José Antonio Lemos dos Santos
Venho do tempo em que se ensinava que a liberdade de um terminava onde
começava a do outro. De lá para cá o mundo evoluiu muito, ou pelo menos se
transformou e, mesmo que não quiséssemos, todos nos transformamos com ele. A
vivência, a leitura, a conversa com os amigos ensinam que as melhores
tendências do mundo atual apontam para uma visão de inclusão, compartilhamento e
sustentabilidade. Melhor se diria hoje que a liberdade de um não mais termina,
mas se complementa na liberdade do outro. Não mais a liberdade solitária, mas a
liberdade solidária. Ou somos todos livres ou não somos livres.
O Natal celebra o nascimento de Jesus
Cristo que veio para religar o homem a Deus, como Maomé, Buda e outras figuras
grandiosas, conforme seus seguidores de fé. Aliás, a palavra “religião” vem de
“religar”, expressando justamente essa “re-ligação” divina, o mais importante
estágio da evolução humana, não importa o tanto que o homem ainda venha evoluir.
Religado a Deus o homem começa a pensar no outro como irmão e que a felicidade está na comunhão, comum-união de todos
na grande família divina. A felicidade solidária, não mais solitária. Amar o
próximo como a si mesmo e a Deus sobre todas as coisas.
O que tem
ver a cidade com isso? A cidade é uma invenção humana, a maior e mais bem
sucedida delas. Um objeto artificial que é construído, numa construção
permanente. Porém, importante é que se trata de uma construção coletiva, feita
no dia-a-dia com o trabalho de cada cidadão, que por isso é seu verdadeiro dono.
A cidade é do cidadão, célula da cidadania. Ele constrói a cidade com sua
casinha, do casebre à mansão, com seu estabelecimento comercial, da pequena
borracharia aos grandes empreendimentos. E a cidade é construída para ser o
lócus das múltiplas relações urbanas, sendo justamente a convivência lado a lado
dessas diversas relações, na integração e no conflito de seus diferentes
interesses que surge a fantástica sinergia das cidades que faz a Humanidade dar
saltos de desenvolvimento cada vez mais rápidos ao longo da História. A
cidade é a unidade dessa diversidade e por isso é solidária. Ou pensamos um no
outro, do passado, presente ou do futuro, ou perecemos como seres
urbanos.
Como no conceito de liberdade, sua
irmã gêmea, a cidade de cada um não mais termina onde começa a cidade do outro,
elas se complementam. A cidade de um embeleza ou enfeia, ajuda ou atrapalha a
cidade do outro, pois não existe uma cidade para cada um, a cidade é uma só,
ainda que percebida pelas pessoas de maneira diferente, de acordo com o uso
individualizado. A cidade é uma só e de todos, da cidadania, ou não é de ninguém
e começa a morrer. É a expressão máxima da comunhão do espaço na grande obra
destinada ao bem de todos. É o bem comum a ser compartilhado, convivido por
todos. E aí ela é divina. Talvez por isso as cidades ficam especialmente no Natal.
A grave crise das cidades no mundo, em
especial Cuiabá e Várzea Grande só será resolvida quando a cidadania retomar a
cidade como sua, seu maior bem, feita por ela que tem as autoridades públicas
como seus funcionários para coordenar e promover essa grande obra. Não basta
mais cada um fazer sua parte e, muito menos, apenas esperar El-Rey. Além de
fazer nossa parte, temos direito a que o outro faça a parte dele, de acordo com
o projeto comum firmado nas leis urbanísticas que, por isso, devem ser
democráticas. Construir a cidade, além de cada um fazer bem sua parte, é
participar ativamente, apoiar, discutir, criticar, aplaudir e cobrar. Só ou em
grupo. E já existem bons sinais nesse sentido. Além da cidade de cada um, há
sempre a cidade do outro. Nada mais cristão, nada mais natalino. Feliz Natal a
todos!
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