Carta ao Prefeito Eleito Mauro
Mendes e à sua Equipe de Transição
em 14 de novembro de 2012.
Caro Prefeito Eleito Mauro Mendes,
Cuiabá apresenta certas características e especificidades
cujo conhecimento permitirá ao gestor público maior facilidade na implementação
das políticas públicas necessárias à melhoria de qualidade de vida de sua
população e ao aproveitamento de suas potencialidades, promovendo o adequado
enfrentamento dos problemas urbanos e ambientais.
Nós, abaixo-assinados, representamos
algumas das instituições que, há décadas, discutem, refletem e buscam
participar ativamente dos canais
democráticos voltados à construção da nossa cidade. Contudo, nas últimas
gestões, nossos esforços tem se direcionado a questionar e contestar diversas práticas
adotadas, quanto à direção do Planejamento e Gestão Urbana em Cuiabá. Percebemos
que está sendo desconsiderado um processo participativo e democrático de
décadas, cujo resultado é inquestionável, uma Cuiabá desestruturada, com
inúmeras irregularidades fundiárias e urbanas, além de excludente.
Hoje, quando nos
deparamos com todos os problemas urbanos (e regionais) que se agudizam a partir
das opções políticas tomadas na Capital do Estado, é impossível não associarmos
essas estruturas institucionais e práticas políticas com o atrasado estrutural
(político, econômico e social) que insistem em permanecer como realidade no
Brasil. Mas a realidade atual em nada se
assemelham com a Cuiabá que vinha construindo um claro projeto de modernidade com
a colaboração dos diferentes segmentos da sociedade, coordenados pelo poder
público. Na década de 1990 conseguiu-se construir e testar, na prática, uma
estrutura de planejamento. Construiu-se mais que isso, também consensos, que
não atendiam aos interesses de uns ou de outros (grupos), mas que conseguiam
atender aos interesses da Cuiabá Coletiva!!!
Por muitas vezes, a
prática do planejamento e gestão em Cuiabá mostrou-se à frente, não apenas do
seu tempo, mas à frente, inclusive, das práticas dos grandes centros urbanos,
das práticas brasileiras.
Quando, em 1995, o ex-Prefeito
José Meireles registrava na apresentação do Plano Diretor de Cuiabá que - “Desenvolvimento Urbano deveria ser lido
em ampla acepção – na dimensão física – das obras de infraestruturas públicas
[e privadas], mas principalmente na dimensão da consciência, pois o
desenvolvimento urbano somente seria alcançado com a “transformação de mentes
de nossa gente”:
Na dimensão da consciência está o
processo de transformação de mentes, da transformação do homem individualista em ser social e participativo, conferindo-lhe
a dimensão política. Nesse processo
de transformação está a organização da
sociedade, o fortalecimento das lideranças comunitárias e de classes
representativas dos diversos segmentos organizados dessa sociedade. Esse
fortalecimento se efetiva através do repasse do poder político a esses
segmentos, condicionando os espaços para
sua participação efetiva no processo decisório de governo. A meta é o desenvolvimento urbano
auto-sustenado (sic), a sociedade se autoconduzindo, o Governo disciplinando
conflitos, formulando políticas, sempre em regime de cogestão
político-administrativa com a sociedade. A visão do futuro é a Nação se
superpondo ao Estado.” (In: Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Cuiabá,
1995).
A fala do nosso saudoso
prefeito não permaneceu apenas no campo da teoria, do desejo, mas foi uma
prática recorrente e construída, dia-a-dia, diante de cada embate, de cada
questão que os diferentes grupos da sociedade se viram obrigados a se debruçar,
refletir, discutir, encarar, para não impor, mas propor as soluções ideais – historicamente
possíveis, no contexto democrático. E
toda esta prática somente foi possível pela estrutura institucional consolidada
pelo Sistema Municipal de Desenvolvimento Urbano, previsto na Lei Orgânica de
Cuiabá, e nos Planos Diretores (1995 e 2007), destacando o Conselho Municipal e
o imprescindível (mas extinto na última gestão municipal) Instituto de
Pesquisas e Desenvolvimento Urbano.
Cuiabá antevia, e colocava
em prática, nos idos de 1990, o que seria uma exigência legal a partir da
promulgação do Estatuto da Cidade, expresso na Lei Federal 10.257/2001. Com a
revisão obrigatória do Plano Diretor, à luz desta lei, a sociedade Cuiabana
apenas reafirmava o seu desejo de continuar no caminho da construção
democrática, com todo o ferramental de atuação que o Sistema Municipal de
Planejamento e Desenvolvimento [Estratégico], estruturado a partir de seu Órgão
Superior – o Conselho Municipal de Desenvolvimento Estratégico (CMDE), o Órgão
Central, na figura da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU) e o
Órgão de Planejamento e Apoio Técnico (IPDU), possibilitavam. Muito mais que
apenas continuar em um caminho, sempre se pretendeu avançar, atentos aos alcances
e limitações que a obra humana, da sociedade, apresenta constantemente.
Se antes, Cuiabá
estava avant-garde, e articulada com
as melhores práticas de planejamento e gestão nos moldes das atuações de
municípios progressitas como Curitiba, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Medelin,
Bogotá, podemos afirmar que Cuiabá retrocedeu ao, de forma arbitrária, ter
visto extinto o IPDU por decisão unilateral da municipalidade.
Se Curitiba, Porto
Alegre, Medelin e Bogotá (entre tantos outros), por meio dos resultados
positivos de suas políticas, nas dimensões socioeconômica e ambiental, evidenciam
a importância de se estruturar Institutos de Pesquisa e Planejamento, que com a
autonomia necessária e, retroalimentado por todo o sistema, estruture o
processo de planejamento do município, de forma técnica e política, dinâmica e
contínua, Cuiabá conseguiu comprovar que, em pouco tempo, a inexistência e o
desmonte da estrutura, somente pode trazer consequências desastrosas e
alarmantes ao planejamento e gestão da
política urbana.
As opções políticas das
últimas gestões, após extinção do IPDU,
criaram a então Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, sem
consulta e deliberação do Conselho Municipal, sem respeito à Lei Orgânica, a Lei
maior de Cuiabá – o Plano Diretor, à Lei
Federal – Estatuto da Cidade, e voltada
à mera gestão das questões e políticas urbanas. Podemos até estar crescendo,
mas estagnamos quanto ao desenvolvimento urbano – temos mais construções, obras
infraestruturais, entretanto desconexos dos diagnósticos, das projeções
futuras, que não vêm sendo incorporadas na formulação das políticas. Por
conseguinte, estas se mostram limitadas a curto prazo, opção inaceitável quando
discutimos a escala da cidade, as demandas e o futuro da sociedade. Como resultado
temos a violência urbana, os congestionamentos e os acidentes de trânsito, as
irregularidades fundiárias e grande
parte da população alijada da prestação de serviços públicos de qualidade.
Com esse desmonte
institucional, e consequentemente político, técnico e administrativo, desmonta-se e se desvirtua
o Conselho Municipal, desconstruindo todo o Sistema Municipal de
Desenvolvimento Urbano de Cuiabá, com prejuízos perceptíveis.
Senhor Prefeito, pelo seu
perfil arrojado, confiamos que construirá seu governo na inovação assim como no
cumprimento legal e na gestão democrática. Dessa forma, colocamos-nos, enquanto
cidadãos, membros entidades da Sociedade Civil Organizada, à disposição para auxiliá-lo
e contribuir com o processo de (re) construção e avanço dessa estrutura de planejamento que já mostrou-se
capaz, em teoria e na prática, de conduzir o município ao “desenvolvimento
urbano” – físico e de mentes, com o resgate do “regime de cogestão
político-administrativa com a sociedade”.
Esse propósito legal é que acompanharemos e fiscalizaremos, é a nossa expectativa, são nossos votos para
sua gestão.
Ana Rita
Maciel
arquiteta e urbanista, , Conselheira Titular do
Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU/MT, Conselheira do Conselho Municipal
de Desenvolvimento Estratégico – CMDE
Claudio Santos
de Miranda
arquiteto e urbanista, professor e pesquisador do
Departamento de Arquitetura e Urbanismo UFMT, Membro da Rede de Controle, Presidente do Conselho de Arquitetura e
Urbanismo – CAU/MT
Doriane Azevedo
arquiteta e urbanista, professora e pesquisadora do
Departamento de Arquitetura e Urbanismo UFMT, membro da Diretoria do Instituto
dos Arquitetos do Brasil – IAB/MT, Conselheira Suplente do Conselho de
Arquitetura e Urbanismo – CAU/MT, Conselheira do Conselho Municipal de
Desenvolvimento Estratégico – CMDE
José Antônio
Lemos
arquiteto e urbanista, professor universitário e
articulista no Diário de Cuiabá na área do desenvolvimento urbano e regional
Sindicato das
Indústrias da Construção do Estado de Mato Grosso - SINDUSCON/MT
Raul Bulhões
Spinelli
arquiteto e urbanista, Vereador Municipal (1996-1999),
Superintendente do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Urbano (2000-2004)
Rita De Cássia
Oliveira Chiletto
arquiteta e urbanista, Secretária Adjunta da Secretaria
de Planejamento Urbano e Gestão Metropolitana – SECID/MT, Q/MT, Conselheira Titular
do Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU/MT, Conselheira do Conselho
Municipal de Desenvolvimento Estratégico – CMDE e Conselheira do Conselho Estadual
das Cidades de MT
Telma Beatriz
de Figueiredo Soares
arquiteta e urbanista, membro da Diretoria do Sindicado
dos Arquitetos e Urbanistas – SINDARQ/MT, membro da Diretoria da Federação
Nacional dos Arquitetos - FNA
Reitero a íntegra da carta apresentada.
ResponderExcluirAnna Regina Feuerharmel
Arquiteta e Urbanista, professora universitária, diretora do Departamento de Plano Diretor do IPDU/PMC (1992-1996), membro do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano - CMDU (desde a sua instaçlação até 1996.
Seria bom que outros que concordam com a Carta, arquitetos em especial, seguissem o seu exemplo apoiando publicamente o documento, aqui no Blog ou até com a publicação de artigos nos meios de comunicação locais.
ResponderExcluir