José Antonio Lemos dos Santos
A gente já conhecia o trem a vapor, a velha “maria-fumaça”, o trem a diesel, o trem elétrico e até o trem bala, mas jamais soube de um trem a jato. Pois surgiu. E aqui em Mato Grosso, despercebido, meio escondido, sem retrato ou foguete, como diria Noel, sem manchetes nos jornais, bandas de música, como sugere um fato como este. Ainda mais na política, onde não se pinta um meio-fio sem comício e foguetório.
Refiro-me a proposta de ferrovia rasgando horizontalmente o médio-norte de Mato Grosso, ligando Lucas do Rio Verde a Uruaçu (GO), e posteriormente, a Vilhena (RO) – com Sapezal bem no meio do caminho. Nem inteirou dois anos das primeiras notícias sobre a idéia, já entrou no Plano Nacional de Viação (PNV). Rapidíssimo! Lembro da festa quando em 1976 o senador Vuolo incluiu nesse mesmo Plano a ligação ferroviária de Rubinéia (SP) a Cuiabá, após uma difícil luta que era de conhecimento de todos. Agora, um enorme projeto envolto no desconhecimento público total.
E mais, com velocidade supersônica, nem bem entrou no PNV, sem nenhum estudo, já foi incluído no PAC, desbancando o trecho de 200 Km entre Rondonópolis a Cuiabá, isto é, a ligação ao sistema ferroviário nacional das duas maiores cidades de Mato Grosso, sua capital e Várzea Grande, que juntas formam o maior centro produtor, consumidor, distribuidor e concentrador de cargas do estado. É bom lembrar que este trecho já foi submetido na década passada a uma Audiência Pública, a qual estive presente, com seu traçado técnico questionado por passar próximo – não dentro - da Reserva Tereza Cristina, 700 metros rio abaixo, e bastava essa correção. Hoje o trânsito rodoviário nesse trecho supera 15 mil veículos diários, a maioria carretas e treminhões, com alto impacto negativo econômico, ambiental e humano. Mas foi trocada por uma ferrovia cuja descrição técnica no PAC diz apenas “obra em fase de estudo”. Será que Lula sabe? Tudo sob o olhar atento e convicto do cumprimento do dever de nossos congressistas.
Desde dezembro passado, quando o PAC foi noticiado de forma mais compreensível, o assunto é uma pulga atrás da orelha de muitos cuiabano/varzea-grandenses. Afinal foram abertas as cartas desse estranho jogo de interesses que virou a ferrovia, confirmando antigas suspeitas que a extrema boa-fé cuiabana sempre recusou a acreditar? Da forma como se combinam a absurda exclusão do PAC do trecho Cuiabá-Rondonópolis com a proposta da nova ferrovia e o conseqüente seqüestro de cargas de Mato Grosso para Goiás, trata-se muito mais do que um projeto ferroviário, e sim de um audacioso e questionável plano geopolítico para Mato Grosso, que precisa ser muito bem conhecido e discutido por todos os mato-grossenses antes de ser implementado.
Não seria mais lógica e prática a inclusão no PAC do trecho Rondonópolis/Cuiabá/Lucas do Rio Verde, já, inclusive, objeto de concessão da União? Percorrendo uma área antropizada, com menores impactos ambientais ou sobre reservas indígenas, sem necessidade de novas grandes obras de arte, esta solução sem dúvida agilizaria uma ferrovia de fato necessária não apenas para levar a produção estadual, mas também para trazer os insumos necessários ao progresso do estado, através de seus maiores centros urbanos consumidores e distribuidores. Uma ferrovia não é feita só para ir, mas para ir e voltar com cargas de ida e vinda, disseminando o desenvolvimento. Se o que se quer é o desenvolvimento equilibrado e sustentável de Mato Grosso, sem exclusões regionais ou mais agressões ambientais, nada mais correto e urgente que a execução do projeto já outorgado à Ferronorte em 1989.
(Publicado pelo Diário de Cuiabá em 27/01/2009)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Digite aqui seu comentário.