"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



terça-feira, 4 de setembro de 2012

O CAVALEIRO DA UTOPIA

José Antonio Lemos dos Santos

     Inexorável, todos vamos e ele também se foi. Semana passada perdemos o Coronel Meirelles, um grande homem, um turbilhãode ideias e projetos, polo gerador de perspectivas, animação e juventude,apesar da idade. Para muitos o “pai da BR-163”. Prefiro tê-lo como “o cavaleiroda utopia”, como vi chamá-lo Moisés Martins, não das utopias fantasiosas, mas dasutopias edificáveis, a serem construídas, constantemente perseguidas, como aprópria 163 ou a democracia brasileira. Sua morte é ocasião para lembrá-lo, não como homenagem, que ele não gostava muito, mas como um justo e devido reparo quea cidadania cuiabana ficou lhe devendo em vida enquanto homem público.
     É fácil falar muito sobre o Coronel. Difícil é falar pouco. Só o genial projeto da Ecomoradia, a casa a ser paga com mudas,premiada nacionalmente, daria um livro. Com ele também aprendi que os espaços para funcionarem precisam ser vivos, ter alma. A ausência resulta nos tantos projetos perfeitos que não funcionam, belos espaços urbanos mortos e degradados,ou os tais “elefantes brancos”. Nesse caso, a alma é o interesse que um projetodeve despertar nas pessoas enquanto produto final público. Para ele não bastavaa verba, por maior que fosse, mesmo com projeto técnico pronto e de graça. Sem gente capaz de brigar por ele ou a quem pudesse interessar como bem público, também não lhe interessava. Quando se tratava de algo importante para a cidade ele próprio arregaçava as mangas junto com Dona Zulmira e a assistência social para motivar os possíveis interessados, como aconteceu com a Usina de Lixo de Cuiabá, a Feira do Porto e o Shopping Popular, importantes realizações de sua administração. 
     Assim também ele pensava a cidade, quedeveria ter alma, um povo que se interessasse e brigasse por ela. Areconstrução desse espírito começaria nas vizinhanças, bairros, regiões atéchegar à cidade como um todo, através das chamadas “comunidades solidárias deautogestão”, cada uma lutando por seu pedaço sem perder a visão da totalidade. O ideal seria que à frente de cada associação de moradores houvesse quatromastros com as bandeiras do país, do estado, da cidade e do bairro. Para tantofez a atual Lei do Abairramento e regionalizou a cidade. Tinha consciência deque esta sua visão o colocava em rota de colisão com a estrutura política tradicional e faria com que sua administração fosse um constante embate político. Como foi.
     Uma das mais marcantes lembranças foi desua surpresa ao abrir seu primeiro holerite como prefeito. Secretário degoverno, assisti, só ele e eu, ao seu espanto: “Mas como? Eu vou ganhar tudoisso?! O maior salário não é para ser o do presidente da República?”. Doespanto à ação, foi à Justiça contra seu próprio salário, depositando em juízoo valor que considerava excedente. Só recebeu depois de muitos anos quando a Justiça declarou-se incompetente para julgar o caso. Talvez a única autoridadeneste Brasil a tomar uma atitude desta. Ainda que em Cuiabá poucos soubessem, oassunto foi editorial em O Globo e acompanhada pela imprensa em várias partesdo país.
     O “cavaleiro da utopia” se foi, mas deixou sementes concretas. A maior delas, ao menos em dimensão física, é aCuiabá-Santarém, a BR-163, espinha dorsal de Mato Grosso e o grande eixointegrador do estado. Veio para cá com o 9°BEC para implantá-la e cumpriu suamissão. Cabe a nós continuá-la, com o asfalto em toda sua extensão e a ferrovia paralela reforçando sua estrutura, de Cuiabá a Santarém. Como no Brasil asgrandes obras públicas terminam recebendo o nome de alguém, então por que nãosonhar com a Cuiabá-Santarém denominada “Rodovia Coronel Meirelles”. Ninguém seria mais merecedor.     

2 comentários:

  1. Brilhante artigo, como sempre. Sobre nomear a BR - 163 de Rodovia Coronel Meirelles acho ótima idéia. Não há lugar melhor para homenageá-lo. Já foi dito que ele não era muito afeito a homenagens porém, ser homenageado com a denominação dessa rodovia creio que ele ficaria contente e até mesmo orgulhoso disso.

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  2. Belo artigo, mesmo. Eu me lembro do tempo que o meu pai, amigo do Cel. Meirelles, foi indicado para chefiar a Defesa civil. Isso foi 1995, quando teve aquela enchente. Ele falava bem do nosso ex-prefeito, mas essas histórias nunca chegaram a mim. Fico feliz de encontrar artigos assim, que dêem luz aos poucos políticos que merecem atenção por seus relevantes feitos em nossa cidade.

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