Vazios urbanos (Foto: Olhar Direto)
José Antonio Lemos dos Santos
Preconizado nas últimas décadas pelo Urbanismo e agora contestado pela pandemia da Covid-19, o adensamento urbano foi um dos destaques em recente discussão virtual promovida pela Academia de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso – AAU/MT. Esta discussão envolvendo saúde e desenvolvimento urbano vem pelo menos desde meados do século XIX, com o avanço da Revolução Industrial e o surgimento das primeiras metrópoles, cidades medievais crescidas em tamanho e população sem quaisquer cuidados, em especial os sanitários. Deu em colapso forçando as primeiras leis urbanísticas, que, por sinal foram leis sanitárias, em Londres e Paris. Daí essas discussões não pararam mais.
A Carta de Atenas em 1933 falava em densidades entre 250 a 300 hab/ha, o que jamais chegou a ser consenso. Enquanto Frank Lloyd Wright propunha 10 hab/ha em sua Broadacre City, Le Corbusier, defendia 3.000 hab/ha em seu Plano Voisin. Cuiabá tem uma densidade urbana bruta próxima a 24 hab/ha, cerca de 1 décimo da prevista pela Carta de Atenas! Há alguns anos Cuiabá tinha quase 50 mil lotes urbanos oficiais ociosos com moradores esparsos, mas com arruamento e, possivelmente, água e energia elétrica, o mínimo exigido para se implantar um loteamento na época, pois os moradores ainda que esparsos também tem direito a eles. Tem até glebas urbanas em algumas avenidas principais. Ônibus e caminhões de lixo andando a mais, tubulações, fiações, serviços, iluminação pública desperdiçados, encarecendo operacionalmente a cidade! Impede a elevação dos padrões urbanísticos.
As cidades são como organismos vivos. Com suas peculiaridades, cada cidade é única. Cidades-tipo só existem na teoria e soluções-tipo também só podem existir na teoria como padrões de referência geral para discussões em tese, mas sua aplicação tem que ser individualizada pelo urbanista e com a ciência do Urbanismo, conforme cada caso. Por exemplo cidades com risco de terremotos tendem a ser espraiadas (México, Los Angeles). Cidades muito planas favoráveis a alagamentos, como nossas belas cidades do agronegócio, sugerem a compacidade e o consequente adensamento para redução da área de captação das chuvas.
Densidades muito baixas se referem à cidades com infraestrutura ociosa. Para estas sempre falaremos em aumentar a densidade urbana ao menos como forma de reduzir os custos operacionais da cidade. Por isto a Lei do Uso e Ocupação do Solo Urbano de Cuiabá em 1997 adotou o paradigma de “crescer para dentro”, como estratégia para a ocupação de seus espaços vazios e otimização da infraestrutura existente. A mim a estratégia continua correta. Mas, adensar até quando? Até quando a curva do custo operacional da cidade cruzar com a das deseconomias ou desconfortos urbanos, dependendo do estudo de cada caso. A grande maioria das cidades brasileiras está muito longe disso e o imperativo do adensamento racional deve permanecer, acompanhado dia a dia pelos profissionais competentes. Mantidos o atual perímetro e o ritmo oficial subestimado de crescimento populacional, Cuiabá levaria cerca de 80 anos para dobrar sua densidade. Mesmo assim, ainda que lento, é melhor reduzir custos do que aumentar.
Sem esquecer a dimensão política, a cidade é um objeto técnico complexo que se transforma cotidianamente e deve ser tratada tecnicamente de forma sistemática e permanente. Espero que uma das grandes transformações trazidas pela pandemia seja a do próprio homem na sua forma de ver a cidade e o Urbanismo, sua ciência. E em especial transforme a nós próprios, arquitetos e urbanistas, para que assumamos enfim a responsabilidade de protagonistas como orientadores do cidadão na construção da cidade, sua grande casa e seu bem maior.
"Parabéns Zé Antonio! Penso como vc, a questão da densidade urbana é importante para a cidade. No caso de Cuiabá, é urgente a ocupação dos vazios urbanos. A infraestrutura disponibilizada sem a ocupação, encarece por demais os custos da cidade." Comentário enviado por uáts pela arquiteta e urbanista Cássia Abdala em 06/07/20.
ResponderExcluirCom a pandemia e a constatação de que o teletrabalho é uma realidade viavel e, em alguns caso, melhor do que o presencial (conheço pessoas q gastavam 3 a 4 horas de transporte público todos os dias - hj esse pessoal tah produzindo como nunca!), existe em alguns lugares um movimento para o interior... isso vai afetar as grandes metropoles, q vao ter q dar um jeito de encolher sem piorar seu nivel de adensamento.... vao ter q evitar uma "detroitizaçao"...
ResponderExcluirDaniel, o adensamento em cidades que apresentam níveis muito baixos de densidade a meu ver continua tecnicamente recomendável. Já o "desadensamento" em cidades super adensadas sempre foi recomendável por gerar deseconomias, desconfortos e até sociopatias graves, e muito mais agora com a pandemia. Nesse caso seria até bom que cidades como Cuiabá tivessem uma política especial para atração desse tipo de migração citada por você e, inclusive, para aposentados, por exemplo, com objetivo de otimizar sua infraestrutura ociosa. Como disse no artigo, a taxa oficial de crescimento demográfico estimado para Cuiabá pelo IBGE é muito baixa (0,89% a.a - acho que subestimada)e nesse ritmo a cidade precisaria de cerca de 80 anos para dobrar sua densidade, que ainda assim continuaria muito baixa, consequentemente seu custo operacional continuaria elevadíssimo.
ResponderExcluirComentário enviado por e-mail por Cleber Lemes em 08/07/20:
ResponderExcluir"Bom Dia Professor José Antonio !
Ótimo artigo . Acho que após essa PANDEMIA, o homen terá que fazer una reflexão. Como acho que os projetos do crescimento das cidades devem ser mais na horizontal do que na vertical, afim evitar aglomerações de pessoas, por mais que o custo de infraestrura seja maior, porém melhoramos e evitaremos aglomerações. Um abraço"
Comentário enviado por e-mail por Maristella Carvalho em 11/07/20:
ResponderExcluir"Agradeço muito a você que tem sido um excelente mestre de urbanismo para mim. Tenho aprendido muito sobre urbanismo e outros "que tais" com seus artigos. Clareza, simplicidade e equilíbrio são o que me transmitem seus escritos. Congratulações por seus excelentes artigos! Grande abraço"