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José Antonio Lemos dos Santos
Falar de ferrovia em Mato Grosso é tratar de uma das necessidades mais urgentes de um povo trabalhador que conseguiu fazer de seu estado o maior produtor agropecuário do país e um dos maiores produtores de alimentos do mundo, mesmo que historicamente tão desprezado e mal tratado pelo governo federal. Um povo cujo dinamismo e produtividade de norte a sul, de leste a oeste do estado, foi responsável em 2012 por um superávit de quase 13,0 bilhões de dólares na balança comercial brasileira – mais de US$ 1,0 bilhão por mês! - mas que já há algumas décadas vem sendo cada vez mais sacrificado por uma logística de transportes ultrapassada, incompatível com a extraordinária economia que conseguiu construir e com toda a riqueza que vem rendendo ano após ano ao Brasil. Importante lembrar que tal sacrifício não se resume às perdas econômicas dos fretes absurdos que solapam a competitividade dos produtos mato-grossenses e aumentam os preços dos insumos, das mercadorias e demais produtos trazidos de fora e que são indispensáveis à produção e à qualidade de vida da população. Perdas não só pelas cargas vazadas ou tombadas nas estradas, mas também pelos danos ambientais e, em especial, pelas vidas imoladas todos os dias nesse altar sanguinolento que viraram nossas estradas, em doloroso tributo cobrado pelos cruéis deuses da incúria, irresponsabilidade e impunidade públicas. Até quando persistirá este sacrifício criminoso imposto aos mato-grossenses, todos reféns da insegurança, do terror e do medo a cada viagem pelas rodovias no estado?
Semana passada saíram as estatísticas oficiais sobre os acidentes nas rodovias federais em Mato Grosso em 2012. Só nas federais foram 4.277, em média quase 12 acidentes por dia vitimando 2.184 pessoas, ou seja, quase 6 vítimas por dia em média. Dentre estas vítimas 742 tiveram ferimentos graves e 270 morreram, ou seja, 1012 mortos ou feridos gravemente no ano. Quase 3 mortos ou gravemente feridos todos os dias em média. Pior, estes dados só contam os óbitos ocorridos em até 24 horas após os acidentes. “Meu Deus, meu Deus, mas que bandeira é esta que impudente na gávea tripudia?”, vem à lembrança Castro Alves bradando contra a infâmia dos navios negreiros. A propósito de tragédias registro em solidariedade a grande dor dos gaúchos pelo terrível incêndio de domingo em Santa Maria, com mais de 230 mortos, que tratarei em outro artigo, já de cabeça mais fria com o assunto.
Esmiúço estes dados para tentar nos aproximar da dureza trágica que a frieza das estatísticas esconde. A ideia é lembrar que a questão da logística em Mato Grosso é seríssima, supera as necessidades econômicas e não pode ser vista como sonhos quiméricos ou oportunidade para promoção de interesses pessoais, grupais ou politiqueiros, para armações geopolíticas mesquinhas, ou ainda para simples formulação de teses ou artigos bonitinhos na mídia. O assunto requer objetividade e dureza, como dura é a conta que os mato-grossenses estão pagando. O atual patamar de desenvolvimento de Mato Grosso envolve cargas de ida e volta que extrapolam em muito os limites do modal rodoviário, exigindo a incorporação das ferrovias e hidrovias. Na situação, sem dúvida a solução mais viável, rápida e barata é a continuidade da ferrovia de Rondonópolis até Lucas do Rio Verde, passando por Cuiabá, apenas 560 Km em ambiente antropizado, conhecido ambientalmente, sem himalaias ou araguaias a transpor, e com os chineses prontos para sua implantação. E que de imediato siga rumo a Santarém, com hidrovias, outras ferrovias e muitas mais rodovias em um sistema integrado de transporte capaz de oferecer as condições de conforto, segurança, fluidez e sustentabilidade que Mato Grosso precisa e tem direito.
(Artigo publicado em 29/01/2013 pelo Diário de Cuiabá)
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