"FIRMITAS, UTILITAS et VENUSTAS" (Tríade Vitruviana)



segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

CARTA AO PREFEITO



Carta ao Prefeito Eleito Mauro Mendes e à sua Equipe de Transição
em 14 de novembro de 2012.

Caro Prefeito Eleito Mauro Mendes,

Cuiabá apresenta certas características e especificidades cujo conhecimento permitirá ao gestor público maior facilidade na implementação das políticas públicas necessárias à melhoria de qualidade de vida de sua população e ao aproveitamento de suas potencialidades, promovendo o adequado enfrentamento dos problemas urbanos e ambientais.
Nós, abaixo-assinados, representamos algumas das instituições que, há décadas, discutem, refletem e buscam participar ativamente  dos canais democráticos voltados à construção da nossa cidade. Contudo, nas últimas gestões, nossos esforços tem se direcionado a questionar e contestar diversas práticas adotadas, quanto à direção do Planejamento e Gestão Urbana em Cuiabá. Percebemos que está sendo desconsiderado um processo participativo e democrático de décadas, cujo resultado é inquestionável, uma Cuiabá desestruturada, com inúmeras irregularidades fundiárias e urbanas, além de excludente.
Hoje, quando nos deparamos com todos os problemas urbanos (e regionais) que se agudizam a partir das opções políticas tomadas na Capital do Estado, é impossível não associarmos essas estruturas institucionais e práticas políticas com o atrasado estrutural (político, econômico e social) que insistem em permanecer como realidade no Brasil. Mas a realidade atual  em nada se assemelham com a Cuiabá que vinha construindo um claro projeto de modernidade com a colaboração dos diferentes segmentos da sociedade, coordenados pelo poder público. Na década de 1990 conseguiu-se construir e testar, na prática, uma estrutura de planejamento. Construiu-se mais que isso, também consensos, que não atendiam aos interesses de uns ou de outros (grupos), mas que conseguiam atender aos interesses da Cuiabá Coletiva!!!
Por muitas vezes, a prática do planejamento e gestão em Cuiabá mostrou-se à frente, não apenas do seu tempo, mas à frente, inclusive, das práticas dos grandes centros urbanos, das práticas brasileiras.
Quando, em 1995, o ex-Prefeito José Meireles registrava na apresentação do Plano Diretor de Cuiabá que -  “Desenvolvimento Urbano deveria ser lido em ampla acepção – na dimensão física – das obras de infraestruturas públicas [e privadas], mas principalmente na dimensão da consciência, pois o desenvolvimento urbano somente seria alcançado com a “transformação de mentes de nossa gente”:
Na dimensão da consciência está o processo de transformação de mentes, da transformação do homem individualista em ser social e participativo, conferindo-lhe a dimensão política. Nesse processo de transformação está a organização da sociedade, o fortalecimento das lideranças comunitárias e de classes representativas dos diversos segmentos organizados dessa sociedade. Esse fortalecimento se efetiva através do repasse do poder político a esses segmentos, condicionando os espaços para sua participação efetiva no processo decisório de governo. A meta é o desenvolvimento urbano auto-sustenado (sic), a sociedade se autoconduzindo, o Governo disciplinando conflitos, formulando políticas, sempre em regime de cogestão político-administrativa com a sociedade. A visão do futuro é a Nação se superpondo ao Estado.” (In: Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Cuiabá, 1995).

A fala do nosso saudoso prefeito não permaneceu apenas no campo da teoria, do desejo, mas foi uma prática recorrente e construída, dia-a-dia, diante de cada embate, de cada questão que os diferentes grupos da sociedade se viram obrigados a se debruçar, refletir, discutir, encarar, para não impor, mas propor as soluções ideais – historicamente possíveis, no contexto democrático.  E toda esta prática somente foi possível pela estrutura institucional consolidada pelo Sistema Municipal de Desenvolvimento Urbano, previsto na Lei Orgânica de Cuiabá, e nos Planos Diretores (1995 e 2007), destacando o Conselho Municipal e o imprescindível (mas extinto na última gestão municipal) Instituto de Pesquisas e Desenvolvimento Urbano.  
Cuiabá antevia, e colocava em prática, nos idos de 1990, o que seria uma exigência legal a partir da promulgação do Estatuto da Cidade, expresso na Lei Federal 10.257/2001. Com a revisão obrigatória do Plano Diretor, à luz desta lei, a sociedade Cuiabana apenas reafirmava o seu desejo de continuar no caminho da construção democrática, com todo o ferramental de atuação que o Sistema Municipal de Planejamento e Desenvolvimento [Estratégico], estruturado a partir de seu Órgão Superior – o Conselho Municipal de Desenvolvimento Estratégico (CMDE), o Órgão Central, na figura da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU) e o Órgão de Planejamento e Apoio Técnico (IPDU), possibilitavam. Muito mais que apenas continuar em um caminho, sempre se pretendeu avançar, atentos aos alcances e limitações que a obra humana, da sociedade, apresenta constantemente.
Se antes, Cuiabá estava avant-garde, e articulada com as melhores práticas de planejamento e gestão nos moldes das atuações de municípios progressitas como Curitiba, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Medelin, Bogotá, podemos afirmar que Cuiabá retrocedeu ao, de forma arbitrária, ter visto extinto o IPDU por decisão unilateral da municipalidade.
Se Curitiba, Porto Alegre, Medelin e Bogotá (entre tantos outros), por meio dos resultados positivos de suas políticas, nas dimensões socioeconômica e ambiental, evidenciam a importância de se estruturar Institutos de Pesquisa e Planejamento, que com a autonomia necessária e, retroalimentado por todo o sistema, estruture o processo de planejamento do município, de forma técnica e política, dinâmica e contínua, Cuiabá conseguiu comprovar que, em pouco tempo, a inexistência e o desmonte da estrutura, somente pode trazer consequências desastrosas e alarmantes ao planejamento e  gestão da política urbana.
As opções políticas das últimas gestões, após extinção do IPDU,  criaram a então Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, sem consulta e deliberação do Conselho Municipal, sem respeito à Lei Orgânica, a Lei maior de Cuiabá – o Plano Diretor,  à Lei Federal – Estatuto da Cidade, e  voltada à mera gestão das questões e políticas urbanas. Podemos até estar crescendo, mas estagnamos quanto ao desenvolvimento urbano – temos mais construções, obras infraestruturais, entretanto desconexos dos diagnósticos, das projeções futuras, que não vêm sendo incorporadas na formulação das políticas. Por conseguinte, estas se mostram limitadas a curto prazo, opção inaceitável quando discutimos a escala da cidade, as demandas e o futuro da sociedade. Como resultado temos a violência urbana, os congestionamentos e os acidentes de trânsito, as irregularidades fundiárias  e grande parte da população alijada da prestação de serviços públicos de qualidade.
Com esse desmonte institucional, e consequentemente político,  técnico e administrativo, desmonta-se e se desvirtua o Conselho Municipal, desconstruindo todo o Sistema Municipal de Desenvolvimento Urbano de Cuiabá, com prejuízos perceptíveis.
Senhor Prefeito, pelo seu perfil arrojado, confiamos que construirá seu governo na inovação assim como no cumprimento legal e na gestão democrática. Dessa forma, colocamos-nos, enquanto cidadãos, membros entidades da Sociedade Civil Organizada, à disposição para auxiliá-lo e contribuir com o processo de (re) construção e avanço dessa  estrutura de planejamento que já mostrou-se capaz, em teoria e na prática, de conduzir o município ao “desenvolvimento urbano” – físico e de mentes, com o resgate do “regime de cogestão político-administrativa com a sociedade”.
 Esse propósito legal é  que acompanharemos e fiscalizaremos,  é a nossa expectativa, são nossos votos para sua gestão.


Ana Rita Maciel
arquiteta e urbanista, , Conselheira Titular do Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU/MT, Conselheira do Conselho Municipal de Desenvolvimento Estratégico – CMDE

Claudio Santos de Miranda
arquiteto e urbanista, professor e pesquisador do Departamento de Arquitetura e Urbanismo UFMT, Membro da Rede de Controle,  Presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU/MT


Doriane Azevedo
arquiteta e urbanista, professora e pesquisadora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo UFMT, membro da Diretoria do Instituto dos Arquitetos do Brasil – IAB/MT, Conselheira Suplente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU/MT, Conselheira do Conselho Municipal de Desenvolvimento Estratégico – CMDE

José Antônio Lemos
arquiteto e urbanista, professor universitário e articulista no Diário de Cuiabá na área do desenvolvimento urbano e regional

Sindicato das Indústrias da Construção do Estado de Mato Grosso - SINDUSCON/MT  

Raul Bulhões Spinelli
arquiteto e urbanista, Vereador Municipal (1996-1999), Superintendente do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Urbano (2000-2004)

Rita De Cássia Oliveira Chiletto
arquiteta e urbanista, Secretária Adjunta da Secretaria de Planejamento Urbano e Gestão Metropolitana – SECID/MT, Q/MT, Conselheira Titular do Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU/MT, Conselheira do Conselho Municipal de Desenvolvimento Estratégico – CMDE e Conselheira do Conselho Estadual das Cidades de MT

Telma Beatriz de Figueiredo Soares
arquiteta e urbanista, membro da Diretoria do Sindicado dos Arquitetos e Urbanistas – SINDARQ/MT, membro da Diretoria da Federação Nacional dos Arquitetos - FNA


A Carta foi elaborada em 14.11.2012, mas não conseguimos agendar, com os destinatários, audiência para entrega-la.

2 comentários:

  1. Reitero a íntegra da carta apresentada.

    Anna Regina Feuerharmel
    Arquiteta e Urbanista, professora universitária, diretora do Departamento de Plano Diretor do IPDU/PMC (1992-1996), membro do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano - CMDU (desde a sua instaçlação até 1996.

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  2. Seria bom que outros que concordam com a Carta, arquitetos em especial, seguissem o seu exemplo apoiando publicamente o documento, aqui no Blog ou até com a publicação de artigos nos meios de comunicação locais.

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