"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



segunda-feira, 27 de julho de 2020

PARA ONDE FOI SEU VOTO?


José Antonio Lemos dos Santos
     Na eleição de 2016 que definiu a atual composição da Câmara Municipal de Cuiabá, dos 283.121 votos válidos dados aos candidatos apenas 86.885 foram diretamente nos eleitos, menos de 1 (31%) em cada 3 votos! Ou seja, 86.885 eleitores votaram nos eleitos e 196.236 eleitores votaram em outros candidatos. Considerado todo o eleitorado de Cuiabá na época com 415.098 eleitores a situação foi pior pois de cada 5 eleitores cuiabanos apenas 1 (21%) votou nos eleitos, ou seja, um total de 328.213 (79%) escolheu faltar as eleições, anular seu voto, votar em branco ou em outros candidatos, não nos eleitos. Se fosse futebol, os eleitos na verdade teriam sido goleados por 5 x 1!
     É injusto dizer que o brasileiro não sabe votar, ao menos nas condições atuais em que se realizam as eleições proporcionais, e neste ano de novo temos eleições para vereadores. Importantes, elas definem a base do quadro político nacional, a sustentação dos caciques que os apadrinham. Nos resultados das últimas eleições é nítido que o eleitor tem evitado os maus políticos. Falta-lhe, entretanto, conhecer o cerne das eleições proporcionais: as listas dos candidatos por partido.
     Por querer ou não, estas listas no Brasil não são facilitadas ao conhecimento do eleitor e nas eleições proporcionais o voto nunca é perdido. Ao escolher um candidato, seu voto é contado primeiro para a lista ou “chapa” do partido do candidato escolhido, definindo o número de cadeiras que este partido terá com base no quociente eleitoral, que é o quanto “custa” em número de votos cada cadeira nos legislativos. Os mais votados de cada lista são os eleitos para ocupá-las. Só aqui é contado o voto no candidato. Ao escolher um candidato, sem saber escolhe uma lista cuja composição ignora, e assim em sua maioria elege outro. Trágico, o quociente eleitoral da eleição passada foi 11.939 votos e o candidato mais votado teve 5.620 votos, o menos, 1.938. Em suma, todos usaram de votos dados a outros candidatos para se elegerem, o que, quase certo foi o caso do seu. Quem seu voto elegeu?
     Nestas eleições não teremos as famigeradas “coligações”, o que facilitará o voto. Mesmo assim, caro eleitor, antes de nos comprometer com o candidato parente, amigo, colega ou compadre é importante aguardar a oficialização das candidaturas pela Justiça Eleitoral e torcer para que ela te facilite as listas dos candidatos por partido, ao menos em seu site. Ou que algum partido aceite o desafio de orgulhosamente publicar sua lista de candidatos, por exemplo no verso dos “santinhos” de propaganda dos candidatos. O voto é a mais poderosa arma da cidadania, não vamos continuar a usá-lo contra nós mesmos.
     Sabemos que a regra para os candidatos é começar cedo, isto é, chegar nos eleitores antes de outros para “beber água limpa”. Em geral o assédio começa pelos familiares, amigos, colegas de trabalho ou dos bancos escolares, em resumo, aquele conjunto de pessoas supostamente formador de seu capital político pessoal. Com base nesses laços pessoais arrancam compromissos de difícil escapatória futura, vários amarrados em respostas ditas para não desagradar. Aí mora o perigo.     
     Sem duvidar da qualidade dos eleitos e nem colocar alguma culpa neles pela situação, tem algo muito errado em nossas eleições proporcionais, e não é o eleitor. Certo que nas democracias mais avançadas não há mal no eleitor votar em um e eleger outro, a diferença é que nelas o eleitor sabe quem pode ser eleito com seu voto. Aqui não, o eleitor às cegas tenta acertar seu voto em uma lista oculta, habilmente montada pelos caciques para se perpetuarem no poder. Além de enganado, o eleitor paga a conta e nem pode cobrar do eleito pois a maioria não sabe quem elegeu. E ainda leva a culpa.


terça-feira, 21 de julho de 2020

DESAFIO AOS PARTIDOS


Charge: Prof.. José Maria Andrade
José Antonio Lemos dos Santos
     Estamos perto de novas eleições municipais, confirmadas para os dias 15 e 29 de novembro deste ano. Mesmo sem aprovação das convenções partidárias, desde antes da pandemia já começaram a ser esboçadas algumas candidaturas. A regra em especial para os novos candidatos é começar cedo para “beber água limpa”, isto é, chegar nos eleitores antes que outros eventuais candidatos. De um modo geral começam buscando familiares, colegas de trabalho, velhos colegas até então esquecidos dos bancos escolares, amigos, em suma, aquele conjunto de pessoas potencialmente formador do que seria seu capital político pessoal. Com base nesses laços pessoais acabam arrancando compromissos amarrados em “fios de bigode” de difícil escapatória futura, vários sacramentados em frases ditas sem muito pensar às vezes para não ser desagradável ou para evitar uma conversa chata. Aí mora o perigo.
     Em 2017 houve a tão necessária reforma política esperada para ser a mãe de todas as reformas, mas que acabou parindo um rato. Em relação ao voto em si quase tudo ficou como antes, e este ano abrange a escolha para os cargos de vereador e prefeito em eleições proporcionais e majoritárias, que continuam para o eleitor basicamente do mesmo jeito, só que sem aquela aberração das coligações dos partidos para as eleições do legislativo. Já foi um importante passo. Sabemos que os dois tipos de eleição são necessários e existem nas democracias mais avançadas do mundo, uma privilegiando o candidato individual e a outra a proporção em que se distribuem as diversas correntes ideológico-partidárias no eleitorado.
     O voto majoritário é simples, para prefeito vencerá o candidato que tiver mais votos. Já o voto proporcional não é tão simples assim. Nelas vota-se em listas de candidatos oferecidas pelos partidos, através dos votos dados diretos aos partidos ou aos candidatos nelas constantes, agora sem coligações. Nas eleições proporcionais busca-se a distribuição dos eleitos na proporção da representatividade dos partidos no universo eleitoral. Ocupam as cadeiras os candidatos mais votados de cada lista, a maioria dos quais não é escolhida diretamente pelo eleitor. Os outros ficam como suplentes. Assim, o cidadão escolhe um candidato e seu voto pode eleger outro. Esta é a beleza das eleições proporcionais, mas também seu mal entre nós pois as listas dos candidatos por partido não são facilitadas ao conhecimento do eleitor. Será que nestas eleições algum partido terá a coragem de publicar sua lista com os nomes que submetem à escolha do eleitorado?
     Muitos pensam que as eleições para vereador são as menos importantes. Fakenews! Ela forma a base onde se apoia a política nacional. Votando em listas desconhecidas, definidas e escondidas pelos caciques partidários, o eleitor escolhe um candidato e pode eleger sem querer outro, mesmo um que queira banir da vida pública. E assim são mantidos aqueles de sempre. O povo é enganado, forçado a eleger e legitimar com seu próprio voto muitos dos que não queria eleitos ou reeleitos. É ludibriado, paga a conta e ainda leva a culpa.
     Nestas eleições proporcionais a consciência do eleitor precisa estar mais alerta. Antes de nos comprometer com o candidato parente, amigo, colega ou compadre é importante aguardar a oficialização das candidaturas e torcer para que a Justiça Eleitoral facilite ao eleitor as listas dos candidatos por partido, incrementando a representatividade das eleições. Ou que algum partido aceite o desafio de orgulhosamente publicar a sua. Podia ser no verso dos “santinhos” de propaganda dos próprios candidatos. O verdadeiro amigo candidato entenderá. O voto é a mais poderosa arma da cidadania. Cuidemos dele.

segunda-feira, 6 de julho de 2020

ADENSAMENTO URBANO PÓS-PANDEMIA

Bares fechados, restaurantes abertos para almoço e rodízio de ...
                        Vazios urbanos (Foto: Olhar Direto)
José Antonio Lemos dos Santos
     Preconizado nas últimas décadas pelo Urbanismo e agora contestado pela pandemia da Covid-19, o adensamento urbano foi um dos destaques em recente discussão virtual promovida pela Academia de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso – AAU/MT. Esta discussão envolvendo saúde e desenvolvimento urbano vem pelo menos desde meados do século XIX, com o avanço da Revolução Industrial e o surgimento das primeiras metrópoles, cidades medievais crescidas em tamanho e população sem quaisquer cuidados, em especial os sanitários. Deu em colapso forçando as primeiras leis urbanísticas, que, por sinal foram leis sanitárias, em Londres e Paris. Daí essas discussões não pararam mais.
     A Carta de Atenas em 1933 falava em densidades entre 250 a 300 hab/ha, o que jamais chegou a ser consenso. Enquanto Frank Lloyd Wright propunha 10 hab/ha em sua Broadacre City, Le Corbusier, defendia 3.000 hab/ha em seu Plano Voisin. Cuiabá tem uma densidade urbana bruta próxima a 24 hab/ha, cerca de 1 décimo da prevista pela Carta de Atenas! Há alguns anos Cuiabá tinha quase 50 mil lotes urbanos oficiais ociosos com moradores esparsos, mas com arruamento e, possivelmente, água e energia elétrica, o mínimo exigido para se implantar um loteamento na época, pois os moradores ainda que esparsos também tem direito a eles. Tem até glebas urbanas em algumas avenidas principais. Ônibus e caminhões de lixo andando a mais, tubulações, fiações, serviços, iluminação pública desperdiçados, encarecendo operacionalmente a cidade! Impede a elevação dos padrões urbanísticos. 
     As cidades são como organismos vivos.  Com suas peculiaridades, cada cidade é única. Cidades-tipo só existem na teoria e soluções-tipo também só podem existir na teoria como padrões de referência geral para discussões em tese, mas sua aplicação tem que ser individualizada pelo urbanista e com a ciência do Urbanismo, conforme cada caso. Por exemplo cidades com risco de terremotos tendem a ser espraiadas (México, Los Angeles). Cidades muito planas favoráveis a alagamentos, como nossas belas cidades do agronegócio, sugerem a compacidade e o consequente adensamento para redução da área de captação das chuvas.
          Densidades muito baixas se referem à cidades com infraestrutura ociosa. Para estas sempre falaremos em aumentar a densidade urbana ao menos como forma de reduzir os custos operacionais da cidade. Por isto a Lei do Uso e Ocupação do Solo Urbano de Cuiabá em 1997 adotou o paradigma de “crescer para dentro”, como estratégia para a ocupação de seus espaços vazios e otimização da infraestrutura existente. A mim a estratégia continua correta. Mas, adensar até quando? Até quando a curva do custo operacional da cidade cruzar com a das deseconomias ou desconfortos urbanos, dependendo do estudo de cada caso. A grande maioria das cidades brasileiras está muito longe disso e o imperativo do adensamento racional deve permanecer, acompanhado dia a dia pelos profissionais competentes. Mantidos o atual perímetro e o ritmo oficial subestimado de crescimento populacional, Cuiabá levaria cerca de 80 anos para dobrar sua densidade. Mesmo assim, ainda que lento, é melhor reduzir custos do que aumentar.
     Sem esquecer a dimensão política, a cidade é um objeto técnico complexo que se transforma cotidianamente e deve ser tratada tecnicamente de forma sistemática e permanente. Espero que uma das grandes transformações trazidas pela pandemia seja a do próprio homem na sua forma de ver a cidade e o Urbanismo, sua ciência. E em especial transforme a nós próprios, arquitetos e urbanistas, para que assumamos enfim a responsabilidade de protagonistas como orientadores do cidadão na construção da cidade, sua grande casa e seu bem maior.