"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



terça-feira, 18 de outubro de 2011

CAU: POR UMA NOVA ARQUITETURA




José Antonio Lemos dos Santos

     Na faculdade leciono História e Teoria da Arquitetura e do Urbanismo e a primeira de minhas aulas é sobre um texto do psicanalista alemão Erich Fromm explicando que o homem ao surgir rompeu uma situação de equilíbrio com a natureza, e a partir daí passou a viver situações de necessidades diversas, algumas das quais fundamentais à sua sobrevivência. O desenvolvimento da inteligência permitiu-lhe inventar formas de suprir suas necessidades garantindo o sucesso da espécie humana, justo aquela cujo indivíduo “é, ao nascer, o mais desamparado dos animais”. Às necessidades vitais ligadas à sede, fome, equilíbrio térmico, segurança, junta-se a necessidade do abrigo, sem o qual o homem também não sobrevive. Esta é a essência da Arquitetura, o atendimento às necessidades do abrigo, fundamental à sobrevivência humana desde que o homem deixou a barriga materna, o Jardim do Éden ou o ventre da mãe Natureza.
     A Arquitetura não é fútil, não é luxo, mas uma das artes – capacidade de fazer - mais necessárias à sobrevivência humana. Seu desenvolvimento é uma conquista e patrimônio de toda a humanidade, e o abrigo digno virou um direito universal do ser humano sacramentado em nossa Constituição. Seu desfrute, entretanto, está muito longe da universalidade. Ao mesmo tempo em que assistimos às maravilhas da arquitetura e do urbanismo contemporâneos, vergonhosamente convivemos com cidadãos do Brasil e do mundo se abrigando em condições subumanas, inferiores às paleolíticas. Milhões subvivendo pelas ruas, debaixo de pontes, viadutos, marquises ou banco de praças. Milhões em barracos construídos com restos da sociedade, no pau-a-pique, instalados em locais impróprios, áreas de risco, encostas, áreas inundáveis, etc.. Este é o maior dos desafios da Arquitetura e do arquiteto cidadão do mundo. No Brasil, por exemplo, o verão chega e nos lembra das repetidas e absurdas tragédias das viradas de ano. O que foi feito de sério para evitá-las? Quantos morrerão agora? Onde?
     No próximo dia 26 os arquitetos de todo o Brasil estarão escolhendo os primeiros dirigentes do seu novo Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU. Fruto de uma luta de mais de meio século, o CAU não foi criado para ser apenas mais um órgão de classe. Os arquitetos e urbanistas do Brasil convenceram a sociedade brasileira a criar em lei o CAU – corporativo, mas não corporativista - para ser uma ferramenta dela, da sociedade, em prol da efetivação no Brasil desse direito universal ao espaço seguro, sustentável, belo, saudável e antes de tudo digno. A técnica e a arte da Arquitetura e do Urbanismo têm que estar disponíveis a todos, não apenas para uma parcela da sociedade. Esta a meu ver a primeira e hercúlea responsabilidade do CAU.
     Vamos votar todos para exigir das autoridades a presença e a responsabilidade dos arquitetos e urbanistas nos assuntos que envolvem a Arquitetura e o Urbanismo, com remuneração e condições técnicas viabilizadoras do correto exercício profissional. Cobrar a implantação imediata da Lei da assistência técnica pública e gratuita aos cidadãos de baixa renda. Nossas cidades e a moradia de seus habitantes não podem mais prescindir dos suportes técnicos especializados e tratadas apenas como um butim de negociação na politicagem que assola o país. Re-dignificar a Arquitetura. As primeiras eleições para o CAU serão o início de outra luta, a luta por uma nova Arquitetura e um novo Urbanismo, buscando a justiça de uma distribuição mais equânime de sua produção e de seus avanços, não mais para alguns.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 18/10/2011)

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