muito mais forte e maior que todas as crises.
Os números são eloqüentes e deveriam ser amplamente divulgados para que os mato-grossenses tenham a perfeita noção da importância para o Brasil de seus esforços. Com US$ 7,7 bilhões de saldo, Mato Grosso foi responsável por 30% do superávit da balança comercial brasileira em 2009. Isto é, Mato Grosso trouxe 1 de cada 3 dólares que o Brasil ganhou no ano passado em suas relações comerciais. Um número imenso, equivalente, por exemplo, ao custo de quase quatro ferrovias ligando Alto Araguaia à Sinop, passando por Rondonópolis, Cuiabá e Lucas, ou duplicar 13 vezes a rodovia no mesmo trajeto, sem excluir ninguém. Esse é o valor que Mato Grosso rendeu ao Brasil no ano passado. Só rendeu menos que Minas Gerais, um estado que tem minas até no nome, e cujo povo, além de simpático e trabalhador, também tem a fama de não abrir a mão nem para dar tchau, muito menos para importar.
O interessante é que ao estudar os dados do MDIC, observa-se que Mato Grosso é superavitário ao menos desde 1998, quando os dados estão disponibilizados, de forma fortemente crescente, tendo superado a casa do US$ 1,0 bi no ano 2001. Somados os saldos de Mato Grosso nestes primeiros 9 anos do século, teríamos acumulado uma bagatela de US$ 33,7 bi. Bilhões de dólares! Aliás, em 2009, um ano difícil, de crise, 10 estados foram deficitários em suas balanças comerciais, São Paulo deu um déficit de US$ 8,0 bi (de US$ 9,0 em 2008), e apenas 3 superaram os US$ 7,0 bilhões em superávit, Mato Grosso entre estes.
O mais extraordinário é que estes números acontecem justamente em um estado completamente abandonado pelos poderes públicos, notadamente pela União, em especial neste período em que dá um show de produção. Um dos únicos estados sem ter uma Base Aérea - ainda que com 1100 quilômetros de fronteira, sem ter um hospital público federal, sem ter um centro de pesquisa da EMBRAPA - embora sendo o maior produtor agropecuário do país, sem ter estradas federais dignas desse nome – ainda que sendo o segundo maior produtor de álcool, produtor de 26 milhões de toneladas de grãos e 26 milhões de cabeças de gado - Mato Grosso assistiu a paralisação das obras da ferrovia que mal atravessou sua fronteira sudeste, viu serem paralisadas as obras de seu principal aeroporto, assistiu à paralisação da termelétrica que lhe garantia quantidade e confiabilidade em seu suprimento energético, viu cortarem o gás do gasoduto que começava a abastecer seus veículos e industrias e agora ainda assiste, incrédulo, a quererem dar fim ao tradicional Hospital Universitário Júlio Muller, tudo sem o menor resmungo de qualquer uma de suas autoridades ou representantes políticos.
Mato Grosso é um gigante recém crescido ainda sem consciência de sua força, com uma população que não percebeu que não precisa mais viver do desprezo e das migalhas da União e nem mais aceitar o silêncio e a omissão daqueles que são pagos para lhe representar à altura. E o gigante precisa aprender a viver como tal, usando seu novo peso federativo também a seu favor na distribuição das riquezas nacionais, em cuja produção tem participação cada vez maior.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 190110)
A recente divulgação dos números da balança comercial do Brasil é mais uma oportunidade de reflexão sobre a nova situação de Mato Grosso no contexto econômico nacional e no quadro de distribuição de poder entre as unidades federativas. Convém registrar este momento de Mato Grosso nem que seja como uma homenagem ao trabalhador mato-grossense de todos os recantos do estado – autônomo, patrão ou empregado - que realmente produziu esses números tão extraordinários, apesar de todas as dificuldades, dos governos e dos políticos, mostrando mais uma vez que Mato Grosso unido é muito mais forte e maior que todas as crises.
Os números são eloqüentes e deveriam ser amplamente divulgados para que os mato-grossenses tenham a perfeita noção da importância para o Brasil de seus esforços. Com US$ 7,7 bilhões de saldo, Mato Grosso foi responsável por 30% do superávit da balança comercial brasileira em 2009. Isto é, Mato Grosso trouxe 1 de cada 3 dólares que o Brasil ganhou no ano passado em suas relações comerciais. Um número imenso, equivalente, por exemplo, ao custo de quase quatro ferrovias ligando Alto Araguaia à Sinop, passando por Rondonópolis, Cuiabá e Lucas, ou duplicar 13 vezes a rodovia no mesmo trajeto, sem excluir ninguém. Esse é o valor que Mato Grosso rendeu ao Brasil no ano passado. Só rendeu menos que Minas Gerais, um estado que tem minas até no nome, e cujo povo, além de simpático e trabalhador, também tem a fama de não abrir a mão nem para dar tchau, muito menos para importar.
O interessante é que ao estudar os dados do MDIC, observa-se que Mato Grosso é superavitário ao menos desde 1998, quando os dados estão disponibilizados, de forma fortemente crescente, tendo superado a casa do US$ 1,0 bi no ano 2001. Somados os saldos de Mato Grosso nestes primeiros 9 anos do século, teríamos acumulado uma bagatela de US$ 33,7 bi. Bilhões de dólares! Aliás, em 2009, um ano difícil, de crise, 10 estados foram deficitários em suas balanças comerciais, São Paulo deu um déficit de US$ 8,0 bi (de US$ 9,0 em 2008), e apenas 3 superaram os US$ 7,0 bilhões em superávit, Mato Grosso entre estes.
O mais extraordinário é que estes números acontecem justamente em um estado completamente abandonado pelos poderes públicos, notadamente pela União, em especial neste período em que dá um show de produção. Um dos únicos estados sem ter uma Base Aérea - ainda que com 1100 quilômetros de fronteira, sem ter um hospital público federal, sem ter um centro de pesquisa da EMBRAPA - embora sendo o maior produtor agropecuário do país, sem ter estradas federais dignas desse nome – ainda que sendo o segundo maior produtor de álcool, produtor de 26 milhões de toneladas de grãos e 26 milhões de cabeças de gado - Mato Grosso assistiu a paralisação das obras da ferrovia que mal atravessou sua fronteira sudeste, viu serem paralisadas as obras de seu principal aeroporto, assistiu à paralisação da termelétrica que lhe garantia quantidade e confiabilidade em seu suprimento energético, viu cortarem o gás do gasoduto que começava a abastecer seus veículos e industrias e agora ainda assiste, incrédulo, a quererem dar fim ao tradicional Hospital Universitário Júlio Muller, tudo sem o menor resmungo de qualquer uma de suas autoridades ou representantes políticos.
Mato Grosso é um gigante recém crescido ainda sem consciência de sua força, com uma população que não percebeu que não precisa mais viver do desprezo e das migalhas da União e nem mais aceitar o silêncio e a omissão daqueles que são pagos para lhe representar à altura. E o gigante precisa aprender a viver como tal, usando seu novo peso federativo também a seu favor na distribuição das riquezas nacionais, em cuja produção tem participação cada vez maior.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 190110)
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terça-feira, 12 de janeiro de 2010
CRIMES SOB AS CHUVAS
José Antonio Lemos dos Santos
Mais uma virada de ano com os brasileiros sofrendo com tragédias urbanas, chorando mortos, amparando sobreviventes, contabilizando prejuízos. Outra vez nossas cidades são pegas despreparadas pelas chuvas que se repetem todos os anos. De novo nossas autoridades se mostram surpresas, uma surpresa injustificável já que conhecem os problemas de suas cidades, principalmente os que envolvem diretamente a vida da população em áreas de risco, justo os mais evidentes.
Logo, contudo, voltaremos à “normalidade” da vida anterior, como se isso fosse possível para aqueles que perderam parentes, perderam o lar arduamente construído, perderam tudo. Antes do próximo ano tudo será esquecido, a vida anterior retomada, até que outra tragédia nos faça chorar de novo. Onde acontecerá? As encostas, as áreas inundáveis e outras zonas de riscos voltam a ser ocupadas, com a aprovação silenciosa de todos e, fingindo não perceber tornamo-nos cúmplices da irresponsabilidade urbana que mata – e mata muito - sob os mais diferentes pretextos, não só nas chuvas. Findas as chuvas, nem as lições ficam para evitar tragédias semelhantes. Não custa, porém, registrar ao menos duas das duras lições que todos os anos se repetem.
A primeira é que a cidade é uma coisa muito séria e não pode mais ser tratada apenas como um objeto político. Grandes ou pequenas, são complexas e devem ser tratadas por profissionais especializados nas diversas áreas de conhecimento que envolvem, com papel especial para o urbanista que tem a visão de seu conjunto. Nem só o político, a quem compete decidir baseado em alternativas técnicas – nem só o técnico, que deve subsidiar o político com as soluções técnicas, mas também com a participação institucional efetiva da sociedade civil organizada.
Outra lição que salta aos olhos é a urgência da execução das leis urbanísticas. Hoje praticamente todas as cidades têm um plano diretor e suas disposições para uso e ocupação do solo urbano, que existem para serem de fato aplicados – é óbvio - e não só para cumprir exigências legais, ou compor a estante do gabinete dos prefeitos. Não é mais admissível se ouvir falar em falta de planejamento como álibi para crimes na gestão do desenvolvimento urbano, em especial no processo da ocupação do solo das cidades. Temos planos e leis de sobra que deveriam estar sendo cumpridas, e não estão. O Plano Diretor de Cuiabá, por exemplo, de 1992, é pioneiro no Brasil no uso de uma Carta Geotécnica, tão falada hoje nos comentários nacionais pós-catástrofe. Para que, se as leis resultantes não são respeitadas?
Repetido o falso argumento da falta de planejamento - sempre alegada entre lágrimas nessas horas – pois que fosse então aplicada a Lei Federal 6766 de 1979, que proíbe em todo o Brasil o parcelamento de áreas inundáveis ou com declividade acima de 30%. Uma só! Quanta gente teria sido salva e dores evitadas se ao menos esta lei fosse aplicada em suas três décadas de existência oficial, mas de criminosa desconsideração na vida real de nossas cidades.
Assistindo nestes dias ao fantástico Avatar em 3D e à belíssima Corrida de Reis, pensei sobre a rápida difusão da tecnologia de ponta em todos os setores da vida, menos na gestão das cidades brasileiras. Apesar de abrigar a maioria da população, nas suas realidades não conseguem usufruir do urbanismo em toda sua ciência e tecnologia. A esperança é a pressão da cidadania a ser um dia puxada por seus segmentos especializados, notadamente as universidades e o sistema Confea/Crea, cobrando a estruturação técnica legalmente competente das administrações e a responsabilização das autoridades, em todos os níveis, pela cruel negligência com a legislação urbanística.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 120110)
Mais uma virada de ano com os brasileiros sofrendo com tragédias urbanas, chorando mortos, amparando sobreviventes, contabilizando prejuízos. Outra vez nossas cidades são pegas despreparadas pelas chuvas que se repetem todos os anos. De novo nossas autoridades se mostram surpresas, uma surpresa injustificável já que conhecem os problemas de suas cidades, principalmente os que envolvem diretamente a vida da população em áreas de risco, justo os mais evidentes.
Logo, contudo, voltaremos à “normalidade” da vida anterior, como se isso fosse possível para aqueles que perderam parentes, perderam o lar arduamente construído, perderam tudo. Antes do próximo ano tudo será esquecido, a vida anterior retomada, até que outra tragédia nos faça chorar de novo. Onde acontecerá? As encostas, as áreas inundáveis e outras zonas de riscos voltam a ser ocupadas, com a aprovação silenciosa de todos e, fingindo não perceber tornamo-nos cúmplices da irresponsabilidade urbana que mata – e mata muito - sob os mais diferentes pretextos, não só nas chuvas. Findas as chuvas, nem as lições ficam para evitar tragédias semelhantes. Não custa, porém, registrar ao menos duas das duras lições que todos os anos se repetem.
A primeira é que a cidade é uma coisa muito séria e não pode mais ser tratada apenas como um objeto político. Grandes ou pequenas, são complexas e devem ser tratadas por profissionais especializados nas diversas áreas de conhecimento que envolvem, com papel especial para o urbanista que tem a visão de seu conjunto. Nem só o político, a quem compete decidir baseado em alternativas técnicas – nem só o técnico, que deve subsidiar o político com as soluções técnicas, mas também com a participação institucional efetiva da sociedade civil organizada.
Outra lição que salta aos olhos é a urgência da execução das leis urbanísticas. Hoje praticamente todas as cidades têm um plano diretor e suas disposições para uso e ocupação do solo urbano, que existem para serem de fato aplicados – é óbvio - e não só para cumprir exigências legais, ou compor a estante do gabinete dos prefeitos. Não é mais admissível se ouvir falar em falta de planejamento como álibi para crimes na gestão do desenvolvimento urbano, em especial no processo da ocupação do solo das cidades. Temos planos e leis de sobra que deveriam estar sendo cumpridas, e não estão. O Plano Diretor de Cuiabá, por exemplo, de 1992, é pioneiro no Brasil no uso de uma Carta Geotécnica, tão falada hoje nos comentários nacionais pós-catástrofe. Para que, se as leis resultantes não são respeitadas?
Repetido o falso argumento da falta de planejamento - sempre alegada entre lágrimas nessas horas – pois que fosse então aplicada a Lei Federal 6766 de 1979, que proíbe em todo o Brasil o parcelamento de áreas inundáveis ou com declividade acima de 30%. Uma só! Quanta gente teria sido salva e dores evitadas se ao menos esta lei fosse aplicada em suas três décadas de existência oficial, mas de criminosa desconsideração na vida real de nossas cidades.
Assistindo nestes dias ao fantástico Avatar em 3D e à belíssima Corrida de Reis, pensei sobre a rápida difusão da tecnologia de ponta em todos os setores da vida, menos na gestão das cidades brasileiras. Apesar de abrigar a maioria da população, nas suas realidades não conseguem usufruir do urbanismo em toda sua ciência e tecnologia. A esperança é a pressão da cidadania a ser um dia puxada por seus segmentos especializados, notadamente as universidades e o sistema Confea/Crea, cobrando a estruturação técnica legalmente competente das administrações e a responsabilização das autoridades, em todos os níveis, pela cruel negligência com a legislação urbanística.
(Publicado no Diário de Cuiabá em 120110)
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terça-feira, 5 de janeiro de 2010
INTENÇÕES CIDADÃS
José Antonio Lemos dos Santos
2010 chega pleno de perspectivas para Mato Grosso e Cuiabá. Entre elas, duas destacam-se em especial pela imperiosidade da participação cidadã, a qual fará a diferença para ambas entre o sucesso e o desastre. Agendá-las para a atenção cidadã ao longo do ano pode ser útil, pois correm o risco de ficar em segundo plano em um ano que traz acontecimentos envolventes como as eleições e a Copa do Mundo na África, além do carnaval e do Campeonato Brasileiro de todos os anos.
O primeiro compromisso é com a preparação da cidade para a Copa do Pantanal, conquista importante, mas que traz a obrigação de ser transformada em realidade de sucesso, não apenas para o evento, mas, principalmente na esperada agregação de qualidade de vida em Cuiabá e Mato Grosso. A Copa do Pantanal, como exaustivamente repetido, antes de um evento internacional importante, para Cuiabá é uma oportunidade, talvez única, da cidade se adequar ao seu novo patamar de desenvolvimento, com obras e serviços estruturais. E a Copa de 2014 já começou com um cronograma exíguo de 5 anos, dos quais agora restam 4, que na verdade são 3, pois em compromissos dessa natureza os cronogramas exigem pelo menos 20% de segurança por eventuais atrasos, muito prováveis em um país infiel à horários e onde os processos são mais importantes que os produtos, expondo obras e serviços à miríades de exigências e possibilidades de embargos. Superada a implantação da Agecopa, neste ano de 2010 os projetos têm que estar definidos, e bem definidos, com recursos financeiros alocados e, iniciados os de maior prazo de execução, tarefa fundamental e intransferível das autoridades. Desde já a participação cidadã é importante, acompanhando tudo atentamente, encontrando formas de apoiar e aplaudir todo o processo, bem como de criticar e cobrar construtivamente, mas de forma efetiva e, sobretudo, inteligente, evitando confusões com as emoções dos debates eleitorais que se avizinham. Dificílimo, convenhamos.
O segundo grande compromisso é com as eleições. Nada mais importante para uma cidade do que ter bons governantes nos diversos poderes, em todos os níveis. Além da responsabilidade de sempre escolher bem os candidatos, este ano traz uma inovação que já vem da eleição passada, decorrente da decisão do STF confirmando que os cargos das eleições proporcionais são dos partidos e não dos candidatos, esclarecendo de vez esse assunto basilar. Com a importante decisão, as eleições proporcionais exigem atenção redobrada, pois deixou claro que nosso voto conta primeiro para os partidos ou coligações, depois é que vai servir para eleger os candidatos, dentre os mais votados por partido ou coligação. Assim, não basta votar em um bom candidato, é preciso também saber se o seu escolhido não tem maus companheiros na lista de candidatos que participa. E é aí que mora o perigo. Nas eleições proporcionais seu voto nunca é perdido: se não elege aquele em quem votou, elege outro, às vezes um que você não queria eleger. Tarefa difícil, mas imprescindível na nossa democracia.
Duas missões dificílimas, contudo extremamente saudáveis e bem-vindas em um momento crucial da história do desenvolvimento mato-grossense e cuiabano. O exercício consciente da democracia é a melhor e, talvez, a única maneira de um povo dirigir seus destinos com reais possibilidades de êxito. A Copa do Pantanal é a chance de ouro para Cuiabá e Mato Grosso darem um salto qualitativo em seus padrões urbanos e na qualidade de vida de seus habitantes. E o poeta me vem à lembrança: “Vam’bora que a hora é essa e vamos ganhar ...”.
(Paublicado no Diário de Cuiabá em 05/01/10)
2010 chega pleno de perspectivas para Mato Grosso e Cuiabá. Entre elas, duas destacam-se em especial pela imperiosidade da participação cidadã, a qual fará a diferença para ambas entre o sucesso e o desastre. Agendá-las para a atenção cidadã ao longo do ano pode ser útil, pois correm o risco de ficar em segundo plano em um ano que traz acontecimentos envolventes como as eleições e a Copa do Mundo na África, além do carnaval e do Campeonato Brasileiro de todos os anos.
O primeiro compromisso é com a preparação da cidade para a Copa do Pantanal, conquista importante, mas que traz a obrigação de ser transformada em realidade de sucesso, não apenas para o evento, mas, principalmente na esperada agregação de qualidade de vida em Cuiabá e Mato Grosso. A Copa do Pantanal, como exaustivamente repetido, antes de um evento internacional importante, para Cuiabá é uma oportunidade, talvez única, da cidade se adequar ao seu novo patamar de desenvolvimento, com obras e serviços estruturais. E a Copa de 2014 já começou com um cronograma exíguo de 5 anos, dos quais agora restam 4, que na verdade são 3, pois em compromissos dessa natureza os cronogramas exigem pelo menos 20% de segurança por eventuais atrasos, muito prováveis em um país infiel à horários e onde os processos são mais importantes que os produtos, expondo obras e serviços à miríades de exigências e possibilidades de embargos. Superada a implantação da Agecopa, neste ano de 2010 os projetos têm que estar definidos, e bem definidos, com recursos financeiros alocados e, iniciados os de maior prazo de execução, tarefa fundamental e intransferível das autoridades. Desde já a participação cidadã é importante, acompanhando tudo atentamente, encontrando formas de apoiar e aplaudir todo o processo, bem como de criticar e cobrar construtivamente, mas de forma efetiva e, sobretudo, inteligente, evitando confusões com as emoções dos debates eleitorais que se avizinham. Dificílimo, convenhamos.
O segundo grande compromisso é com as eleições. Nada mais importante para uma cidade do que ter bons governantes nos diversos poderes, em todos os níveis. Além da responsabilidade de sempre escolher bem os candidatos, este ano traz uma inovação que já vem da eleição passada, decorrente da decisão do STF confirmando que os cargos das eleições proporcionais são dos partidos e não dos candidatos, esclarecendo de vez esse assunto basilar. Com a importante decisão, as eleições proporcionais exigem atenção redobrada, pois deixou claro que nosso voto conta primeiro para os partidos ou coligações, depois é que vai servir para eleger os candidatos, dentre os mais votados por partido ou coligação. Assim, não basta votar em um bom candidato, é preciso também saber se o seu escolhido não tem maus companheiros na lista de candidatos que participa. E é aí que mora o perigo. Nas eleições proporcionais seu voto nunca é perdido: se não elege aquele em quem votou, elege outro, às vezes um que você não queria eleger. Tarefa difícil, mas imprescindível na nossa democracia.
Duas missões dificílimas, contudo extremamente saudáveis e bem-vindas em um momento crucial da história do desenvolvimento mato-grossense e cuiabano. O exercício consciente da democracia é a melhor e, talvez, a única maneira de um povo dirigir seus destinos com reais possibilidades de êxito. A Copa do Pantanal é a chance de ouro para Cuiabá e Mato Grosso darem um salto qualitativo em seus padrões urbanos e na qualidade de vida de seus habitantes. E o poeta me vem à lembrança: “Vam’bora que a hora é essa e vamos ganhar ...”.
(Paublicado no Diário de Cuiabá em 05/01/10)
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terça-feira, 29 de dezembro de 2009
AS ÓTIMAS DE 2009
José Antonio Lemos dos Santos
As festas pelo nascimento do Menino Jesus e fim de ano marcam a transição para um tempo novo, cheio de esperanças, e antes de ser hora de reclamar, criticar e pedir, é tempo de re-conhecer e agradecer todo o legado do ano findo. O mesmo deve acontecer com as cidades e as regiões que lhes dão origem e sentido. No que cabe em um artigo e na memória, tento um resumo do melhor para Cuiabá e Mato Grosso em 2009.
Começando pelo noticiário mais recente, segundo o IBGE o PIB per capita do cuiabano subiu 53,07% entre 2003 e 2007, chegando a R$ 14,99 mil, em forte elevação – ainda permanecendo em décimo lugar entre as capitais brasileiras. Mesmo que mal distribuído, antes é preciso ter o que distribuir, e aí a notícia é importantíssima, refletindo a mudança de Mato Grosso na virada do século, deixando de ser um vazio econômico para se transformar em uma das regiões mais dinâmicas do planeta, com reflexos diretos na sua cidade polarizadora. Mato Grosso no começo de 2009 passa a ser o sétimo maior estado exportador brasileiro e em meados do ano chega ao sexto, quando era responsável por quase todo o superávit comercial brasileiro, um superávit que, acumulado, daria para fazer a estrada de ferro chegar a Cuiabá e daqui seguir para Lucas do Rio Verde, construir um aeroporto digno, duplicar a rodovia Rondonópolis – Posto Gil, e tantas outras coisas que o estado precisa.
Confirmando essa nova situação de Mato Grosso, em novembro a revista Forbes, uma das mais respeitadas revistas internacionais, listou um produtor mato-grossense como um dos homens mais poderosos do mundo. Apenas um para cada 100 milhões de habitantes do planeta! O poder dos alimentos aqui produzidos coloca um conterrâneo na lista, com a vantagem de ser um dos poucos, ao lado do Papa, Steve Jobs, Joseph Blatter e alguns outros, que não estão lá pelo poder bélico, do tráfico de drogas, do terrorismo e outros tipos de violência. Orgulho!
Em maio o vereador João Malheiros anunciou que o Ministério da Defesa e a FAB instalarão uma Base Aérea em Cáceres. Enfim Mato Grosso deixará de ser um dos únicos estados desprovidos de uma Base Aérea, apesar de seus mais de mil quilômetros de fronteira, que, sem proteção aérea é uma das principais passagens para as drogas, armas e veículos roubados. O site da prefeitura municipal e do jornal oeste de Cáceres, reproduziram o meu artigo de outubro sobre o assunto, as únicas repercussões sobre um projeto fundamental para a segurança de Mato Grosso e do Brasil, para a Copa, para as Olimpíadas e para tudo. Será verdade que pessoas importantes temem ter seu sono atrapalhado pelo barulho dos aviões da FAB e por isso não estariam interessados?
No fim do ano o governo do estado reverteu sua postura em relação à termelétrica, adotando-a agora como prioridade nas negociações com o governo federal, afinal é um absurdo um investimento de US$ 1,0 bi (com o gasoduto) permanecer desativado por mais de dois anos. Sem ela Mato Grosso deixou a condição de exportador de energia para ser o campeão nacional dos apagões e dos eletrodomésticos queimados, inaceitável para o maior produtor de alimentos do Brasil.
Ainda tivemos a Copa América de Basquete Feminino, o Panamericano de Karate, o início da internet gratuita em toda Cuiabá e muitas outras coisas ótimas, mesmo em crise mundial. Mas a síntese das boas notícias de 2009, foi a conquista da Copa do Pantanal por Mato Grosso. Sem falar na oportunidade de ouro para a alavancagem de obras e serviços estruturantes para sua capital, essa conquista foi antes de tudo a auto-afirmação de um estado e um povo que sempre foi periferia e fim-de-fila, mas que em um novo estágio de desenvolvimento atreveu-se pela primeira vez entrar em uma disputa de gente grande. E venceu!
(Publicafo no Diário de Cuiabá em 29/12/2009)
As festas pelo nascimento do Menino Jesus e fim de ano marcam a transição para um tempo novo, cheio de esperanças, e antes de ser hora de reclamar, criticar e pedir, é tempo de re-conhecer e agradecer todo o legado do ano findo. O mesmo deve acontecer com as cidades e as regiões que lhes dão origem e sentido. No que cabe em um artigo e na memória, tento um resumo do melhor para Cuiabá e Mato Grosso em 2009.
Começando pelo noticiário mais recente, segundo o IBGE o PIB per capita do cuiabano subiu 53,07% entre 2003 e 2007, chegando a R$ 14,99 mil, em forte elevação – ainda permanecendo em décimo lugar entre as capitais brasileiras. Mesmo que mal distribuído, antes é preciso ter o que distribuir, e aí a notícia é importantíssima, refletindo a mudança de Mato Grosso na virada do século, deixando de ser um vazio econômico para se transformar em uma das regiões mais dinâmicas do planeta, com reflexos diretos na sua cidade polarizadora. Mato Grosso no começo de 2009 passa a ser o sétimo maior estado exportador brasileiro e em meados do ano chega ao sexto, quando era responsável por quase todo o superávit comercial brasileiro, um superávit que, acumulado, daria para fazer a estrada de ferro chegar a Cuiabá e daqui seguir para Lucas do Rio Verde, construir um aeroporto digno, duplicar a rodovia Rondonópolis – Posto Gil, e tantas outras coisas que o estado precisa.
Confirmando essa nova situação de Mato Grosso, em novembro a revista Forbes, uma das mais respeitadas revistas internacionais, listou um produtor mato-grossense como um dos homens mais poderosos do mundo. Apenas um para cada 100 milhões de habitantes do planeta! O poder dos alimentos aqui produzidos coloca um conterrâneo na lista, com a vantagem de ser um dos poucos, ao lado do Papa, Steve Jobs, Joseph Blatter e alguns outros, que não estão lá pelo poder bélico, do tráfico de drogas, do terrorismo e outros tipos de violência. Orgulho!
Em maio o vereador João Malheiros anunciou que o Ministério da Defesa e a FAB instalarão uma Base Aérea em Cáceres. Enfim Mato Grosso deixará de ser um dos únicos estados desprovidos de uma Base Aérea, apesar de seus mais de mil quilômetros de fronteira, que, sem proteção aérea é uma das principais passagens para as drogas, armas e veículos roubados. O site da prefeitura municipal e do jornal oeste de Cáceres, reproduziram o meu artigo de outubro sobre o assunto, as únicas repercussões sobre um projeto fundamental para a segurança de Mato Grosso e do Brasil, para a Copa, para as Olimpíadas e para tudo. Será verdade que pessoas importantes temem ter seu sono atrapalhado pelo barulho dos aviões da FAB e por isso não estariam interessados?
No fim do ano o governo do estado reverteu sua postura em relação à termelétrica, adotando-a agora como prioridade nas negociações com o governo federal, afinal é um absurdo um investimento de US$ 1,0 bi (com o gasoduto) permanecer desativado por mais de dois anos. Sem ela Mato Grosso deixou a condição de exportador de energia para ser o campeão nacional dos apagões e dos eletrodomésticos queimados, inaceitável para o maior produtor de alimentos do Brasil.
Ainda tivemos a Copa América de Basquete Feminino, o Panamericano de Karate, o início da internet gratuita em toda Cuiabá e muitas outras coisas ótimas, mesmo em crise mundial. Mas a síntese das boas notícias de 2009, foi a conquista da Copa do Pantanal por Mato Grosso. Sem falar na oportunidade de ouro para a alavancagem de obras e serviços estruturantes para sua capital, essa conquista foi antes de tudo a auto-afirmação de um estado e um povo que sempre foi periferia e fim-de-fila, mas que em um novo estágio de desenvolvimento atreveu-se pela primeira vez entrar em uma disputa de gente grande. E venceu!
(Publicafo no Diário de Cuiabá em 29/12/2009)
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terça-feira, 22 de dezembro de 2009
O IPDU E A CIDADE
José Antonio Lemos dos Santos
Enquanto preparava o artigo da terça-feira passada, ouvia no radio uma entrevista do prefeito de Cuiabá a Edvaldo Ribeiro e Dirceu Carlino, na expectativa de alguma explicação sobre o sigilo no processo de desafetação e venda da rua Tuffik Affi, sobre o qual escrevia. Apesar de entrevistado pelos dois ícones da radiofonia cuiabana, o prefeito não explicou o porque do segredo, limitando-se a falar sobre o direito da prefeitura vender bens públicos, sabido de todos, desde que – é claro – a venda cumpra a lei, à luz dos pilares constitucionais da administração pública, entre estes a publicidade.
Habilíssimo na arte de falar e do debate, o prefeito abordou muitos assuntos, dentre as quais dois chamaram-me a atenção. O primeiro é que ao tratar do direito da prefeitura vender bens públicos, citou como exemplo a possibilidade da prefeitura vender sua atual sede, o Palácio Alencastro. Talvez só tenha criado uma nova polêmica para desviar as atenções da venda da rua Tuffik Affi, que era e é o assunto em discussão. Ou não, como diria o Caetano Veloso, podendo de fato ser um projeto do nosso alcaide, caso em que convém destacar que o centro histórico não pode ficar sem a sede do poder municipal, mas, por outro lado, que a atual sede já não comporta os órgãos da administração municipal, tema que merece abalizada discussão especial e não uma nova surpresa. O outro assunto que me atraiu foi o projeto de disponibilização gratuita da internet em toda a cidade, serviço já disponível, inclusive, em alguns bairros. Sensacional. Embora sem maiores detalhes, mais que um projeto de inclusão social, parece-me um projeto pioneiro de inclusão de toda uma cidade na grande rede digital globalizada, sem a qual não se pode hoje sequer pensar o futuro de qualquer pessoa ou de qualquer cidade do país e do mundo.
Entretanto, ao tecer merecidos elogios à atual superintendente do IPDU disse que aquele órgão só passou a existir em sua administração, numa grande injustiça a um órgão com duas décadas de serviços prestados. Um de seus idealizadores, lembro que o IPDU foi criado para enxergar e planejar a cidade como um todo, articulando os diversos planos setoriais em um conjunto harmônico, sendo responsável por uma série de projetos fundamentais para a cidade, muitos dos quais sendo implementados ou reavaliados na atual administração, como a Avenida das Torres e as calhas centrais exclusivas para ônibus de 1999 ou os viadutos da Miguel Sutil, de 2001. Como esquecer o Plano Diretor de 1992 – pioneiro no Brasil no uso de uma Carta Geotécnica - e os Códigos Urbanísticos? E os sempre aguardados volumes do “Perfil Sócio-Econômico Municipal”? Como esquecer o Parque Mãe Bonifácia, talvez o projeto de maior impacto urbano em Cuiabá? E o Parque Zé Bolofrô? E a atual Feira do Porto – de dar inveja a muitas cidades do Brasil – o Museu do Rio, o querido Aquário Municipal, o Moitará, a nova Avenida Beira-Rio, o Binário da XV, a duplicação do viaduto da Rodoviária e da Avenida República do Líbano? E o primeiro mapa digitalizado de Cuiabá? E tantos e tantos projetos não realizados como a Avenida Parque do Barbado, hoje tão necessária, e a Galeria Sul-americana que redescobriu a Caixa d’Água Velha, permitindo à atual administração a criação do belo Museu hoje lá instalado? E as leis como a do Perímetro Urbano, dos Condomínios Fechados e a do Abairramento – esta exigindo atualização urgente, e outras leis urbanísticas fundamentais, como as da Hierarquização Viária e a do Uso e Ocupação do Solo Urbano? Nesta rápida amostragem, um pouco do que o IPDU já fez, do que está fazendo e do muito que ainda poderá fazer por Cuiabá, em especial às vésperas da Copa do Pantanal e do tricentenário da cidade.
(Pubicado pelo Diário de Cuiabá em 22/12/2009)
Enquanto preparava o artigo da terça-feira passada, ouvia no radio uma entrevista do prefeito de Cuiabá a Edvaldo Ribeiro e Dirceu Carlino, na expectativa de alguma explicação sobre o sigilo no processo de desafetação e venda da rua Tuffik Affi, sobre o qual escrevia. Apesar de entrevistado pelos dois ícones da radiofonia cuiabana, o prefeito não explicou o porque do segredo, limitando-se a falar sobre o direito da prefeitura vender bens públicos, sabido de todos, desde que – é claro – a venda cumpra a lei, à luz dos pilares constitucionais da administração pública, entre estes a publicidade.
Habilíssimo na arte de falar e do debate, o prefeito abordou muitos assuntos, dentre as quais dois chamaram-me a atenção. O primeiro é que ao tratar do direito da prefeitura vender bens públicos, citou como exemplo a possibilidade da prefeitura vender sua atual sede, o Palácio Alencastro. Talvez só tenha criado uma nova polêmica para desviar as atenções da venda da rua Tuffik Affi, que era e é o assunto em discussão. Ou não, como diria o Caetano Veloso, podendo de fato ser um projeto do nosso alcaide, caso em que convém destacar que o centro histórico não pode ficar sem a sede do poder municipal, mas, por outro lado, que a atual sede já não comporta os órgãos da administração municipal, tema que merece abalizada discussão especial e não uma nova surpresa. O outro assunto que me atraiu foi o projeto de disponibilização gratuita da internet em toda a cidade, serviço já disponível, inclusive, em alguns bairros. Sensacional. Embora sem maiores detalhes, mais que um projeto de inclusão social, parece-me um projeto pioneiro de inclusão de toda uma cidade na grande rede digital globalizada, sem a qual não se pode hoje sequer pensar o futuro de qualquer pessoa ou de qualquer cidade do país e do mundo.
Entretanto, ao tecer merecidos elogios à atual superintendente do IPDU disse que aquele órgão só passou a existir em sua administração, numa grande injustiça a um órgão com duas décadas de serviços prestados. Um de seus idealizadores, lembro que o IPDU foi criado para enxergar e planejar a cidade como um todo, articulando os diversos planos setoriais em um conjunto harmônico, sendo responsável por uma série de projetos fundamentais para a cidade, muitos dos quais sendo implementados ou reavaliados na atual administração, como a Avenida das Torres e as calhas centrais exclusivas para ônibus de 1999 ou os viadutos da Miguel Sutil, de 2001. Como esquecer o Plano Diretor de 1992 – pioneiro no Brasil no uso de uma Carta Geotécnica - e os Códigos Urbanísticos? E os sempre aguardados volumes do “Perfil Sócio-Econômico Municipal”? Como esquecer o Parque Mãe Bonifácia, talvez o projeto de maior impacto urbano em Cuiabá? E o Parque Zé Bolofrô? E a atual Feira do Porto – de dar inveja a muitas cidades do Brasil – o Museu do Rio, o querido Aquário Municipal, o Moitará, a nova Avenida Beira-Rio, o Binário da XV, a duplicação do viaduto da Rodoviária e da Avenida República do Líbano? E o primeiro mapa digitalizado de Cuiabá? E tantos e tantos projetos não realizados como a Avenida Parque do Barbado, hoje tão necessária, e a Galeria Sul-americana que redescobriu a Caixa d’Água Velha, permitindo à atual administração a criação do belo Museu hoje lá instalado? E as leis como a do Perímetro Urbano, dos Condomínios Fechados e a do Abairramento – esta exigindo atualização urgente, e outras leis urbanísticas fundamentais, como as da Hierarquização Viária e a do Uso e Ocupação do Solo Urbano? Nesta rápida amostragem, um pouco do que o IPDU já fez, do que está fazendo e do muito que ainda poderá fazer por Cuiabá, em especial às vésperas da Copa do Pantanal e do tricentenário da cidade.
(Pubicado pelo Diário de Cuiabá em 22/12/2009)
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terça-feira, 15 de dezembro de 2009
A ENTRADA DA CIDADE (III)
José Antonio Lemos dos Santos
Lembro de meu saudoso pai certa vez recebendo um troco em cédulas, como ele chamava as notas de dinheiro, e após contá-las rapidamente – era exímio nisso, pois como bancário exerceu a função de caixa – sentiu a falta de algo como 1 real de hoje. Informou ao atendente que estava faltando troco, recebendo a resposta de que faltava “miúdo” e que aquela quantia não ia fazer falta a ninguém. Meu pai, que não era de discutir com ninguém, explicou que deveria então ter sido informado ao ser lhe passado o troco e que poderia dar 10 ou 100 vezes aquela quantia desde respeitosa e justificadamente pedido, mas que não abriria mão de um centavo sendo enganado. A lembrança vem a propósito da surpreendente notícia da venda da rua Tuffik Affi pela prefeitura municipal, e no seu bojo uma outra informação mais surpreendente ainda, de que a área entre essa rua e a avenida Cel. Duarte, próximo ao Shopping Popular, já havia sido vendida antes. Como meu pai, neste caso também me sinto enganado, ludibriado como cidadão. Não se trata só de uma rua, mas de uma área que marca a entrada da cidade e a intersecção problemática de duas avenidas estruturais, uma área nobilíssima em termos urbanísticos, histórica pela foz do Prainha e pela proximidade das pedras do Ikuiapá, e sua desafetação deveria ser submetida ao conhecimento e à ampla discussão pública.
Este é o quarto artigo que escrevo este ano sobre aquela área, o terceiro com o mesmo nome. Os três primeiros escritos em 7, 14 e 21 de julho. No dia seguinte ao primeiro artigo o site Midianews de Cuiabá informava que a Prefeitura “tem um projeto para aquela área e que o principal entrave à sua execução seriam duas garagens de veículos que “teimam” em permanecer no local.”. Nenhuma referência ao projeto de desafetação da rua Tuffik Affi, que já se encontrava na Câmara de Cuiabá, onde seria aprovada no dia 10, dois dias depois. Pior, nenhuma referencia ao terreno lindeiro que já havia sido vendido antes, fato que só agora vem à luz pública. Nem qualquer correção posterior da notícia. Já que havia uma discussão pública sobre a transformação daquela área em uma entrada digna de uma metrópole, cabia a prefeitura informar ao menos que a área já havia sido vendida. Ou não podia, pois ainda estava em andamento uma outra venda, a da rua? E o bobó aqui ainda escreveu mais dois artigos, e muitos leitores perderam seu tempo com e-mails e cartas do leitor. Que publicidade é essa, exigida pela Constituição como um dos pilares da administração pública, que só ao final dos processos o público e toda a imprensa tomam conhecimento, surpresos, sobre o que foi feito com a coisa pública?
Ainda que confiando nas imediatas manifestações do promotor de Justiça Ambiental, Gérson Barbosa, escrevo mais um artigo, desta feita só para desopilar o fígado, que me perdoem os leitores. A prefeitura vendeu o destino daquela importante área, e por seu novo dono, no seu direito, o assunto está decidido: será um estacionamento de caminhões para carga e descarga de mercadorias. Segundo o procurador municipal disse à imprensa, “aquela rua não era tão essencial, em função do tráfego insignificante para a região”, como se a área de uma rua não pudesse ter uma outra finalidade urbanística. Houve parecer técnico do IPDU, órgão que trata da cidade como um todo? Foi ouvido o CMDE antes do assunto ir para a Câmara? Sonhamos com uma entrada digna para Cuiabá, com sua interseção viária bem resolvida, com canteiros e ornatos citadinos, talvez até um belo monumento, capaz de bem recepcionar o turista nacional e internacional causando-lhe uma boa primeira impressão, que é a que fica. Mas, recorrendo ao poeta, de que adianta cantar os mares e o firmamento se o que nos resta é o beco?
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 15/12/2009)
Lembro de meu saudoso pai certa vez recebendo um troco em cédulas, como ele chamava as notas de dinheiro, e após contá-las rapidamente – era exímio nisso, pois como bancário exerceu a função de caixa – sentiu a falta de algo como 1 real de hoje. Informou ao atendente que estava faltando troco, recebendo a resposta de que faltava “miúdo” e que aquela quantia não ia fazer falta a ninguém. Meu pai, que não era de discutir com ninguém, explicou que deveria então ter sido informado ao ser lhe passado o troco e que poderia dar 10 ou 100 vezes aquela quantia desde respeitosa e justificadamente pedido, mas que não abriria mão de um centavo sendo enganado. A lembrança vem a propósito da surpreendente notícia da venda da rua Tuffik Affi pela prefeitura municipal, e no seu bojo uma outra informação mais surpreendente ainda, de que a área entre essa rua e a avenida Cel. Duarte, próximo ao Shopping Popular, já havia sido vendida antes. Como meu pai, neste caso também me sinto enganado, ludibriado como cidadão. Não se trata só de uma rua, mas de uma área que marca a entrada da cidade e a intersecção problemática de duas avenidas estruturais, uma área nobilíssima em termos urbanísticos, histórica pela foz do Prainha e pela proximidade das pedras do Ikuiapá, e sua desafetação deveria ser submetida ao conhecimento e à ampla discussão pública.
Este é o quarto artigo que escrevo este ano sobre aquela área, o terceiro com o mesmo nome. Os três primeiros escritos em 7, 14 e 21 de julho. No dia seguinte ao primeiro artigo o site Midianews de Cuiabá informava que a Prefeitura “tem um projeto para aquela área e que o principal entrave à sua execução seriam duas garagens de veículos que “teimam” em permanecer no local.”. Nenhuma referência ao projeto de desafetação da rua Tuffik Affi, que já se encontrava na Câmara de Cuiabá, onde seria aprovada no dia 10, dois dias depois. Pior, nenhuma referencia ao terreno lindeiro que já havia sido vendido antes, fato que só agora vem à luz pública. Nem qualquer correção posterior da notícia. Já que havia uma discussão pública sobre a transformação daquela área em uma entrada digna de uma metrópole, cabia a prefeitura informar ao menos que a área já havia sido vendida. Ou não podia, pois ainda estava em andamento uma outra venda, a da rua? E o bobó aqui ainda escreveu mais dois artigos, e muitos leitores perderam seu tempo com e-mails e cartas do leitor. Que publicidade é essa, exigida pela Constituição como um dos pilares da administração pública, que só ao final dos processos o público e toda a imprensa tomam conhecimento, surpresos, sobre o que foi feito com a coisa pública?
Ainda que confiando nas imediatas manifestações do promotor de Justiça Ambiental, Gérson Barbosa, escrevo mais um artigo, desta feita só para desopilar o fígado, que me perdoem os leitores. A prefeitura vendeu o destino daquela importante área, e por seu novo dono, no seu direito, o assunto está decidido: será um estacionamento de caminhões para carga e descarga de mercadorias. Segundo o procurador municipal disse à imprensa, “aquela rua não era tão essencial, em função do tráfego insignificante para a região”, como se a área de uma rua não pudesse ter uma outra finalidade urbanística. Houve parecer técnico do IPDU, órgão que trata da cidade como um todo? Foi ouvido o CMDE antes do assunto ir para a Câmara? Sonhamos com uma entrada digna para Cuiabá, com sua interseção viária bem resolvida, com canteiros e ornatos citadinos, talvez até um belo monumento, capaz de bem recepcionar o turista nacional e internacional causando-lhe uma boa primeira impressão, que é a que fica. Mas, recorrendo ao poeta, de que adianta cantar os mares e o firmamento se o que nos resta é o beco?
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 15/12/2009)
quinta-feira, 10 de dezembro de 2009
IMITAR, NÃO DIVIDIR
José Antonio lemos dos Santos
No começo deste ano o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão do governo brasileiro, divulgou o trabalho “Custos de Funcionamento das Unidades Federativas Brasileiras e suas Implicações sobre a Criação de Novos Estados”, encomendado pela Câmara dos Deputados visando subsidiar decisões sobre propostas de divisão de estados em tramitação na Casa. Com rara objetividade o trabalho chega a uma estimativa de custo mínimo de funcionamento por ano para as unidades federativas no valor de R$ 832,14 milhões, somados a R$ 564,89 multiplicados pela população e mais R$ 0,075 multiplicados novamente pela população. Cada proposta de estado só seria viável com uma previsão de arrecadação superior a esse custo.
Na época tive a curiosidade de aplicar esta fórmula aos atuais estados e Distrito Federal, chegando a resultados reveladores de situações que o bom senso sempre suspeitou, mas que nunca vi comprovadas. Primeiro, dentre os estados atuais ainda existem alguns que mal arrecadam o equivalente ao seu custo de funcionamento e, pior, destes, dois não se auto-sustentam, ainda que antigos na federação. Outra revelação é que entre os que mal se sustentam, todos são de dimensões bem inferiores a Mato Grosso, e mais, apenas 8 das atuais unidades federativas arrecadam além de 2 vezes o seu custo mínimo e destes, apenas 3 superam a 3 vezes. Ou no popular, a maioria dos estados brasileiros malemá se sustentam.
Trago de volta o assunto pois querem ressuscitar aquele projeto de redivisão territorial do país, incluindo Mato Grosso, que foi posto em hibernação no Congresso Nacional diante da vergonha de tantos escândalos políticos por este Brasil afora. O autor do projeto se baseia na falácia, entre outras, que menores territórios ajudam o desenvolvimento, esquecendo do exemplo contrário de seu próprio estado, Roraima, que apesar de ter menos de um quarto do território mato-grossense, situa-se entre aqueles que mal conseguem arrecadar o suficiente à própria subsistência após quase 70 anos de existência.
Em contraposição aparece Mato Grosso com uma das melhores relações entre arrecadação e custos, ao lado de Minas Gerais, em sexto lugar com 2,2 de índice. Isso mostra que Mato Grosso, após séculos comendo o pão que o diabo amassou, hoje além de ter a capacidade de custear sua própria subsistência – não quer dizer que o faça - ainda lhe sobrariam recursos da ordem de 120% desse valor, para investir no desenvolvimento e na qualidade de vida de sua gente, um valioso superávit que não pode ser desperdiçado bancando novas estruturas governamentais e uma nova carga de políticos. O que temos já está bom.
Em um país onde os escândalos políticos se sucedem e se superam exponencialmente, que gasta em impostos 40% do que produz basicamente para bancar suas máquinas político-administrativas, certamente o que não falta são estruturas governamentais, em todos os seus níveis e poderes. Redivisões territoriais implicam na multiplicação dessas estruturas, verdadeiras pirâmides de cargos públicos bancadas pelo povo e que só interessam à classe política. No século XXI, na era do avião a jato, asfalto, comunicações via satélite, internet, Mato Grosso mostra ter a dimensão territorial exata para o êxito. Colecionando títulos nacionais de maior produtor de grãos, de algodão, de biodiesel, de maior rebanho bovino, de estar entre os maiores em diversos outros tipos de produção e entre os maiores exportadores do país, Mato Grosso mostra que o Brasil não precisa de redivisões, de mais governos ou de mais políticos e que – ainda com muito a melhorar, corrigir e mesmo execrar – é um estado a ser imitado, e não dividido.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá no dia 10/12/2009, excepcionalmente numa quinta-feira)
No começo deste ano o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão do governo brasileiro, divulgou o trabalho “Custos de Funcionamento das Unidades Federativas Brasileiras e suas Implicações sobre a Criação de Novos Estados”, encomendado pela Câmara dos Deputados visando subsidiar decisões sobre propostas de divisão de estados em tramitação na Casa. Com rara objetividade o trabalho chega a uma estimativa de custo mínimo de funcionamento por ano para as unidades federativas no valor de R$ 832,14 milhões, somados a R$ 564,89 multiplicados pela população e mais R$ 0,075 multiplicados novamente pela população. Cada proposta de estado só seria viável com uma previsão de arrecadação superior a esse custo.
Na época tive a curiosidade de aplicar esta fórmula aos atuais estados e Distrito Federal, chegando a resultados reveladores de situações que o bom senso sempre suspeitou, mas que nunca vi comprovadas. Primeiro, dentre os estados atuais ainda existem alguns que mal arrecadam o equivalente ao seu custo de funcionamento e, pior, destes, dois não se auto-sustentam, ainda que antigos na federação. Outra revelação é que entre os que mal se sustentam, todos são de dimensões bem inferiores a Mato Grosso, e mais, apenas 8 das atuais unidades federativas arrecadam além de 2 vezes o seu custo mínimo e destes, apenas 3 superam a 3 vezes. Ou no popular, a maioria dos estados brasileiros malemá se sustentam.
Trago de volta o assunto pois querem ressuscitar aquele projeto de redivisão territorial do país, incluindo Mato Grosso, que foi posto em hibernação no Congresso Nacional diante da vergonha de tantos escândalos políticos por este Brasil afora. O autor do projeto se baseia na falácia, entre outras, que menores territórios ajudam o desenvolvimento, esquecendo do exemplo contrário de seu próprio estado, Roraima, que apesar de ter menos de um quarto do território mato-grossense, situa-se entre aqueles que mal conseguem arrecadar o suficiente à própria subsistência após quase 70 anos de existência.
Em contraposição aparece Mato Grosso com uma das melhores relações entre arrecadação e custos, ao lado de Minas Gerais, em sexto lugar com 2,2 de índice. Isso mostra que Mato Grosso, após séculos comendo o pão que o diabo amassou, hoje além de ter a capacidade de custear sua própria subsistência – não quer dizer que o faça - ainda lhe sobrariam recursos da ordem de 120% desse valor, para investir no desenvolvimento e na qualidade de vida de sua gente, um valioso superávit que não pode ser desperdiçado bancando novas estruturas governamentais e uma nova carga de políticos. O que temos já está bom.
Em um país onde os escândalos políticos se sucedem e se superam exponencialmente, que gasta em impostos 40% do que produz basicamente para bancar suas máquinas político-administrativas, certamente o que não falta são estruturas governamentais, em todos os seus níveis e poderes. Redivisões territoriais implicam na multiplicação dessas estruturas, verdadeiras pirâmides de cargos públicos bancadas pelo povo e que só interessam à classe política. No século XXI, na era do avião a jato, asfalto, comunicações via satélite, internet, Mato Grosso mostra ter a dimensão territorial exata para o êxito. Colecionando títulos nacionais de maior produtor de grãos, de algodão, de biodiesel, de maior rebanho bovino, de estar entre os maiores em diversos outros tipos de produção e entre os maiores exportadores do país, Mato Grosso mostra que o Brasil não precisa de redivisões, de mais governos ou de mais políticos e que – ainda com muito a melhorar, corrigir e mesmo execrar – é um estado a ser imitado, e não dividido.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá no dia 10/12/2009, excepcionalmente numa quinta-feira)
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